O meu primeiro dia de aula não teve nada de especial, exceto, talvez, que não era na escola comum. Era na universidade. Confesso que isso me excitava bastante. Eu gostava do status de estudante federal.
Eu estava perdido. Não sabia para onde olhar, não sabia o que fazer. Eu estava infinitamente excitado com esse meu novo mundo. Muita coisa nova, muita gente nova...Algum daqueles trocentos homens devia ser gay...
É a probabilidade. Na minha sala por exemplo, de 80 alunos e apenas duas mulheres, é muito improvável que apenas eu seja gay. EU fazia exatas, eu gostava de jogar com as probabilidades.
Bom, duas coisas me chamaram a atenção na UNIFEI:
A primeira delas é a grande quantidade de homens bonitos que tem. Vocês não tem noção, é muito gato pra um lugar só. No curso de Eng. de Produção então... Nem se fala...
A segunda dela é a quantidade de projetos extracurriculares que tem lá.
Tem projeto de construir carros de Fórmula, robôs para lutarem em arenas, carros com eficiência energética, aviões de aeromodelo com eficiência aerodinâmica e muitos outros. Mas, definitivamente o que me chamou mais atenção, foi o Baja.
Baja para quem não sabe é uma espécie de gaiola de rali. Tipo um buggy, mas, no caso, feito apenas por estudantes de engenharia. Quando eu cheguei na UNIFEI, eles tinham acabado de voltar do campeonato. O carro estava em exposição, mostrando vários vídeos. Pirei. EU queria entrar na equipe.
Tudo bem, eu talvez tenha mentido um pouquinho. O carro ser legal não é o único motivo de eu querer entrar na equipe. Quando eu vi o carro, eu sabia que aquilo poderia mudar minha vida. Mas foi no dia seguinte que eu tive certeza.
Eu estava em uma aula de introdução a engenharia quando foram na sala convidar para o workshop. Workshop é uma apresentação onde cada subequipe do baja explica o que faz e tals.
Dentro da equipe existiam vária divisões: motor, suspensão, estrutura, eletrônica e tals. Cada uma responsável por uma parte do carro. A princípio eu queria entrar em motor. Mas muita coisa mudou depois do workshop.
Nessa primeira semana de aula eu fiz poucos amigos. Eu ainda estava muito fechado em relação ao mundo e mesmo quando eu via que as pessoas queriam minha amizade, eu ficava com medo...
Na terça feira minha vida deu uma mudada. Lembra do infinitesimalmente? Então, esse foi outro momento infinitesimal que mudou minha vida.
Cheguei no auditório da elétrica, onde seria o workshop do baja. Sentei na frente, quase na primeira fileira. Cheguei mais cedo que as outras pessoas. Pouco a pouco o auditório foi enchendo. Depois de lotar, eles finalmente começaram.
O workshop foi bem legal. Explicar em detalhes o que aconteceu é chato demais. Mas eu vou contar o mais interessante.
O capitão geral apresentou e depois cada sub-equipe apresentou um pouco do trabalho que eles desenvolviam. Eu ouvia atentamente todas as palavras. Mas a que eu mais ouvi foi a última pessoa.
Lembra do Théo? Aquele eu lutava dia e noite para esquecer? Aquele que se afastou de mim só por que eu era gay? Então... Não era ele. Mas era um cara bem parecido.
- Boa noite galera! Meu nome é Nicolas, mas todos me chamam apenas por Nick. Eu sou capitão de suspensão – Na hora que ele disse isso, eu tenho certeza mais do que absoluta, ele sorriu para mim. Ou para a plateia. Eu gosto de pensar que foi pra mim.
- Antes de falar o que suspensão faz, vou fazer uma pergunta para alguém aleatório... você! – Não, não foi para mim. Ainda bem, pois eu sou tímido e não conseguiria falar nada. Passaria vergonha.
- Quantas peças você acha que tem a suspensão do baja atual?
- Umas 50, respondeu o calouro, também perdidomais ou menos. Entre parafusos, porcas, roda, pneu entre outras. Muito né? Então, vamos ao que interessa, ou não! – Sorriu para mim de novo. Certeza que foi para mim.
Ele apresentou o projeto de suspensão em 5 minutos, igual as outras apresentações. Parecia ser bem difícil, mas eu não ligava nem um pouco para isso.
