TINHA QUE SER VOCÊ - O8: A VERDADE LIBERTA (HECTOR)

Um conto erótico de Escrevo Amor
Categoria: Gay
Contém 1935 palavras
Data: 03/03/2024 03:04:24

CAPÍTULO 8: A VERDADE LIBERTA

NARRADOR: HECTOR

Eu tenho um pesadelo recorrente, onde vejo o acidente dos meus pais, mas não posso fazer nada, pois estou de mãos atadas. Sempre acordo assustado devido a esses sonhos bizarros. Inclusive, eles foram temas de várias sessões de terapia. Tenho essa mesma sensação ao ver o sofrimento da família do João. Sabe a parte que dói? Eu tenho uma parcela de culpa nesta história. Se não fosse por mim, os Telles nunca descobriram sobre a origem dos gêmeos e, logo, não iriam até a polícia.

Na última noite, tentei contar para o João, mas não achei uma abertura. Agora, cá estou eu, de frente para o bebedouro com dois copos nas mãos. Respirei fundo e segui para a direção do corredor onde os meus amigos estão. Estou mais tranquilo, porque sei que os Telles não vão prestar queixa contra o seu José e dona Esther. A Nataly só entrou na equação para acalmar os gêmeos. Eu amo a minha amiga, sério.

A atmosfera da delegacia é estranha, os policiais passam de um lado para o outro, alguns carregam armas, enquanto outros estão à paisana. Atravessei o corredor, tentando me abster da culpa e avistei os gêmeos. Os dois pareciam ser a mesma pessoa, mas com pequenos detalhes. O João é um pouco mais alto, enquanto o José é musculoso e conta com uma tatuagem no braço direito. O corte do cabelo dos dois é diferente também.

Até agora, eu não acredito que conheci o João de uma maneira tão inusitada. Será que foi o destino? Afinal, o meu ex-namorado era amante do ex-namorado dele. Que sadismo do universo, mano. Se bem que a família Telles foi precipitada em procurar a polícia. Eu tentei conversar com Jayme e Patrícia, mas a primeira atitude acabou sendo envolver os policiais, que iniciaram uma investigação e chegaram ao seu José e Dona Esther.

— Pessoal, — chamei a atenção dos irmãos. — eu trouxe água. — entreguei os copos.

— Valeu, cara. — agradeceu José, tomando a água em um único gole.

— Obrigado, Hector. — a voz de João estava embargada.

A voz. Uma outra coisa para diferenciar os gêmeos. A voz do João é carinhosa e parece me abraçar. Já o José tem um tom de voz energético e intenso. Talvez uma mostra da personalidade dos dois? O meu rosto ainda lembra da intensidade do José, aquele soco foi muito forte. Enquanto do João, eu só consigo absorver carinho.

Que sentimento maluco é esse? Eu o conheço há algumas semanas e ele despertou algo tão forte em mim. Esse envolvimento pode me machucar, eu não faço ideia de como o João vai reagir quando descobrir do meu envolvimento nesta história insana.

Nossos olhares se encontraram, e eu pude ver o questionamento nos olhos do João. Ele queria respostas, queria entender como tudo isso aconteceu. Eu também queria ajudar, mas a verdade era um fardo que eu não sabia se teria coragem de entregar para o meu amigo.

A delegacia permanecia em silêncio, mas o eco das verdades não ditas reverberam nas paredes. O futuro dos gêmeos estava agora nas mãos dos seus pais adotivos, enquanto eu me via preso nessa maldita necessidade de contar a verdade e o medo de perder um amigo que me fazia bem.

Após uma espera de quase duas horas, a Nataly saiu da sala com os pais dos gêmeos. A expressão deles não era uma das melhores. João e José correram na direção de seus pais e os abraçaram. Emocionado, José pediu perdão a Dona Esther pelas palavras ditas no dia anterior.

— Com licença, — uma desesperada Nataly me puxou para um canto da delegacia e sua expressão é de pânico. — os Telles. Os Telles! — ela evitou gritar, mas deu ênfase ao sobrenome da família biológica dos gêmeos — Puta que pariu, Hector. — olhando para trás. — Aparentemente, eles não sabiam que eram gêmeos. A Patrícia fez todos os exames com a sogra e pensava se tratar de apenas uma criança. Agora, eles vão fazer uma acareação.

