Nosso primeiro passeio em Lençóis foi dentro da Fazenda Pratinha, onde ficamos hospedados. É um pouco longe do centro, mas já nos dava acesso a vários lugares para visitar e aproveitar. Kaique e Milena foram logo para a tirolesa e nós já ficamos de olho no que poderíamos fazer no outro dia, já que pretendíamos percorrer outras cidades.
Saindo da fazenda, havia alguns lugares mais em conta para alimentação, e nós sentamos em um desses restaurantes. De cara, fomos super mal atendidos, mas, como o pedido já havia sido feito, resolvemos aguardar.
Demorou bastante, mas chegou. Um casal sentou na mesa ao lado da nossa e recebeu uma resposta seca ao perguntarem se havia alguma opção para veganos. O mesmo tratamento ruim foi dado a eles, ficamos olhando e o rapaz perguntou:
— É sempre assim? — Em tom de riso.
— Não sei, mas com a gente também foi. — Respondeu Juh.
— Eita, que experiência maravilhosa! — Brinquei, e nós rimos.
— Aí já não é culpa nossa... — Disse meu irmão.
— Ahhhh, então você admite a culpa? — Perguntei, já zoando.
— Nada disso!!!! — Loren tentou, mas já foi tarde demais.
Nós comemos, as crianças também, e depois ficamos passeando. Vimos que tinha flutuação, mergulho, trilha... Uma variedade de coisas legais para fazer e muitas cachoeiras para conhecer. Meus filhos se animaram bastante com a flutuação na gruta. Quando terminaram a explicação, eu olhei para o pessoal, e todos estavam empolgados, com exceção da minha muié e da minha irmã.
— Ué, não curtiram? — Perguntei.
— Não sei se vou nisso, tô com medo. Tem cento e setenta metros e é muito escuro... — Disse Juh.
— Vou estar com você, gatinha, do seu ladinho... Vamos, vai ser legal — Falei, abraçando-a e dando beijinhos intercalados em cada lado do pescoço. Ela sorriu, para mim, foi uma confirmação.
— Para de agarração aí, oxe... — Falou Loren.
— E você? Medo também? — Perguntei para ela, mesmo sabendo que não tinha.
— Não, acho que vai ser legal... — Loren disse, mas, por algum motivo, o rosto dela dizia o contrário.
Victor estava ao lado dela, acredito que tentando descobrir o porquê daquela mudança de humor repentina, e eu percebi que ela o tratou mal, de forma grosseira. Ele ficou todo borocoxô, porém permaneceu ao seu lado.
Loren é alto astral, com quem ela tem intimidade é um poço de implicância, mas, sempre que percebe a necessidade, deixa claro o amor que sente pelas pessoas. Ela não é mal-educada ou grossa, ali fugia dos padrões de zoação e eu resolvi me intrometer.
Puxei minha irmã e perguntei:
— Qual foi, vocês brigaram?
— Não, não... Só estou pensativa com uma coisa... Depois conversamos... — Ela disse e ia saindo, mas eu a segui.
— Não trata o cara assim também, poxa. — Falei, e ela acenou com a cabeça.
Foi até Victor, deu um selinho, falou algo e ele a abraçou.
— Para de agarração aí, oxe... — Brincou Juh, imitando o tom que Loren falou com a gente, e eles riram.
Pelo visto, ficou tudo bem.
No outro dia, a primeira coisa que fizemos foi o mergulho, caso contrário, Kaique e Milena morreriam. Os dois estavam maluquinhos, bem animados, e foram os primeiros a colocar o equipamento.
Júlia queria ir, mas estava com medo. Enquanto o pessoal se preparava, eu fiquei tentando convencê-la, até que, após alguns beijos e estímulos pela imaginação, consegui vencer a batalha.
Eu já tinha ido e sabia que era maravilhoso, e conheço minha muié, ela ia se arrepender se não fosse.
É bem escuro, mas uma experiência maravilhosa. O azul da água é lindo, dá para ver vários peixes, grandes e pequenos, e dá uma sensação maravilhosa.
O casal que encontramos no restaurante também estava e nos cumprimentamos. Combinamos de almoçar dentro da fazenda para evitar sermos maltratados. Falei isso rindo e eles riram junto.
