INTRODUÇÃO
Lembro-me: estou deitada na cama, ao meu lado dorme um homem lindo, parece de porcelana, acho que não posso pedir mais nem melhor. Esta noite acertei, parece-me. Trouxe para casa o melhor partido do bar. Alto, moreno, olhos escuros, magro e muito bem definido. Olha para ele era quase como um elixir para os olhos, fazia-me sentir bem. O sexo então… foi óptimo. Existem homem que nascem com um certo talento natural para dar prazer a uma mulher. Bem, cada um com as suas qualidades.
Não posso afirmar com certeza o seu nome, não costumo reter tanta informação sobre os homens com quem passo as noites. Esses homens, que frequentemente se deitam comigo na minha cama e que passam as noites a satisfazer-me até que adormecem exaustos, são apenas um meio para tingir um fim muito específico.
O meu objectivo é atenuar um pouco a solidão e o isolamento que invadiram a minha existência, sem que eu desse por isso. Eu sei, e eles também o sabem. Provavelmente pretendem o mesmo, ou então querem só uma noite de sexo sem o mais pequeno compromisso. Todos temos os nossos propósitos, e fazemos o que podemos para atenuar as nossas fraquezas.
Agora estou sentada num banco qualquer a observar o movimento que me rodeia. Gosto de observar as pessoas. Observo imenso e pondero se em algum das pessoas que passa está a solução para esta sensação de vazio. Será que do meio delas surgirá aquela que despertará em mim essa vitalidade e alegria característica apenas de quem está apaixonado? Sinceramente, não sei. Mas espero que sim.
- Zurah, Zurah…
Ouvi alguém gritar o meu nome, mas não liguei, preferi pensar que chamavam outra pessoa, apesar de ter a certeza que era a mim que chamavam e de saber também quem me chamava.
- Zurah Mitts, que fazes aqui? Sentada, a olhar para o nada! Estás atrasada para a aula. Aliás, estamos as duas. Despacha-te! Que mania essa de passares os almoços aqui especada no jardim da faculdade. Devias conviver mais!!!
Esta quase matraca é a minha amiga Anne. Ela é um tanto louca. A verdade é que não passamos muito tempo juntas, mas estamos lá uma para a outra quando é preciso. É uma à outra que recorremos quando estamos mal. Também não temos muitos gostos em comum, o que facilita esta nossa relação de quase distância.
Anne é mais festas, saídas em grupo, discotecas, bares e grandes produções. Eu sou mais cinema, literatura e música. Música para todos os gostos, ou quase todos. Sou praticamente ecléctica. Eu também gosto de sair, e divertir-me com o pessoal. Mas não ficava só por aí. Eu sou muito mais. Agora penso que Anne talvez seja um pouco fascinada pela minha forma de absorver a cultura. Mas fale-se de mim mais para a frente.
- Então, não estás a ouvir-me? Mexe-te! Se nos atrasar-mos vamos levar falta, e se levar-mos falta vamos apanhar com aquela amostra de gente até o fim do ano!!! Vem, anda!
Senti-me sendo arrastada até dentro da faculdade. A amostra de gente a que Anne se refere é o Mr. Potts, o meu professor de Economia Aplicada. É um homem tacanho. Um professor incrível, demasiado interessado pelos temas que lecciona, mas um ser humano quase mesquinho. Se algum aluno tinha o azar de ser marcado por ele, era o fim. Estaria marcado até ao fim do semestre. Diga-se, apenas, que Mr. Potts tem uma capacidade de perseverança e rancor fora do comum.
Eu, até agora, tenho passado despercebida ao seu meticuloso radar. Sentava-me sempre à frente, respondia às suas perguntas e raramente me apresentava visivelmente distraída. Por norma, as aulas interessavam-me e eu acabava por levar uma vida académica pacata.
Penso ser essa a razão do meu estado actual. Nunca vivi grandes emoções, sempre atingi os meus objectivos sem grandes obstáculos. Diga-se que a vida corre bem, sem grandes dificuldades. No fim, esta falta de dificuldades acabou por me fazer perder um pouco da vitalidade que me era inerente.
Chegámos à sala, vermelhas e exaustas de subir a correr as escadas dos 4 andares de acesso ao nosso piso. Estramos e todos repararam na nossa presença, algo a que não estava habituada. A única atenção especial que recebia era a dos homens que dormiam comigo. Um meio para atingir um fim.