AINDA DÁ TEMPO PARA AMAR - CAPÍTULO 03: DEVAGAR

Um conto erótico de Escrevo Amor
Categoria: Homossexual
Contém 2451 palavras
Data: 01/07/2022 16:35:21

Eu não estou no meu corpo. A minha mente continua repassando tudo o que aconteceu na noite passada. Os beijos, carícias e mamada. Tenho que procurar alguma coisa para me distrair. Após a primeira aula, eu entro no "Finder" e fico assustado com o número de mensagens que recebi. Aparentemente, os jovens gostam de um paizão. O que segue é uma sucessão de paus e bundas. Nada me atraía, porque o Henrique não sai da minha cabeça.

***

PASSIVO37: Adoro um daddy. Manda foto do pau

Slave4u: Quero você dentro de mim. Manda foto da pica

seupass: Gosto de novinhos? Eu me amarro num coroa ativo.

cuguloso: Vem paizão. Mostra essa vara.

***

— Pelo amor de Deus. — penso, antes de desligar o aplicativo.

Volto para a sala de aula e passo um exercício para os meus alunos. Eu não tenho estruturas para lidar com os sentimentos confusos dentro de mim. Só quero chegar em casa, tomar uma cerveja e tentar esquecer o que aconteceu, mesmo o Henrique forçando um encontro de verdade. Acho que é da boca pra fora. É o que os jovens fazem, não é? Ficam e vazam.

— Professor, o senhor já passou este exercício. — comenta Douglas, um dos alunos mais inteligentes da sala.

— Perdão? — questiono, voltando de um devaneio.

— O senhor já passou essa questão. A correta é da página 24. — explicou o aluno, que acabou sendo importunado pelos colegas.

— Ei, silêncio! O que é isso, uma feira? Ordem, por favor. Façam o exercício da página 24, por favor. — oriento, antes de voltar para a minha cadeira.

Abro o diário de classe, mas tudo remete ao Henrique. Eu nem acredito no que fizemos na noite anterior. Ele me levou ao céu em poucos minutos. Só que existe um problema: ele quer sair comigo. Não faz sentido um cara tão gostoso me chamar para um encontro. Acho que a briga na boate deve ter causado algum trauma nele.

O dia passa em câmera lenta. Os alunos estão alheios ao furacão que está dentro de mim. Preciso intervir quando um grupo fica implicando com o Douglas. Sério, sai ano e entra ano e essas picuinhas continuam as mesmas. Essa juventude nunca vai se entender. E sobra para os professores servirem como apaziguadores de adolescentes.

Como sempre sou salvo pelo sinal. Os alunos nem esperam as instruções para a próxima aula e saem em disparada pela porta. Aproveito o momento de solitude para lançar algumas notas do sistema da escola. A minha tarefa é atrapalhada por uma voz familiar e que me faz tremer nas bases.

— E ai, Jaime. — Henrique diz. Ele está escorado na porta da sala e segura dois capacetes em suas mãos. — Está preparado para o encontro?

— Henrique. — fico em pé. — O que você está fazendo aqui?

— Nós combinamos um encontro, lembra? Hoje é sexta-feira. O dia ideal para ter um encontro. — ele fala como se fosse a coisa mais natural do mundo.

— Tá, mas eu nem me preparei. Estou o dia todo aqui na escola e...

— Ah, não. — Henrique parece muito chateado. — Não vai me dar um bolo, né?

— Não é isso. É que eu queria ir em casa trocar de roupa. — explico, sabendo que não adianta negar a um pedido dele.

— Tudo bem. Podemos ir até a sua casa. — ele se aproxima e deixa um dos capacetes em cima da mesa. — Quero te dar uma carona. — chegando perto do meu ouvido. — Não aceito não como resposta.

— Ok. — engulo seco e olho para ele. — Eu só, eu só vou fechar o sistema e podemos ir.

