– Me perdoa, mano, por favor! Juro por Deus que não queria que isso tivesse acontecido... – o Dan me falou isso chorando.
– Pelo amor de Deus, cara, fala logo o quê que tá acontecendo...
– A minha esposa descobriu que eu sou gay...
– Você já me falou isso, Dan. Me fala o que aconteceu! Por que você tá assim, todo vermelho, cheio de marca, com a roupa rasgada? Como ela descobriu da gente? Ou melhor, como ela ficou sabendo que a gente se beijou ou alguma coisa assim?
– Ela não descobriu nada sobre mim e você...
– E como é que ela ficou sabendo? Alguém contou pra ela?
– Naquele dia que você tava no hospital e a gente meio que brigou, eu saí estressado de lá e fui a um bar. Eu bebi, bebi, e conheci um cara... A gente ficou por uma noite e ela descobriu tudo... Não sei como, mas ela descobriu. Cara, me desculpa, por favor..
Decepcionado. Eu fiquei decepcionado com o Dan. A gente não tinha nada, isso era certo, mas eu fiquei decepcionado com ele. Pensei que aquele beijo nosso tinha sido o suficiente para saber que ele gostava de mim, mesmo eu pensando no Ícaro... Me levantei e fiquei sem reação. Eu tava decepcionado e desacreditado. Ele só chorava no sofá.
– Théo, me desculpa, mano, mas eu tinha ficado com raiva de você de verdade. Eu queria tanto te ajudar resolvendo aquele problema pra você que quando você disse que não ia me dizer quem foi o cara que te bateu, eu fiquei louco de raiva. Minha vontade era de bater nesse filho da mãe... Eu não conseguia parar de pensar em você levando uma surra... Você é tão bonito, tão lindo, tem um rosto tão lindo...
– Você tá tentando colocar a culpa em mim? – falei calmamente.
– Você é o único que não é culpado em tudo isso. Você é a maior vítima. Eu quem errei. Certo que a gente não tem nada, a gente quase-mal se conhece, mas a gente tava caminhando pra rolar alguma coisa...
Será que estávamos? Será que se ele não tivesse chegado a minha casa e me contasse tudo isso ia dar certo, caso eu engatasse um romance com ele mesmo sabendo que eu tava gostando do Ícaro? Eu não sabia a resposta dessa pergunta. Sinceramente, eu não sabia mesmo!
– Me perdoa, Théo! Ontem a gente quase... Eu vacilei feio!
– Mas eu não tenho que te perdoar de nada, Dan. Claro que eu tô em decepção. Não esperava isso de você, mas você não me deve nenhuma desculpa! Se rolou, era pra ter rolado. Não adianta você me pedir perdão.
– Enquanto você tava lá naquela cama de hospital, eu tava me divertindo. Se esse cara aí nunca tivesse te batido, eu teria me divertido com você!
– Você fez o que achou que era certo. Num momento de raiva, a gente faz qualquer coisa errada, Dan. Você tinha esse direito. Nós não somos nada...
– Mas eu queria te fazer feliz. Eu quero te fazer feliz. Desde aquele dia que a gente se conheceu no banheiro, eu não paro de pensar em você. Minha vontade é de ter agora, só pra mim, mas depois disso é impossível que role alguma coisa. Digo isso porque eu tô te dando valor. Seria muita burrice sua se envolver com um cara que não te respeitou, Théo!
Eu não podia ser humilhado novamente. Não podia, não podia, mas o que foi que eu decidi? Ser humilhado novamente. Mas não foi pelo Dan.
– Faço das suas palavras, as minhas, Dan. Você tem razão. Nós estávamos andando pra um relacionamento, mas acabou o encanto.
– Eu não tiro a sua razão, Théo! – falou chorando.
– Se você fez isso comigo e a gente nem tava namorando, não quero imaginar o que você faria se estivéssemos. O encanto acabou, mesmo!
– Me perdoa, de coração.
Ele se levantou do sofá e me deu um abraço. Ele se superava a cada abraço que me dava. Por um minuto eu me senti culpado. Coloquei a culpa nele, tudo bem, mas se a gente começasse a namorar eu estaria mentindo pra ele. Eu não gostava dele como gostava do Ícaro. Com ele era mais coisa de vontade, de calor do momento, já com o Ícaro era uma coisa de antigamente, de paixão... A partir do momento em que eu começasse a namorar o Dan, estaria enganando ele, e eu não queria isso de jeito algum.
O abraço dele foi seguido por um beijo. Ele me abraçou com toda a sua força e me deu um beijasso. Eu também o abracei e retribui o beijo. O mesmo calor da noite passada tinha voltado e eu sentia uma coisa mágica com aquilo tudo, mas resolvi acabar com o transe. Saí daquele beijo e lhe dei mais um abraço. Ele se afastou.