Deixamos as crianças livres, às vezes nós dávamos umas leves guiadas pelo ombro porque se distraiam com muita facilidade, mas, fora isso, foi muito tranquilo lidar com eles. Lindinhos demais, sempre apontando para mostrar alguma coisa nova, e quando eu colocava a lanterna no rosto deles, conseguia sentir a alegria e animação só pelos olhinhos brilhando, mesmo por cima da máscara.
Assim que saímos, apreciamos a beleza da entrada da gruta e fui abraçada por Juh, que tinha amado o passeio, ao encontro dos nossos filhos, que amaram o triplo.
— Mãe, a senhora viu os peixes??? Muitos peixinhos lindinhos!!! A gente pode ter um peixe??? — Disse Mih, se pendurando em mim.
— Calma, calma... Vamos cuidar do Brad primeiro, depois a gente vê isso de peixe. — Falei, mas rindo e achando lindinho toda aquela empolgação.
Ela já havia ido, mas mal se recordava e nem fez os passeios. Era bem pequenininha.
— Foi muuuuito radical!!!! — Falou Kaká, se agarrando na mamãe dele.
Mih estava apaixonada pelos peixinhos e eu resolvi brincar.
— Rapaz, aqueles peixes, numa moqueca, iam ficar uma delícia — Falei para que somente ela ouvisse.
— Mãe!!!! — Ela gritou, brava, e foi para o colo de Juh. Eu comecei a rir muito.
— Oxe, o que foi, filha??? — Juh perguntou para ela.
— Minha mãe! — Ela exclamou, me olhando, enquanto eu me derretia de tanto gargalhar.
— Amor, o que você fez???? — Júlia insistiu, me perguntando, mas eu não conseguia responder.
— Conta, mãe!!! — Disse Kaká, animado.
Milena disse, bem irritada e em alto e bom som:
— Ela disse que queria comer os peixes!
Eu não conseguia parar de rir. Juh arregalou os olhos e fez um leve sinal com o queixo. Direcionei o olhar para onde ela apontou e o casal vegano estava exatamente assim: O_O
No mesmo momento, levei os lábios para dentro da boca e soltei um:
— É brincadeira, é claro... — A minha vontade era de rir mais ainda, mas eu me contive.
— Que experiência maravilhosa, hein, Lore?! — Brincou Lorenzo, rindo da minha cara, e nós saímos dali.
Ficamos no rio o resto da tarde, ele tem a água cristalina, então minha gatinha não tinha medo.
Vi Loren passar com Sarah e ela pediu desculpas. Minha cunhada disse que estava tudo bem. Lorenzo se aproximou e perguntou: — O que tá acontecendo com Loren? Porra, chata pra caralho!
— Também não sei, parece que ela está preocupada com alguma coisa... — Falei.
— Mas ninguém tem culpa, ela não deve descontar em nós... — Ele concluiu.
Olhei para Juh a fim de saber se ela estava ciente de algo, porém ela negou com a cabeça.
— Ela tá estressada, gente, deve estar na TPM — Tentou justificar Victor, mas nem na TPM eu já tinha visto ela agindo daquela maneira.
Nós paramos de falar porque ela já se aproximava com Sarah, trazendo picolé nas mãos, e nós fomos sentar em uma mesa. Depois de beber e conversar bastante, enquanto as crianças faziam inúmeras atividades, fomos trocar de roupa para descer para o almoço.
Fiquei por último para tentar saber o que estava acontecendo com Loren. Se a minha indignação não acabou com a viagem, a irritação sem motivo dela também não ia acabar.
— Ei, por que tá assim? Tá todo mundo comentando... — Perguntei.
Ela revirou os olhos e adiantou os passos. Foi a primeira a chegar e se dirigiu para o quarto.
É... Se ela não estava se sentindo à vontade para falar, eu não ia forçar.
Assim que fui entrando, ela me chamou e nos trancou no quarto.
— Desculpa, eu estou estressada com uma coisa... — Ela falou.
— Mas a gente tem culpa? — Perguntei.
— Acho que estou grávida! — Minha irmã falou e começou a chorar, cobrindo o rosto com as mãos.
— Calma, calma... Fez o teste? — Perguntei, abraçando-a, e ela negou com a cabeça. — Você pode estar se estressando à toa e descontando em gente que não tem nada a ver... — Falei, e ela continuava chorando.