Os deuses do destino só podem estar de brincadeira comigo. Desligo o computador e seguimos para a sala dos professores. O Henrique não entra, por isso, tenho tempo de verificar o meu visual. Toda vez que olho no espelho uma voz diz que este relacionamento é errado. Uma vez que eu fui o professor dele. Respiro fundo e espanto todos os pensamentos negativos.

Ao sair o Henrique está escorado na parede, segurando os dois capacetes um em cada braço. Seu sorriso poderia iluminar todo o Estado de São Paulo. Toda vez que ele sorri duas covinhas nascem. Porque estou reparando nesses detalhes? O lance dos jovens é sexo. O Henrique só quer fazer sexo. Eu não posso deixar os sentimentos se misturarem.

No estacionamento, o Henrique vai na frente e apresenta a sua moto. Estou com a minha mochila e não sou acostumado a andar de motocicleta. Ele sobe em sua moto e me passa um dos capacetes. Pego de uma maneira desajeitada e coloco da maneira errada. O Henrique solta um riso abafado e me ajuda.

Alguns alunos passam por nós e um frio sobe pela minha coluna. Consigo subir na moto sem problemas, mas o Henrique pega as minhas mãos e coloca em volta de sua cintura.

— Tenho que te levar em segurança. — diz Henrique, mas sua voz está sendo abafada pelo capacete.

— Ok! — eu grito, pois não sei se ele ia conseguir ouvir.

De moto até a minha casa são quase cinco minutos. O Henrique obedece todas as leis de trânsito e estaciona na frente de casa. Ele não desce da moto e pergunto o motivo. Ele, simplesmente, pega em minhas mãos que estão segurando em sua cintura. Rapidamente, eu o deixe livre para descer e faço a mesma coisa.

Entramos em casa e digo para o Henrique me esperar na sala. Pela primeira vez, eu tenho vergonha da minha casa. Isso nunca fui uma questão para mim. Vou para o quarto e escolho algumas roupas confortáveis para usar. Em seguida, tomo um banho rápido e troco de roupa no próprio banheiro.

O lado positivo de ser careca é não gastar tempo para arrumar os cabelos. Escovo os dentes, enquanto faço a barba. Sim, eu gosto de viver perigosamente. Graças a Deus que não corto o meu rosto. Acho que estou aceitável para sair. Passo um pouco de perfume e exagero no desodorante.

Para o encontro, meu Deus, nem acredito que estou indo para um encontro com um ex-aluno. Isso deve ser crime em algum tipo de realidade alternativa. Enfim, para o encontro, estou usando uma blusa azul claro, ela é de manga cumprida, afinal, não podemos confiar no clima de São Paulo e não quero carregar um casaco para todo canto.

A calça comprida na cor caqui dá um toque diferente para o look. É o que a Alessandra me ensinou. Ela que escolhe a maioria das minhas roupas. Escolho uma meia quentinha e uma bota marrom. Dou uma segunda olhada no espelho e, porra, quem eu quero enganar? Estou horrível. A melhor coisa a se fazer é cancelar o encontro. Isso. Eu invento alguma coisa e cancelo o encontro.

De repente, sou surpreendido pelo Henrique que bate à porta. Ele informa que temos 20 minutos para chegar ao restaurante.

— Ok. — digo, fechando os olhos. — Vamos.

Vou até a mochila e pego a carteira. Não tenho dinheiro físico, mas podemos dividir no cartão de crédito. Acho que vamos em algum barzinho. Creio que é a melhor opção. Saio do banheiro e o Henrique está me esperando. Novamente, ele sorri e eu fico sem graça.

— Achei que você ia desistir. — me abraçando e exalando. — Eu adorei o perfume.

— Va-va-valeu. — agradeci e, com certeza, estou todo vermelho.

