E então, Daniela viajou para a casa de seus pais, no interior do Paraná, depois de pedir um tempo para mim, e até aquele momento, eu não entendia bem o que estava acontecendo, ou estava ao menos tentando decifrar sobre.
Os primeiros dias depois que Daniela pediu um tempo foram, sem dúvida, os mais difíceis da minha vida. Estar sem ela todos os dias na minha rotina era algo estranho, e sinceramente, impensavel a algum tempo atrás. Era como se uma parte de mim tivesse sido arrancada e deixada para trás. Eu andava pela casa, ou nas ruas, em todos os lugares que frequentava com ela, e eu a enxergava em todos os lugares: a xícara que ela adorava usar para o café, o livro que tinha deixado no sofá e até o cheiro dela que ainda pairava no ar. Era impossível não sentir a ausência dela em cada detalhe.
Ela voltou até antes do esperado da casa dos pais, pensei em procura-la, mas resolvi dar o tempo que ela tinha pedido. Ela havia falado com tanta certeza e convicção, que eu fiquei tentando encontrar dentro de mim, motivos de onde eu havia falhado.
Alguns dias depois, um dos nossos amigos me procurou e disse que tinha flagrado a Daniela e a Larissa em uma boate. Ele comentou que Daniela parecia feliz, dançando e curtindo a noite. Naquele momento, tudo o que pensei foi que ela estava realmente interessada em conhecer e experimentar outros homens, como outro amigo havia insinuado anteriormente. Isso me deixou furioso, e eu não quis escutar mais nada.
Mas Pedro, sempre sensato, acrescentou algo que me desarmou: ela estava rejeitando todos os homens na festa e, ainda por cima, usava o anel de namoro que eu tinha dado a ela.
Aquilo me deixou completamente confuso. Se ela tinha pedido um tempo de mim, por que ainda usava o anel? A atitude dela parecia contraditória, como se nem ela soubesse ao certo o que queria.
Tentei ligar para a Daniela mais de uma vez para tentarmos uma reconciliação, mas, em todas as tentativas, ela dizia que estava perdida e precisava se reencontrar.
— Isso tudo tem a ver com a Larissa? — perguntei em uma das ligações, tentando entender a situação.
— Não, Daniel — ela respondeu, suspirando. — Eu só quero entender o que eu quero para a minha vida. Você sabe que sempre vivi na sombra de alguém. Quero me sentir livre, pelo menos uma vez. Isso é um crime?
Depois dessa conversa, decidi deixá-la fazer o que quisesse. Mas, dentro de mim, tinha certeza de uma coisa: nada entre nós seria como antes.
Ainda naquela ligação, ela perguntou o que eu achava dela começar a trabalhar. Perguntei se era como professora na casa que ela havia mencionado antes da nossa separação. Ela confirmou. A partir daí, a conversa fluiu de forma mais leve. Eu concordei que seria bom ela começar a trabalhar, especialmente se isso a ajudasse a conquistar a independência que ela tanto dizia buscar.
Tentei ocupar a mente também, seja no trabalho, ou em algum hobby, mas era inútil. Meu trabalho parecia mais monótono, os dias mais longos, e até os encontros com os amigos perderam a graça. Pedro, meu melhor amigo, percebeu isso desde o início. Ele insistia para me tirar de casa, levar-me para jogar sinuca, jogo de cartas, ou apenas beber uma cerveja e conversar. Eu tentava acompanhar, mas era difícil. Cada vez que ríamos de algo, a primeira coisa que vinha à minha mente era que geralmente, Daniela estaria ali comigo nesses programas, e agora ela não estava mais.
Pensei, que talvez eu agi errado em não sair com ela junto nas vezes em que ela saia com Larissa. Deveria ter deixado de lado minha birra com aquela mulher, e ter ido com Daniela, por ela. Estava ali perdido em muitos pensamentos e sem nenhuma certeza.