— Uma o quê? — questionei confuso e ainda sentindo o impacto da culpa.

— Acareação, um procedimento que é feito para apurar a verdade, ou seja, os pais adotivos vão ser confrontados pelos pais biológicos. Era uma criança? Duas crianças? O José deu material para um exame de DNA, agora o João vai ter que oferecer também. Os investigadores desejam ver todas as possibilidades. — ela explicou, quase parecendo uma professora e o meu coração bateu mais forte. — Fora que os Telles querem conhecer os filhos imediatamente. O João sabe que você é quase um filho adotivo do Fernando Telles? — ela me questionou, colocando a mão na cabeça e massageando.

— O que eu faço, Nataly?

— A verdade, Hector. Apenas a verdade. — aconselhou a Nataly. — Eu vou levar o caso deles para o escritório, por sorte, o meu chefe odeia o Sr. Telles.

— Eu pago. — soltei. — Eu pago tudo.

— Não precisa, amigo. Vou pedir consultoria pro bono para o casal. — contou Nataly me deixando com cara de paisagem. — Quando é de graça. Eles não vão ter gastos. Ainda mais com essa história de roubo. No fim das contas, a família Guimarães salvou os gêmeos.

A reunião familiar aqueceu meu coração, porém, ao mesmo tempo, eu me sentia responsável por essa confusão. Se não fosse o maldito do Alexander, eu não teria conhecido o João e os Telles não teriam reconhecido os filhos em uma foto que postei nas redes sociais. Deixei a família do João em casa e seguimos para o meu apartamento.

Ele parecia tão frágil e confuso com a situação. Na delegacia, a Nataly explicou sobre a família biológica dos gêmeos, mostrou uma foto da Patricia e Jayme, mas manteve a discrição sobre o meu envolvimento com a família Telles. Ela também contou sobre a acareação e ficou com o Seu José e Dona Esther para saber mais detalhes sobre o dia em que encontraram os filhos adotivos.

— Desculpa, Hector. Eu acabei te trazendo para o meu drama familiar. — lamentou João. — Eu juro que costumo ser um amigo melhor e...

— João, eu gosto de você. — soltei sem pensar e o desespero tomou conta de mim. — Digo, gosto de você como amigo. Você é um bom amigo. Um bom amigo, que eu fiz em uma situação complicada. — as minhas mãos começaram a tremer e um sorriso dele me deixou ainda mais desesperado. Por causa da distração, atravessei o sinal vermelho e um carro buzinou. O motorista deve ter ficado furioso e com razão.

— Meu Deus. — soltou João, segurando na alça de teto e com uma expressão de pavor no rosto.

— Desculpa. — pedi, entrando no primeiro estacionamento que encontrei. — Me desculpa, João. — pedi novamente, pois, estou tendo um ataque de pânico. As lágrimas começaram a escorrer dos meus olhos.

— Você está tendo um ataque de pânico. — me alertou João.

Sim. Que belo momento para assustar o garoto que eu gosto. Porém, diferente do que eu achei, o João agiu de uma maneira rápida e parecia ter noção do que se passava dentro de mim. Ele tirou o meu cinto de segurança, abriu todas as janelas do carro e fez uma massagem no meu pulso. O toque dele me arrepiou e não pude evitar o contato visual com o João.

— Vai passar, viu. Tá tudo bem, eu estou aqui com você. — João repetia, ainda fazendo massagens no meu pulso direito. — O José também tem ataques de pânico, apesar de eu ser mais fraco que o meu irmão, ele sempre sofreu com ataques de pânico. Infelizmente, demorou para reconhecer, mas os meus pais buscaram ajuda e ele frequenta um terapeuta do projeto "Razão de Viver", lá do bairro. — explicou.

— Você, — eu tentei falar, mas o ar ainda me faltava. — você, você não tem nada de fraco, João. Você é mais forte do que imagina. Esse é o meu medo.

— Medo?

