Introdução à luxúria

Um conto erótico de Psappha
Categoria: Heterossexual
Contém 1027 palavras
Data: 02/04/2013 01:32:03

Desde 2009 eu lia os textos da Casa dos Contos, e vasculhava o site em busca de bons contos para ler. Ficava então imaginando como aquelas pessoas tinham imaginação para escrever aquelas coisas que em mim traziam à tona aquelas sensações deliciosas, como numa pulsão de vida.

Na verdade, eram relatos.

Ou sonhados tão bem sonhados que as faziam escrever coisas que as punham tão próximo do célebre Anjo Pornográfico, de crônicas de tremerem as bases, de tremelicar as pernas.

Agora, quem anda inspirada sou eu, quando um Anjo caído, um pornográfico natural, cruza minha vida e a põe de cabeça para baixo. Nesses meus futuros contos, darei a este Anjo o nome do Anjo Pornográfico, então, o personagem das minhas histórias se chamará Nelson. Nelson Rodrigues.

Nelson não é um galã óbvio. Cinquentão, já exibe seu cabelo loiro mais loiro ainda, com uma adorável invasão de fios brancos. Suas rugas marcam seu rosto como o chão rachado marca a seca no sertão. Seus olhos azuis contrastam com seu rosto, como o céu limpo, e o sol brilhante - o brilho do seu olhar - encandeando minhas vistas. É impossível olhar para Nelson e não esboçar nenhuma reação. A cada coisa que ele me conta, imagino como se ele já tivesse sido tudo nessa vida, e talvez fosse um vampiro, pois nunca vi ninguém que falasse tão naturalmente sobre séculos passados. Talvez tenha vivido aquela época.

Aliás, Nelson é meu colega de trabalho.

Situação engraçada é essa, que põe numa mesma equipe, igual para igual, um senhor tão vivido e uma moça que praticamente começou a vida agora, recém saída da faculdade, primeiro emprego. Sim, eu. Eu sou uma garota nova, a ponto de ter menos da metade da idade do Nelson. Do tipo mignon e morena clara, sou como um contraponto dele. Tudo novo demais, e ainda aparento menos idade. A total fuga dos padrões de beleza daqui, tal qual Safo, a poetisa grega que escolhi ter como pseudônimo. Do tipo calada, falo apenas quando necessário. Quando se é necessário, posso falar bem, e falar muito.

Então, devidamente apresentados e devidamente caracterizados para que você, leitor, possa imaginar tudo da forma que se ocorreu, como numa peça teatral, o senhor loiro de olhos azuis chamado Nelson, e a - praticamente- brunette mignon e intelectual, eu, Psappha, vou contar como tudo aconteceu ( e está acontecendo).

Inicialmente, não pense que é preconceito seu que as pessoas que são da área da cultura/artes são loucas e promíscuas. Realmente o são, mas, a forma como nós sentimos a luxúria se dá de outra forma. É algo essencial que nos inspira e move nossa vida, algo totalmente não-banal.

Conheci Nelson de forma despretensiosa, trabalhando conjuntamente numa grande equipe para fazer funcionar um enorme castelo. Não, não é mentira: castelos ainda existem por aqui, você pode visitar o castelo todos os dias exceto segunda. Não posso dizer que castelo é, mas pode ser que algum dia você nos encontre, ao fazer uma visita guiada. (O ingresso equivale a R$ 15,00). No início do trabalho, estávamos tão focados que praticamente nossa casa era o castelo. Até dormíamos nos então criados dormitórios, comíamos no restaurante, por lá mesmo vivíamos e por muitos dias não pisei em casa.

Deixei pai, mãe, irmão, noivo. Pelo trabalho compensador.

Compensava pois a companhia que arranjei era a melhor que se podia ter em um trabalho. Nas horas mais tranquilas, praticávamos ora o francês, ora o inglês. Conversávamos sobre literatura, música, cinema. Até a noite, quando tínhamos que nos separar para dormir.

Acabamos ficando nos noturnos, um horário especial de visitação. Ao mesmo tempo que o turno proporcionava lindas vistas de toda a região iluminada por postes, a visitação não era lá essas coisas, e então podíamos ir ao Gourmet, ou nos botequins lá nas docas.

Lá pelas tantas, depois de tantas conversas e cumplicidades, Nelson veio convidando:

- Vamos comer uma pizza?

Era impossível negar um chamado desses. Havíamos conversado tanto ao longo do dia. Naquela noite, exaustos, vivendo no sítio histórico, havia um clima de romance, de ficção pairando no ar. Como um cenário. Como se fosse um filme:

- Mas é claro! - Eu aceitei.

Em quinze minutos de caminhada, já estávamos no Gourmet, e devidamente sentados, escolhemos uma Margherita. Depois que a fumegante pizza chegou, Nelson pediu um vinho tinto.

- Mas, vinho? - Fiquei estupefata.

- Qual o problema?

O problema é que eu achava vinho chique demais. Como se não bastasse castelo, gourmet, pizza, boa companhia e violinistas tocando lá ao fundo, vinho tinto era demais para uma interiorana como eu. Estava ali, sim, mas não podia esquecer minhas origens humildes. Eu fiquei desconcertada.

Desconcerto que durou pouco tempo. No segundo cálice de vinho e segunda fatia de pizza comida com as mãos, eu estava mais à vontade.

Eu sorria livremente, bem me lembro. E minha postura decaiu um pouco. Talvez ele podia ver parte do meu decote pela carcela entreaberta.

Podia sim, ele viu:

- Você parece um girassol...

- Hmm??Por causa da farda amarela? - Gracejei - Se eu pareço, você também parece.

- Mas você está desabrochando... sabia que gosto de flores?

- Hmm... que bom... - E eu não sabia nem o que falar.

Ele sabia o que falar. Mas parecia desconcertado. Nelson, de branco ficou mais vermelho que a pizza cheia de tomates e molhos. Eu também devo ter ficado, eu me sentia quente, mesmo naquela fria noite.

- Eu só faço pensar em você! Nem sei se devo dizer - Disparou ele, como se portasse uma carabina.

- Mas diga...!!! - Eu, fiquei de olhos arregalados, sem acreditar, e mais, esperava no que ali tinha por vir:

- Me imagino fazendo amor com você!

Ali estava com suas intenções despidas, o meu Anjo Pornográfico. Levei um tiro, e o projétil chamado verdade me atravessou o peito, e alojada no pulmão - não no coração - me tirou todo o ar. Pensei em mil escusas, pensei no meu noivo, pensei nos meus pais (ah, estes também com seus anos de diferença). Apenas pude responder com minha expressão de surpresa.

E desde então, a minha vida nunca mais foi a mesma, pois ele havia se mudado - de mala e cuias - para minha cabeça.

(P.S.: Esperem pelo próximo conto.)


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