— Cara, você precisa reagir — disse Pedro, em uma dessas noites, enquanto empurrava uma cerveja na minha direção. — Sei que a Daniela significa muito pra você, mas ela pediu um tempo, não um fim definitivo. Nem com os caras ela está saindo, deve ter algo a mais nisso tudo. Dá espaço pra ela e, enquanto isso, cuida de você.
— Eu sei, Pedro, mas é como se nada tivesse sentido sem ela. Eu me sinto... vazio.
— Olha, eu sei que não vai ser fácil. Mas talvez seja a hora de descobrir quem é o Daniel sem a Daniela, entende?
Eu tentava absorver os conselhos de Pedro, mas parecia impossível. Minha mente estava presa nela. Até que, em uma tarde, enquanto voltava do trabalho, recebi uma visita inesperada. Larissa, a melhor amiga de Daniela, apareceu no meu apartamento. Ela estava diferente, mais ousada, toda produzida naquele dia. De um jeito que me incomodava um pouco, com um olhar que eu não conseguia decifrar. Fiquei curioso com o que ela estava fazendo ali, então resolvi deixa-la entrar.
— Oi, Daniel — disse ela, com um sorriso que parecia esconder algo. — Posso entrar?
— Claro, Larissa. Aconteceu alguma coisa?
— Só queria ver como você estava. Sabe, depois de tudo.
— Você? — Perguntei, dando uma gargalhada logo em seguida. — Logo você, que convenceu a minha mulher a dar um tempo para mim? A me deixar?
— Eu? — Ela respondeu, com aquele jeito de cínica de sempre. — Eu não fiz nada, Daniel. Só pedia para Daniela me acompanhar nas festas. Ela que se vislumbrou, e decidiu te deixar. Mas eu não achei justo isso. Então vim conversar.
Concordei, desconcordando com ela, e sem cerimônias, eu convidei-a a entrar e ofereci algo para beber. A conversa começou casual, onde Larissa me contava mais sobre Daniela e como ela estava se sentindo, e senti sinceridade nas palavras dela, mas logo tomou um rumo inesperado. Larissa sentou-se perto demais no sofá, tocando meu braço de forma sutil.
— Sabe, Daniel, sempre achei que você era especial. Nunca entendi como a Daniela podia te deixar assim, tão... sozinho.
— Larissa, o que você está tentando dizer? — perguntei, desconfiado.
— Estou dizendo que talvez ela não te mereça. E talvez você precise de alguém que realmente te valorize.
— Isso é algo que meus amigos também dizem, mas eu náo acho que seja fácil assim.
— Seus amigos são bem inteligentes. — Respondeu, chegando mais perto, quase encostando o rosto no meu. — Você precisa de uma mulher que te deseje, como eu.
Fiquei em choque. Larissa, a melhor amiga de Daniela, estava claramente tentando me seduzir. Ela estava se preparando para sentar em meu colo, investindo na maior cara de pau. Levantei-me imediatamente.
— Larissa, você está ficando louca? — Questionei-a, tentando entender o que estava acontecendo. — isso não é certo. Você é amiga dela.
— Amiga? — disse ela, rindo com desprezo. — Ah, eu sou amiga dela, mas amizades e prazer são duas coisas que não andam juntas, e sinceramente, eu quero prazer hoje.
Larissa logo em seguida voltou-se até mim, avançando seu corpo, e tocando o meu. Passou a deslizar a ponta das mãos sobre meu peitoral ali, chegando mais próximo, e continuou:
— Daniel, eu sempre quis trepar gostoso com você, deixa essa Daniela pra lá. Você ta ai negando fogo e ela está saindo com o patrão dela. Sabia disso? Ela está dando aulas de piano para o filho dele, enquanto senta no patrão horrores, sabia disso?
Empurrei Larissa no sofá ao ouvir aquilo, indignado com o que havia acabado de descobrir, não crendo nas palavras dela.
— Isso não pode ser verdade. Daniela não faria isso.
— Acorda, Daniel! Você acha que ela pediu um tempo por quê?