No fim do workshop, o capitão geral pegou o microfone e disse:
- Valeu pela presença galera! Quem se interessou, no fim do workshop nós estaremos aqui para conversar, tirar duvidas, fazer inscrição e tudo mais. Ah, já ia me esquecendo, vai ter um coffebreak depois! Abração galera!
Todos aplaudiram e foram para o coffe break. Eu, timidamente, fui também. Eu queria falar com Nick, mas tinha medo.
Vocês acreditam em destino? Eu não acreditava. Hoje eu acredito. Isso que aconteceu nesse dia do workshop é um dos motivos. Vou contar:
Estava eu, timidamente, comendo um pedaço de bolo, conversando educadamente com um colega, que também queria entrar na equipe. Ele era até legal. Otávio era o seu nome.
Houve uma hora que Otávio saiu para ir ao banheiro. Aproveitei para pegar mais um copo de suco. Enquanto eu ia, alguém esbarrou em mim, eu tropecei e trombei com uma pessoa. Sorte que meu copo estava vazio. Vocês ganham um doce se adivinhar quem era.
Sim, era o Nick.
- D-d-desculpe – Eu gaguejei com dificuldade. Eu não estava nem um pouco preparado psicologicamente para falar com ele.
- Algum problema, bixão?
Bixão. Na UNIFEI é muito comum chamar os calouros de bixo ou bixão. Sim, com X, não CH. Eu já estava acostumado com isso. Acreditem, lá não é ofensivo. Algumas outras universidades adotam esse costume também.
- N-não. Eu só... tropecei – Fiquei vermelho de vergonha. Ele devia achar que eu era um tapado. Ele deu uma risada e perguntou:
- Curtiu o Workshop? – Assenti. Enquanto eu formulava uma frase decente para se dizer, ele falou:
- O gato comeu sua língua? – Sorri timidamente.
- Desculpa. Eu sou meio tímido. Mas sim, eu gostei bastante. Vou tentar a subequipe de suspensão.
- Ahhh! Então é comigo mesmo! – Ele falou animado.
Nick era bem animado, brincalhão. Todos que passavam ele brincava um pouco. Pude ver que ele era muito querido na equipe e até pelas outras pessoas. Mas notei algo de ruim, que me deixou triste. Ele tinha uma aliança.
- Nicolas, não é? – Perguntei. Queria manter pelo menos a formalidade.
- Nick. Nicolas parece minha mãe ou minha namorada brigando comigo. Me da arrepios – Ele falou. Dei uma risada dele.
- É sério pô! Você como chama? – Ele falou brincando, mas sério.
- Fernando – Ele sorriu.
- Fer ou Nando? – Ele perguntou. Lembrei do Théo. Ele me chamava só de Fer. Na verdade ele era um dos únicos que me chamava por apelido.
- Nando... – Respondi, meio triste, por lembrar do Théo. Se toda vez que Nick me chamar de Fer eu lembrar do Théo, minha vida ia virar um inferno.
- Quando você está no seu quarto e sua mãe berra “Fernando”. É boa coisa?
- Não. Nunca será! – Ele riu.
- Então eu só te chamo de Nando e você só me chama de Nick, pode ser?
- Fechado! – Ele apertou minha mão.
- Bom... Workshop. Alguma dúvida? – Depois disso ficamos conversando por um bom tempo. Na hora que eu vi, todos já tinham ido embora. Nick também se assustou.
- Nossa! Nando, te vejo no processo seletivo! Boa sorte! – Nick saiu, encontrou um companheiro de equipe e continuou andando, fiquei parado, observando ele ir embora.
Nick era parecido com Théo. Algumas diferenças: seu cabelo era liso e um pouco mais para loiro. Seus olhos era um misto de castanho claro e verde. Ele tinha uma barba mal feita na cara, mas bem aparada. Ele era magro, não aparentava ser musculoso, apenas sexy.
Voltei para casa conversando com um colega. Ele também estava animado para entrar em suspensão. Depois dessa conversa com Nick, eu estava bem mais animado, feliz, amigável.
Cheguei no meu pequeno kitnet, fiz minha janta. Um segredo que será útil: eu sabia cozinhar muito bem. Esse dia eu estava inspirado. Mesmo só para mim eu fiz um frango com 4 queijos. Relativamente simples, mas gostoso demais.
Jantei e dormi.
Um comentário. Essa foi a primeira vez em três anos que eu dormi em paz.