De novo a parte da moto. Colocar o capacete (algo que acerto! Ponto para mim), subir na moto e segurar no Henrique. O clima esfria um pouco, ainda bem que escolhi uma blusa quentinha. O Henrique está usando um moletom branco da Nike e uma calça jeans preta, seu tênis é um show a parte, deve ser caro. Ele sabe como combinar suas roupas, nem deve precisar da ajuda de ninguém.

Seguimos pelas Avenidas e ruas de São Paulo sem sofrer com o trânsito. Em alguns momentos, o Henrique acelera a moto e preciso segurar com força. Aproveito o seu moletom e coloco minhas mãos nos bolsos, porque estou com os dedos gelados. Consigo sentir melhor o corpo dele. O Henrique gastou muito tempo na academia, após o ensino médio. Será que foi para se proteger de caras como aquele que insultou a Alessandra?

Passamos pelo prédio da Copan e entramos na Avenida Ipiranga. Aos poucos, a moto vai perdendo a velocidade e estacionamento em frente ao Edifício Itália. O Henrique faz uma manobra e entra no estacionamento do local. Nesse momento, eu tiro as mãos do bolso dele e segurei na barra traseira.

Está mais frio no estacionamento. Eu não faço ideia do que o Henrique planeja, mas espero ter dinheiro para isso. Paramos na parte indicada para motos. Eu desço e entrego o capacete para o Henrique, que abre o banco da motocicleta e guarda os capacetes. Aproveito para olhar em volta. Eu nunca vi tanto carro de marca na minha vida. Nem nas festas que o meu pai me obrigava a ir.

— Henrique, — digo baixo, mas aumento o tom de voz. — onde nós vamos?

— No Terraço Itália. — ele diz sem qualquer cerimônia.

— Ok. Vou parcelar de mil vezes. — penso e acho que o Henrique percebe a preocupação estampada no meu rosto.

— Ei, hoje é para ser divertido. É por minha conta. — Henrique pega no meu ombro e me aproxima dele. — Só aproveita. — me beijando no rosto. — Vamos para o elevador?

Ok. Eu estou nervoso, não vou negar. Diariamente, enfrento os surtos dos meus alunos, mas aqui com o Henrique não tenho certeza do que fazer. É muita coisa para administrar. No fundo das emoções, uma voz me traz para baixo e acabo não aproveitando o momento como deveria.

Tem um homem que está recepcionando os clientes ao lado do elevador. Para a minha surpresa, ele cumprimenta o Henrique pelo sobrenome: "Senhor Ferreira". Neste instante, a porta abre e pessoas bem arrumadas começam a entrar. Somos levados para a parte traseira do elevador. O Henrique pega na minha mão e fica acariciando, sem temer aqueles que estão ao nosso redor.

O silêncio é reconfortante. Alguém tosse e de maneira automática eu recuo. O Henrique me observa de maneira engraçada. São 41 andares, porém, o tempo dentro do elevador parece não passar. "Isso não é coisa de macho", "Você é um viadinho de merda", "Um dia vai pegar AIDS" e "Vai morrer na rua". As vozes dentro de mim continuam me levando para baixo. Fecho os olhos e respiro fundo.

As pessoas saindo do elevador me trazem de volta. Ficamos em uma fila indiana para confirmar as reservas. O Henrique informa o seu nome e a recepcionista confirma. Ela libera a nossa entrada e um garçom nos direciona até a mesa.

Uau. Nunca estive tão alto. De cima, os carros e pessoas parecem miniaturas. Uma música ambiente deixa tudo mais surreal. Eu moro em São Paulo desde sempre e nunca subi no Terraço Itália. Sabe aquela sensação de estar sendo observado? Eu sei. O Henrique me olha de uma maneira intensa e descarada.

— Sabe, você poderia externalizar os seus pensamentos. — ele comenta.

— Não sei. — respondo. — É estranho vir jantar em um dos locais mais caros de São Paulo com o meu ex-aluno. Me sinto meio fracassado. — revelo, dando uma risada nervosa.