— Bom.. — Eu realmente não sabia o que dizer. Larissa continuou:
— Daniela ta lá se divertindo com o boy cheio da grana, e você aqui marcando. Vem, vamos dar uma trepada gostosa que eu te ajudo a esquecer a sua amada Daniela.
As palavras de Larissa ecoaram na minha mente, deixando-me confuso e desconfiado. Por mais que eu quisesse acreditar em Daniela, as insinuações de Larissa começaram a se infiltrar nos meus pensamentos.
— Larissa, vai embora, por favor. Quero ficar sozinho.
— Aiai, eu vou sim. — Disse Larissa, pegando sua bolsa e se dirigindo a porta. — Tu é muito brocha, Daniel.
Os dias que se seguiram foram ainda mais difíceis. A rotina parecia um borrão, e eu me sentia perdido. Não existia um dia perfeito para mim se Daniela não estivesse nele. Saí novamente com meus amigos e, como sempre, acabei desabafando com Pedro sobre o que Larissa havia me dito.
— Cara, essa Larissa só pode estar mentindo. Você já percebe que ela é uma mau caráter só de ter vindo atrás de você depois que a amiga pediu um tempo — disse Pedro, direto como sempre.
— Você acha mesmo? — perguntei, confuso.
— Claro! Daniela jamais faria isso com você, Daniel. Vocês estavam juntos há tanto tempo, ela sempre foi fiel.
— Sei lá, cara... Larissa parecia bem sincera nas palavras. Será que realmente a Daniela já está com outro? — minha voz saiu quase num sussurro, refletindo a confusão e a dor que me consumiam.
Pedro suspirou e colocou a mão no meu ombro.
— Eu acho que a melhor coisa que você pode fazer é perguntar isso diretamente para ela. Para de ficar remoendo o que os outros dizem.
As palavras dele ficaram martelando na minha mente. Ele tinha razão. Eu precisava tirar isso a limpo.
Decidi que iria falar com Daniela e esclarecer tudo. Liguei para ela naquela mesma noite, mas ela não atendeu. Talvez estivesse ocupada com o trabalho, pensei. Mesmo assim, as palavras de Larissa não paravam de ecoar na minha cabeça. Por mais que eu quisesse confiar na Daniela, a dúvida estava ali, corroendo lentamente a minha paz.
Foi então que algo completamente inesperado aconteceu. Mais tarde naquela noite, ouvi a campainha tocar. Quando abri a porta, lá estava ela: Daniela. Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ela me puxou para um beijo. Fui pego de surpresa, mas não hesitei em retribuir. Em poucos segundos, estávamos nos braços um do outro, como se nenhuma distância ou problema jamais tivesse existido entre nós.
Aquela noite foi... única. Foi como se todos os sentimentos acumulados durante os últimos meses tivessem explodido de uma só vez. Fizemos amor com uma intensidade que não tínhamos há tempos. Foi um momento de conexão, de amor, de desejo, como se estivéssemos nos redescobrindo.
Depois, ficamos deitados na cama, o silêncio confortável preenchendo o quarto enquanto eu acariciava os cabelos dela. Eu queria aproveitar aquele momento ao máximo, guardar cada detalhe na memória, mas as palavras de Larissa continuavam me perturbando. Decidi que precisava perguntar.
— Daniela, posso te perguntar uma coisa? — comecei, hesitante.
Ela me olhou, mas antes que eu pudesse continuar, ela se levantou abruptamente.
— Eu... preciso ir — disse ela, começando a se vestir rapidamente.
— Ir? Fica mais um pouco... Por favor.
— Eu realmente preciso ir, Daniel. A gente se fala depois, tá?
Eu queria insistir, queria segurá-la ali comigo, mas algo no tom dela me fez parar. Vi Daniela sair pela porta, e fiquei ali, sozinho, tentando processar o que tinha acabado de acontecer.