— Eu não queria ter filho agora, não queria mesmo! — Ela falou, agora com a cabeça no meu colo.
— Victor não sabe dessa sua suspeita, não é? — Perguntei.
— Não, quis contar, porém ele ia saltar de felicidade... E se eu não estiver, pode ficar decepcionado... — Ela explicou.
— O que você notou de diferente para desconfiar? — Perguntei.
— Minha menstruação, que nunca atrasa... Atrasou... — E voltou a chorar.
— Deixa pra chorar quando tiver certeza, muié — Brinquei, mexendo na bochecha dela, mas ela não conseguia parar.
Fiquei ali até que minha irmã se acalmasse novamente.
— Quer fazer um teste? Se quiser, eu vou atrás de um. — Sugeri, e ela aceitou.
Peguei um moto táxi e fui até o centro comprar (peguei logo três) porque nos lugares que fui da Fazenda não tinha. Eu meio que já esperava por isso.
Voltei, bati na porta e entreguei nas mãos dela. A bichinha estava tremendo, pediu para eu entrar no banheiro com ela e esperou o tempo inteiro com o rosto fincado em mim.
— Vê para mim — Ela pediu, e eu atendi.
Havia dois tracinhos bem acesos. Positivaço.
— Você vai ser mamãe, irmã — Falei, e a abracei bem forte porque agora ela chorava muito mesmo.
— Meu Deus, meu Deus... O que eu vou fazer agora? E o meu trabalho? E as empresas? — Ela repetia sem parar.
— Uma coisa de cada vez, nossa família vai entender, eu sei que é normal se sentir perdida ao descobrir uma gravidez, e entendo o quanto isso pode parecer assustador para você nesse momento. O mais importante é que você não precisa enfrentar isso sozinha. Victor vai explodir de felicidade, será um paizão. Tem Juh, Lorenzo, tem Sarah, tem seus sogros, nossos pais... E eu... Que vou estar sempre do seu lado. Juntas podemos pensar nos seus próximos passos. Cada sensação que você está tendo é válida, e podemos dar tempo para que tudo se organize na sua cabecinha.
Ela foi se acalmando e retornamos para a cama.
— Finalmente vou ser tia... — Falei sem querer e muito feliz.
— Mih e Kaká vão adorar... — Ela disse, e era verdade.
— Como quer contar a Victor? — Perguntei, e finalmente ela sorriu.
— Ele vai amar... A gente pode fazer uma surpresa por aqui, né? Não vou aguentar esconder por muito tempo. — Ela disse, e eu concordei.
No outro dia, íamos fazer uma trilha longa até a cachoeira. Sugerir que ela contasse e entregasse um teste para ele lá. Minha irmã curtiu a ideia.
Se fosse Juh, daria uma sugestão melhor e mais criativa.
— Tomara que não seja uma criança chata que nem a mãe — Brinquei, e ela me empurrou da cama, rindo.
— Se puxar a você, que será... — Ela rebateu.
— Você tá mais felizinha? — Perguntei, enchendo-a de beijos, e Loren confirmou com a cabeça.
Tomamos banho bem rápido e fomos almoçar. Todos já estavam lá esperando por nós.
Achei que ou eles estariam revoltados com nossa demora ou curiosos com nossa conversa, porque meu irmão jurou que ia ser uma comida de rabo, mas ele nem imaginava o estresse da irmãzinha dele. Era por achar que ele ia ser titio.
Eles estavam discutindo o prato que pediram, era da culinária regional. Alguma coisa com um tipo de cacto. Juh se recusava a comer e eles estavam tentando convencê-la de que era gostoso.
— Não consigo, não consigooooo — Ela dizia, enquanto Lorenzo a perseguia com um garfo cheio.
— Larga de ser fresca — Falava meu irmão, rindo.
— Kaká e Mih atacaram, olha isso — Disse Victor.
— Deixa a menina, ela já pediu o prato dela... — Tentava contornar Sarah.
— Que experiência maravilhosa, amor! — Falei, e ela pediu para eu sentar entre Lorenzo e ela. Assim eu fiz.
O tal cacto tem um gosto bem forte, mas não é ruim. Não consigo colocar nas minhas comidas preferidas, mas é sim gostoso.
(Prefiro carne, deixa os cactos plantados mesmo)
Mas, por falar em planta, o casal de veganos sentou bem longe de nós, acho que se ofenderam com minha inofensiva brincadeira.