— Qual é, Jaime. O sucesso é relativo. Eu estou feliz por poder te oferecer isso. Sabe o motivo? Você sempre foi o meu crush. Aquele poema fiz para você. — Henrique confessa respirando fundo.

— Entendi. Henrique, mas você é o meu aluno e...

— Ex-aluno. Eu sou um ex-aluno. Tenho 20 anos, dono do meu próprio nariz e solteiro. Gosto de você, principalmente depois do que rolou ontem. — ele dispara como uma metralhadora de palavras.

— É complicado, Henrique. Eu tenho 48 anos. O que as pessoas vão dizer? — questiono, mantendo um tom de voz baixo, porque esse tipo de restaurante pede isso.

— Eu gosto de você. Eu sempre gostei. Ontem eu realizei um dos meus sonhos mais loucos. Eu só estou pedindo uma oportunidade. Eu só quero...

— Com licença, — o garçom se aproxima e nos oferece dois cardápios. — eu me chamo Alfredo e vou ficar responsável pela mesa de vocês.

Na verdade, fico perdido com tantas opções. Vou no mais seguro, a carne. O Henrique pede um ceviche de limão siciliano. Para acompanhar, ele solicita uma garrafa de vinho. De entrada, escolhemos uma caprese italiana. Já no quesito sobremesa, ambos pedimos tiramisù gelado. O garçom se despede e o silêncio impera entre nós.

— Você é sempre tímido assim? — questiona Henrique, que alcança a minha mão e aperta.

— Às vezes. Desculpa, Henrique. Eu não sei o que estou fazendo e...

— Estamos em um encontro. — Henrique aperta a minha mão. — Somos dois adultos que se gostam e querem se conhecer melhor, quer dizer, eu quero. E você?

Ele quer. E eu? A pergunta ecoa dentro de mim. Ao mesmo tempo, consigo ouvir os sermões do meu pai. Eu fecho os olhos. Ele percebe que tem algo de errado comigo, porém, o papo é atrapalhado pelo garçom que traz o vinho. Com uma habilidade ímpar, o homem enche os nossos copos e deixa a garrafa ao nosso alcance.

Como um bom apreciador de bebidas, eu tomo tudo em um único gole. Mais pelo nervosismo do que gostar de vinho. O Henrique, por outro lado, observa a taça e bebe. Em seguida, balança a bebida e dá outro gole. Seus movimentos são como uma dança. Talvez ele goste de experimentar os mais variados tipos de vinhos? Vai saber.

— Bem, — digo, enquanto sirvo um pouco de vinho na minha taça. — eu estou nervoso. Eu não sou muito de ter encontros, ainda mais com ex-alunos. Tudo bem, eu sei que já passamos dessa fase, entretanto, eu não consigo deixar de achar estranho.

— Jaime, — Henrique me chamou e deixou a taça sob a mesa. — você não tem noção de quantas vezes eu quero te chamar de prof. Eu preciso te confessar que sou apaixonado por você desde sempre. A sua voz, o seu corpo e o seu cheiro estão comigo desde que terminei a escola. Tentei te superar de diversas maneiras, mas no dia em que te vi na escola. — respirando fundo. — Foi como se o Henrique de 17 anos voltasse. O mesmo garoto bobo e apaixonado. Eu pensei em várias maneiras de te chamar para sair, só que a vida foi mais rápida. Eu me envolvi em uma briga, você salvou a minha pele. Cá estamos nós. Não estamos errados. Não existe nada a temer. Só que eu não vou te forçar a nada. Se você quiser podemos ir embora agora. — levantando da mesa.

— Espera. — peço, olhando para os lados, mesmo a ação de Henrique não ter chamado a atenção de ninguém. — Senta. — ele me obedece. — Vamos devagar, pode ser?

— Como você quiser. Eu espero o tempo que for necessário. — Henrique garante. Ele sorri e o meu coração palpita mais rápido.


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