Parte de mim sentia que aquilo tinha sido uma despedida. A maneira como ela agiu, a urgência em sair... Era como se ela estivesse se despedindo de nós, do que tínhamos. Mas outra parte, mais esperançosa, queria acreditar que ela tinha tido apenas uma recaída, que logo ela estaria de volta nos meus braços, onde sempre foi o lugar dela.
Infelizmente, o que veio depois não foi nada disso. Daniela começou a se esquivar cada vez mais. As respostas às minhas mensagens ficaram mais curtas, as ligações quase inexistentes. Era como se ela estivesse construindo um muro entre nós, e eu não sabia como derrubá-lo.
Os dias que se seguiram foram confusos e solitários. Eu me perguntava constantemente se aquela noite tinha sido real ou apenas um eco do que costumávamos ser. E, pior ainda, se ainda havia algo que eu pudesse fazer para trazê-la de volta para mim.
No dia seguinte, acordei com a sensação de que precisava fazer algo. A noite anterior tinha sido intensa, mas o modo como Daniela saiu, como se estivesse fugindo de mim, me deixava inquieto. Peguei o telefone e decidi ligar para ela. Precisava entender o que estava acontecendo. Precisava dela.
Depois de alguns toques, ela atendeu, mas sua voz parecia mais distante do que eu esperava.
— Oi, Daniel — disse ela, com um tom de voz neutro, quase indiferente.
— Oi, Dani. Tudo bem?
— Tudo... E você? — respondeu ela, como se estivesse no piloto automático.
— Não vou mentir, Dani. Não estou nada bem. Preciso falar com você sobre ontem.
Do outro lado da linha, ouvi um silêncio curto, mas carregado. Era como se ela estivesse escolhendo as palavras com cuidado.
— Daniel, ontem foi... Foi um momento que eu precisava. Mas não significa que as coisas mudaram entre nós.
Eu senti o coração apertar, mas tentei insistir.
— Dani, olha, eu sei que você pediu um tempo, mas a noite passada... Foi especial. Não foi só para mim, foi? Eu ainda te amo, e sei que você também sente algo por mim. Por que não podemos tentar de novo?
Houve outro silêncio, mais longo dessa vez. Finalmente, ela suspirou.
— Daniel, eu... Não é tão simples assim.
— Por que não? — perguntei, frustrado. — Dani, a gente sempre superou tudo juntos. O que está acontecendo? É algo que eu fiz? Alguém disse algo?
— Não é você... Sou eu — ela respondeu, e o clichê da frase me atingiu como um soco.
— Então me explica, Daniela. Ontem parecia que ainda havia um "nós". Por que você está se afastando?
— Porque eu preciso, Daniel! — ela disse, de repente com um tom mais firme, quase irritado. — Eu estou tentando me encontrar, tentando entender o que quero da minha vida. E essa pressão só me deixa mais confusa.
— Pressão? Dani, eu só quero estar do seu lado. Só isso.
— Não é tão simples assim, Daniel! Ainda mais agora... — As palavras dela foram como uma faca atravessando meu peito.
Fiquei em silêncio por um momento, tentando absorver o que ela tinha acabado de dizer. Quando falei novamente, minha voz saiu mais baixa, quase num sussurro.
— Você não quer mais ficar comigo? É isso?
— Eu quero, Daniel... Eu só... Não posso fazer isso agora.
A resposta dela parecia ensaiada, mas algo no tom me dizia que havia mais por trás. Algo que ela não estava me contando.
— Você está escondendo algo de mim? — perguntei, direto.
— Não! Claro que não! — Ela respondeu rápido demais, e sua voz parecia um pouco trêmula. — Daniel, eu preciso ir agora, tá? Tenho... Tenho compromisso.
— Dani, espera... Por favor.
— Eu já disse tudo o que podia dizer. A gente conversa outra hora.
E, antes que eu pudesse insistir, ela desligou.
Fiquei ali, segurando o telefone, sentindo como se tivesse sido empurrado para fora de um penhasco. A voz dela, a pressa em encerrar a conversa, tudo parecia errado. Daniela nunca tinha sido assim comigo antes.