Pela noite, estava todo mundo com vontade de curtir, um ficando na frente da fazenda procurando informações. Conversamos com um rapaz sobre nosso roteiro. Ele disse que era melhor a gente alugar um carro e que poderíamos devolver na última cidade que iríamos. Ele quem fazia esse tipo de negócio.
Se a gente tivesse ido de carro, não precisaríamos fazer isso. Eu não ia me revoltar, mas seria o meu tempo de glória. Decidi encher o saco de todos.
Comecei a gravá-los enquanto dizia:
— Bora, fala aí, eu sempre devo escutar o que minha irmã diz. — E fiquei perturbando-os.
Eles se recusavam, então virei a câmera para meus filhos.
— Bora, vocês também têm uma parcela de culpa... Gostaram da viagem ou eu tinha razão? — Perguntei.
Eu não contei no capítulo anterior, mas quando fizemos a parada, Mih e Kaká estavam dormindo. O humor deles com sono é bem ruim, ficaram quietinhos, mas incomodados.
Esses aí admitiram facilmente e riam de tudo.
— Bora, amor... Quero ouvir de você também, não fique receosa... Vou adorar ouvir dessa boquinha linda que eu sempre tenho razão... — E a beijei diversas vezes enquanto ela ria.
Juh tomou o celular de minha mão e falou:
— Eu nuuuunca mais vou contrariar essa mulher, por que ela tem razão? Não! Porque ela não deixa ninguém em paaaaz depois!!!! — Ela disse, me entregando de volta.
— Gostei do seu relato, serve... — Falei, pertinho da boca dela.
— Te amo! — Juh disse e me beijou.
Já que meus irmãozinhos não quiseram reconhecer e confessar que eu sempre estive certa e ir de ônibus foi uma loucura, fiz meus filhos irem zoando o ouvido deles o caminho inteiro, "cantando" assim: "Minha mãe Loren sempre tem razaaaaao". Quando chegamos na entrada de um espaço que parecia animado, Lorenzo parou a caminhonete, e Loren e ele correram atrás de Mih e Kaká para fechar a boca. As crianças acabaram caindo. A roupa de Milena dava para disfarçar, mas a camisa branca de Kaique automaticamente ficou marrom.
— Ainda bem que tons terrosos estão na moda... — Falei brincando, enquanto Juh tentava amenizar o estrago.
— Que experiência maravilhosa... — Lamentou Loren, e eu ri dela.
Foi uma noite legal e eu estava muito feliz por saber que seria tia pela primeira vez. Sempre quis viver isso e tinha certeza de que minha irmã seria uma ótima mãe.
Quando retornamos e as crianças dormiram, saí do banho e Juh já estava deitada. Essa noite teríamos uma barreira entre nós, porque os bonitinhos adormeceram bem ao meio, mas cá para nós, era uma barreira bonitinha.
— Como foi a conversa com Loren? — Juh me perguntou, e eu não consegui esconder o meu susto por não esperar e por não poder dizer. Minha irmã pediu segredo até da minha mulher. — Você não pode contar? Ela questionou ao perceber o meu silêncio e expressão.
— Não, mas... — Tentei dizer, e ela pôs a mão na minha boca.
— Não tem problema, sei que ela não é assim. Se ela pediu segredo, é porque não quer que ninguém saiba, tá tudo bem! — Juh concluiu.
— Mas é uma coisa boa e você vai saber logo. — Finalizei a minha linha de raciocínio e dei um beijinho de boa noite na minha gatinha.
— Agora fiquei um pouco curiosa... — Ela falou, sorrindo, e me deu um beijinho.
Deitei há 1 km de distância do meu amô e passei o braço por cima das crianças, abraçando-as. Juh fez o mesmo até a gente ter um contato físico, e assim eu dormi. Despertei de madrugada para beber água. Eu estava pingando de suor e o calor era infernal. Olhei para o lado e Júlia estava acordada, também morrendo de calor.
— Calor, né, amor? — Perguntei.
— Não consegui dormir ainda... — Ela disse, se levantando para beber água também.
— Bora tomar um banho? — A chamei, e ela aceitou.
Era para ser só uma ducha, afim de eliminar o calor... Mas acabou sendo um pouco mais que isso... 🔥