— Eu gosto de você. — joguei a bomba. — Eu sei que é repentino, mas eu gosto de você. Também sei que você tem sentimentos pelo seu ex-namorado.

— Tá tudo bem, Hector. Passamos por muita coisa juntos.

— Não tá. Eu não estou sendo sincero com você. Eu juro que eu não queria que isso acontecesse, eu juro. — busquei palavras para me explicar. — Eu conheço os seus pais biológicos. Lembra da foto que tiramos na semana passada?

— Lembro. — João soltou a minha mão. — Quando você e a Nataly foram lá em casa?

— Isso. De alguma forma, você parece muito com o seu pai na juventude, então, eles acharam estranho e entraram em contato com os policiais, mas juro que eles não pretendem dificultar a vida do seu Josué e da dona Esther. — assegurei, ficando cabisbaixo. — Eu, eu sou órfão. Os meus pais morreram em um acidente de carro. Uma família ficou com a minha tutela e me ajudaram a administrar os patrimônios que herdei.

— A família Telles? Esse foi o nome que a Nataly nos passou.

— Sim. O Jayme, que é filho do meu tutor, e a sua esposa, Patrícia, tiveram o filho roubado, quer dizer, os filhos, né. — soltei, pois todos pensavam se tratar de uma criança e não de duas. — O caso ficou muito famoso no Brasil, mas eles nunca tiveram nenhuma pista, quer dizer, até o dia em que postei a foto. Eles reconheceram você.

— Como?

— Aparentemente, vocês se parecem com o Jayme quando era adolescente. Fora que o Jayme também tem um irmão gêmeo, o Jorge. — expliquei, agora sem ter coragem de olhar nos olhos do João.

— Nossa, — as lágrimas rolaram no rosto dele. — o meu pai é gêmeo. — foi o primeiro comentário do João. — Eles são legais?

— O Jayme sempre fez de tudo para me incluir. A Patrícia foi a primeira que soube sobre a minha bissexualidade. Eles são pessoas boas. — respondi, apesar do medo, me senti mais aliviado em contar a verdade. — Eu entendo se você quiser parar de me ver e...

— Não! — ele exclamou, limpando as lágrimas e se aproximando. — Foda-se.

Ele me beijou. Não foi um beijo básico. O João caprichou e usou a língua de uma maneira que nunca usaram em mim. Eu nem lembrava mais como beijar alguém, mas não quis decepcioná-lo. O segurei firme e o puxei na minha direção. De repente, um carro buzinou e percebi que vários curiosos nos observaram, enquanto uma fila de veículos se formavam na rua para entrarem no estacionamento.

— Desculpa! — gritei, ligando o carro para acessar o estacionamento e parando na primeira vaga disponível.

— Hector, eu quero falar com os Telles. Eu quero falar agora. — ele me jogou a bomba e a ereção que se formava diminuiu rapidamente.

— Você tem certeza?

— Eu preciso. Eu preciso evitar que os meus pais sejam processados e...

— João, eu sei que você está ansioso, mas a Nataly é a melhor advogada que poderia contratar. Eu acredito nos teus pais, assim como você também. Fora que os Telles não vão tomar nenhuma atitude extrema. Eles só querem...

— Nós. Eles querem nós. Biologicamente, eles são nossos pais.

— Vocês não são uma propriedade, João. — peguei na mão dele e apertei. — Eu acompanhei parte do sofrimento do Jayme e da Patrícia. Imagina, você perder algo que tanto quis na vida? O sentimento de impotência, as dúvidas, as noites mal dormidas.

— Tudo bem, eu vou esperar, mesmo sendo difícil. — a frase me tranquilizou.

— Saiba que você não está sozinho. — percebi que continuávamos de mãos dadas e um sorriso se abriu na minha boca.

Ao olhar para frente me deparei com a frase: "Conheceis a verdade e a verdade vos libertará". Estava escrita em letras garrafais na traseira de um caminhão. Mas como o João vai reagir ao descobrir os meus outros segredos? Bem, isso só o tempo vai me responder.


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Comentários

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Outros segredos??? Agora fiquei mais curioso. Que história envolvente.

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