Eu sabia que havia algo mais acontecendo. Mas o que quer que fosse, ela não queria que eu soubesse. E isso só fazia a dor e a dúvida crescerem ainda mais dentro de mim.
Foi então que, por acaso, quando a vida não estava me dando mais nada, que ela me deu uma surpresa, e dessa vez, uma agradavel surpresa. Depois de 8 anos, eu reencontrei Jordana, um amor de infância que não via há anos. Ela estava ainda mais linda do que eu lembrava, com aquele sorriso que parecia iluminar qualquer ambiente. Confesso que num primeiro momento, fiquei impactado com tudo que vi.
— Daniel? — disse ela, surpresa. — É você mesmo?
— Jordana? Nossa, quanto tempo!
— Eu não esperava que fosse te reconhecer, mas certas pessoas são tão marcantes que nunca esquecemos!
Nos sentamos em uma cafeteria e começamos a conversar. Falei sobre minha vida, meu trabalho e, sem entrar em muitos detalhes, mencionei os problemas que estava enfrentando. Jordana ouviu tudo com atenção, sem julgar, apenas presente.
— Jordana, tem algo que está me deixando louco — comecei, enquanto mexia no meu café, olhando para a xícara como se ela pudesse me dar respostas. — E... Eu não sei com quem mais falar sobre isso.
Ela inclinou a cabeça, os cabelos ruivos caindo pelo ombro enquanto me olhava com aquele jeito acolhedor.
— Daniel, você sabe que pode falar comigo. O que está acontecendo?
Eu suspirei, tentando organizar os pensamentos antes de abrir a boca.
— Minha... namorada... bom, ex, talvez. Ela pediu um tempo. Disse que precisava se reencontrar. E, desde então, eu estou sem chão.
Jordana franziu a testa, mas manteve o tom calmo.
— Um tempo? Isso é complicado... Mas você acha que ela realmente precisa disso ou é algo que ela disse para... sabe, se afastar?
— No início, eu achei que era só isso, um tempo mesmo — respondi, soltando um riso amargo. — Mas depois de algumas semanas, ela apareceu na minha casa. Do nada.
— Ela foi até você? — Jordana perguntou, arqueando uma sobrancelha. — E o que aconteceu?
— A gente conversou... Quer dizer, nem conversou muito. Acabou que... fizemos amor. Foi intenso, como se tudo voltasse ao normal por uma noite. Mas... — pausei, tentando controlar a confusão em minha voz. — Depois disso, ela ficou ainda mais distante. Esquiva. Como se aquilo não tivesse significado nada.
— Entendi — disse Jordana, cruzando os braços e me observando com cuidado. — E você acha que ela está com outro?
Eu hesitei. Essa era a parte mais difícil de admitir.
— Não sei... Mas uma... pessoa me disse que ela pode estar saindo com alguém. Talvez até com o chefe dela.
Jordana estreitou os olhos, parecendo analisar cada palavra.
— E essa pessoa que te contou, você confia nela?
— Não muito. Na verdade, não confio. Mas as coisas que ela disse fazem sentido, sabe? Ou, pelo menos, deixam espaço para dúvida. E isso está me corroendo.
Ela balançou a cabeça lentamente, e um pequeno suspiro escapou de seus lábios.
— Daniel, olha, eu vou ser bem honesta com você. Primeiro, você precisa parar de se torturar com essas suposições. A dúvida mata mais do que a verdade. Se você acha que há algo errado, pergunte diretamente para ela. Mas faça isso quando estiver preparado para ouvir qualquer resposta.
Eu passei a mão pelos cabelos, frustrado.
— Eu tentei, Jordana. Liguei para ela ontem, mas parecia que ela estava com pressa de encerrar a conversa. Era como se ela quisesse fugir de mim.
— Isso não é um bom sinal, Daniel — ela disse, pensativa. — Mas, ao mesmo tempo, pode significar que ela está confusa. Você precisa entender uma coisa: às vezes, as pessoas pedem tempo porque estão lutando contra coisas dentro delas. Não significa necessariamente que ela está com outro.