– Espero que você siga com a sua vida. Você é um rapaz iluminado, Théo. Vai se dar bem na vida. Fica bem!
E ele saiu do meu apê, e nós trocamos um último olhar. Como aquilo tinha sido doloroso. Não sabia mais pra onde correr, ou o que seria de mim sem o Dan, ou sem o Ícaro. O que eu ia ter que fazer? Abaixar a cabeça e seguir em frente? Seguir com a minha vida e esquecer tudo aquilo que tinha rolado? Falar com o Ícaro? Ir atrás do Dan? Adivinhem qual que eu escolhi? Sim, falar com o Ícaro, mas não foi de instantâneo. Eu tava muito abalado com tudo aquilo que tinha rolado com o Dan.
Sentei-me ao sofá pra relaxar um pouco, mas não dava. Fui à cozinha e nada. Deitei-me na cama, mas nada também.
Tudo me fazia lembrar o Ícaro. Chegava a ser engraçado: Eu tinha acabado de terminar uma quase-relação com um cara lindo e eu só fazia pensar num babaca que tinha arrebentado a minha cara. Eu comecei a pensar no que eu era: Um bobo apaixonado ou um idiota amargurado... Fiquei com a primeira opção, mas era temporário.
Peguei o telefone e liguei novamente pro Ícaro. Chamava, chamava e nada. Depois de muita insistência minha, a Nina atendeu o telefone.
– Alô? Ícaro?
– Théo...? Aqui é a Nina!
– Oi, Nina. – falei meio sem jeito.
– Como é que você tá, Théo? Fiquei sabendo do que aconteceu...
– Eu tô me recuperando, Nina. Ainda sinto algumas dores, mas nada demais.
– Me sinto tão envergonhada falando com você, Théo... Você nos ajudou! Por que ele fez isso com você? Vocês são tão amigos...
– É complicado, Nina. Acho melhor você nem saber o que se passou! Eu só quero que você me diga onde tá o Ícaro. Ele tá aí com você?
– Puxa, Théo, isso é meio que complicado de te dizer, mas o Ícaro não tá mais morando comigo. Depois que eu soube o que ele fez, expulsei-o de casa e bati nele. Bati, bati mesmo. Eu não sei dele, não quero saber e ficaria feliz se você não o procurasse.
– Nossa! Você não sabe nem onde ele tá morando? – mandei na lata.
– Não! Não procura o Ícaro mais não, Théo. Ele não merece o meu amor e a sua amizade.
– Não posso deixar um amigo assim, Nina. Ele nem conhece o Rio direito, e se ele tiver passando necessidade, ou perdido?
– Ele sabe se virar, Théo.
– Você me disse essas coisas e eu fiquei preocupado, agora. O que ele fez foi errado sim, mas eu não posso deixá-lo em necessidades.
– Deus te abençoe muito, Théo. Nunca conheci uma pessoa de tão bom coração como você. Mesmo depois de ele ter te batido, você ainda quer ajudá-lo... Não sei se te parabenizo por isso, mas não posso te negar meus parabéns por ter aberto os meus olhos. Me separei daquele cara por seus argumentos. Não tiro os seus méritos!
– É que eu gosto de ajudar as pessoas. Sou bobo mesmo, porque eu não aprendo de jeito algum. Vou ajudar o Ícaro mesmo, Nina. Vou tentar ligar no celular dele.
– Tudo bem, Théo. Que Deus nunca tire isso de você.
E ela desligou o telefone. Tinha gelado. Não conseguia imaginar no Ícaro perdido por aí. Aquela tarde foi o maior perrengue. Liguei tanto no celular do Ícaro, mas ele não atendeu. Passei a tarde inteira pensando nele. Não imaginava cenas dolorosas pra ele. Sim, eu era besta por isso, mas era dele que eu “gostava”, não podia desistir disso. Afinal, o Ícaro tinha me batido por eu ser gay, mas ainda não tinha chegado a hora do acerto de contas. Desde o dia que ele tinha me batido, eu não tinha o visto ainda, e estava contando as horas para que chegasse logo essa hora. Como já falei, eu queria ver o que meu instinto ia fazer.
Meus pensamentos foram ficando embaraçados e eles se alternavam entre o Dan e o Ícaro. Por mais que eu tentasse, eu não conseguia parar. Era mais forte do que eu.
Tinha chegado a noite e eu me sentia incapaz, pois eu sabia que meu amigo Ícaro estava por aí e eu sem saber dele. Algo confortava o meu coração dizendo que ele ia aparecer, e ele apareceu. Por volta das 22h, estava na cozinha e escutei alguém batendo na porta. Corri, abri e vi que era ele. O Ícaro estava podre de bêbado.
Meu coração tinha começado a palpitar, meus pulsos vibraram...