— Mas e se estiver? — perguntei, a voz saindo mais amarga do que eu pretendia.
Jordana se inclinou para frente, olhando diretamente nos meus olhos.
— Se ela estiver, Daniel, então você precisa decidir se vai seguir em frente ou continuar se machucando com isso. Não é justo com você ficar preso em algo que pode não ter solução.
Eu fiquei em silêncio, processando as palavras dela. No fim das contas, aquela tarde foi quase que um presente de Deus pra mim, a entrada de Jordana me fez exclarecer melhor as coisas.
— E se eu não quiser desistir dela? — perguntei, mais para mim mesmo do que para ela.
Jordana sorriu suavemente.
— Então lute por ela, mas não perca a sua dignidade no processo. Mostre que você está ali, que quer resolver as coisas. Mas se ela continuar fugindo... talvez seja hora de aceitar que o "nós" não é mais o que era.
As palavras dela eram duras, mas verdadeiras. Eu sabia que precisava fazer algo, mas, naquele momento, tudo o que queria era ficar ali, ouvindo Jordana. Ela sempre foi meu porto seguro, mesmo depois de tantos anos separados. E agora, parecia que ela estava me ajudando a reconstruir os pedaços de mim mesmo que haviam se perdido.
— Sabe, Daniel, às vezes precisamos passar por momentos difíceis para descobrir o que realmente importa. Se precisar de alguém para conversar, estou aqui.
— Mas e você, Jordana. O que faz aqui, pensei que estivesse na Europa.
— Eu estava. — Ela completou em seguida. — Mas eu estou aqui pois existe algo muito difícil que eu preciso fazer. Eu estou trabalhando com a Polícia federal daqui e a interpol em um assunto um tanto... Delicado.
— Não precisa me dar detalhes disso. Seja qual for o seu assunto, isso é algo que diz respeito apenas a você. E o seu irmão? Continua o mesmo?
— Ah, o Gustavo... — Naquele momento, eu a vi distante, os olhos quase começaram a cair uma lágrima, e eu levei meu dedo até eles, enxugando-os em seguida.
— O que houve?
— Não é nada, Daniel. É só uma lembrança ruim. — Ela se recompos em seguida. — mas respondendo a sua pergunta, ele continua o mesmo galinha de sempre, iludindo e brincando com as mulheres enquanto agora é casado, e com filho. Eu sinto pena do meu sobrinho e da minha cunhada, tendo ele como marido. Mas infelizmente ele é igual ao nosso pai.
— Ah é. — Concordei com Jordana, mas não fazia muito ideia do que ela dizia. Não conhecia muito bem Gustavo, só sabia que ele era 10 anos mais velho que nós. Mas conhecia muito bem o pai dele.
Era um homem poderoso, ganancioso, que fazia de tudo para ter poder e as pessoas na sua coleira. Era um dominador, em todos os sentidos. Minha família tinha problemas com o pai dela, principalmente porque a irmã do meu pai foi seduzida por ele, e ele fazia práticas digamos.. fora do comum com ela.
A presença de Jordana, por fim, foi um alívio inesperado. Começamos a nos encontrar com mais frequência, e, a cada encontro, nossa conexão parecia crescer. E não apenas isso, nosso carinho foi crescendo ainda mais. Ela era atenciosa, divertida e tinha uma forma única de me fazer sentir melhor.
Em contrapartida, estranhamente, agora era Daniela que insistia em me ligar muitas vezes, mas eu passei a ignora-la. Queria um tempo, não é? Pois então era isso que eu daria a ela. Enquanto isso, meus encontros com Jordana não cessavam, e todo dia era uma descoberta. em um desses encontros, Jordana me surpreendeu.
— Daniel, preciso te dizer algo — começou ela, nervosa. — Eu não consegui te esquecer. Em todos esses anos, sempre pensei em você e sinceramente, eu quero você. Sei que existe a sua ex namorada, mas se existir algum espaço ai pra mim...
Fiquei em silêncio, pego de surpresa. Jordana era incrível, mas meu coração ainda pertencia a Daniela. Não sabia o que falar, ou fazer.
— Jordana, você é uma pessoa maravilhosa. Mas... eu ainda amo outra pessoa.
Era noite quando Jordana finalmente se levantou do sofá da minha sala. A luz amarela do abajur iluminava seu rosto, que parecia uma mistura de coragem e tristeza. Eu sabia que ela estava prestes a ir embora, mas o silêncio entre nós era tão pesado que parecia uma barreira intransponível.
— Eu não devia ter falado nada, não é? — ela quebrou o silêncio, ajustando a alça da bolsa no ombro. Sua voz era baixa, quase um sussurro. — Só... achei que você merecia saber como eu me sinto.
Eu me aproximei, cruzando os braços enquanto olhava para ela. Ainda estava digerindo suas palavras, sua confissão inesperada de que me amava, que queria estar ao meu lado.
— Jordana... — comecei, hesitante. — Não é isso. É que, bem. Minha ex, ou namorada, eu não sei... Ela ainda vive em mim.
Aquelas palavras pareceram atingir Jordana como um golpe. Ela sorriu, mas era um sorriso quebrado, forçado.
— Eu sei. Sempre soube. E não te culpo por isso. Você ainda está preso a ela, e isso é algo que só o tempo pode resolver.
Ela deu um passo em direção à porta, mas algo dentro de mim gritou para que eu não a deixasse partir assim. Talvez fosse o medo de perdê-la de vez. Talvez fosse o peso da solidão que me consumia há semanas. Ou talvez fosse apenas o jeito como ela olhava para mim, com um misto de dor e esperança.
Antes que eu pudesse racionalizar, avancei. Minha mão segurou seu braço, firme, mas gentil, e ela se virou, surpresa. Não houve palavras. Não houve espaço para dúvidas. Apenas a necessidade que explodiu dentro de mim como um raio.
Eu a beijei.
Foi um beijo intenso, cheio de paixão reprimida, cheio de desejo que nem eu sabia que estava ali. Sua respiração ofegante encontrou a minha, e por um instante, parecia que todo o resto desaparecia. O gosto dela, o calor dela... era como se o mundo tivesse parado.
Jordana demorou um segundo para reagir, mas então ela correspondeu, seus braços se enroscando ao redor do meu pescoço. O beijo era um turbilhão de emoções: confusão, desejo, e talvez até uma tentativa desesperada de apagar as dores do passado.
Quando nos afastamos, ambos estávamos ofegantes, nossos olhos fixos um no outro. Jordana levou uma das mãos aos meus cabelos, ainda me olhando como se tentasse entender o que aquilo significava.
— Daniel... — ela começou, mas sua voz falhou.
— Eu não sei o que estou fazendo — admiti, minha testa encostando na dela. — Mas, por um momento, eu só quis... te sentir.
Ela suspirou, seus dedos deslizando suavemente pela minha nuca.
— Eu não vou ser uma substituta para ela. Você sabe disso, certo?
Eu assenti, engolindo em seco.
— Não, você não é uma substituta.
— Obrigada pelo que você me deu hoje. Mesmo que tenha sido confuso... significou algo para mim.
Eu dei um passo em direção a ela, querendo dizer algo, qualquer coisa, mas as palavras não vieram. Tudo o que consegui fazer foi acenar com a cabeça enquanto ela atravessava a porta e desaparecia na noite.
A despedida dela deixou um vazio na casa, mas também uma pequena faísca dentro de mim. Algo havia mudado, mesmo que eu ainda não soubesse exatamente o que. Talvez fosse a percepção de que, mesmo com tudo que eu sentia por Daniela, o mundo continuava girando. E, de alguma forma, Jordana me fez enxergar isso. E eu mal sabia, que ali, do outro lado da rua, observando Jordana sair, estava Daniela.