PARTE 2
---
“Já vi que os dois se darão bem. Leandro, esse é o...”, começou falando Alexia ao nos ver abraçados, mas sendo interrompida pelo amigo: “... famoso Eduardo!”. Era óbvio que ela já havia mencionado meu nome para ele, mas escutá-lo falando foi estranhamento bom. Consegui dizer, tentando evitar ainda mais o rubor no rosto:
- Somente Edu, por favor. “Eduardo” é muito longo e me faz lembrar de quando minha mãe grita comigo, puta da vida.
Rimos. Logo após o Leandro cumprimentar Fernando (“Ele é o Edu, então irei te chamar de Nando!”) e Vanessa, todos nós calçamos os sapatos de boliche, pedimos fritas e anéis de cebola empanados para beliscar e os meninos tentaram convencer as garotas a jogar sem as canaletas levantadas. “Ter essa colher de chá faz o jogo perder completamente a graça!”, argumentou Fernando. “Mas, sem a gradinha, eu vou ficar mais preocupada em não deixar a bola cair no buraco do que em acertar os pinos!”, exclamou Alexia. Foi quando Vanessa deu um sorrisinho maroto, colocou os braços sobre os ombros da colega e soltou:
- Bola... Buraco... Freud explica, amiga! Era melhor ter ido MESMO ao motel, ao invés de jogar boliche! Garanto que ninguém reclamaria das regras lá...
Gargalhadas eclodiram. A Vanessa falava mais putaria do que todo o time de futebol do colégio reunido no vestiário. Piadinhas a parte, as meninas venceram, claro. As canaletas foram erguidas e a quantidade de strikes foi bem maior do que deveria.
Após uma jogada particularmente ruim em que derrubei só dois pinos, me recostei ao lado de Alexia em um dos bancos laterais, o que ficava à direita da pista. Em nossa frente, nos assentos esquerdos, estava Leandro abrindo uma long neck com a manga do casaco jeans. Alexia deitou a cabeça no meu ombro, pegou minha mão direita e começou a brincar de tirar e colocar o anel de compromisso do meu dedo. Leandro viu a cena enquanto tomava um gole de sua cerveja, sorriu e disse:
- Faz quanto tempo que vocês formam esse casal de capa de revista?
Alexia franziu as sobrancelhas para o ex-colega de sala e entortou a boca em um semi-sorriso, como se estivesse na dúvida quanto à ironia contida na pergunta. Ele reparou com divertimento e logo completou:
- Tô falando sério, Alê! Não é por não me prender a ninguém que vou deixar de apreciar os casais felizes.
- Hummm... Então quer dizer que você reconhece uma felicidade que só os casais experimentam... – disse ela, provocativa, jogando a perna por cima do meu joelho e acariciando meus cabelos de modo teatral. Rimos e, após o que pareceu ser um lapso de constrangimento no rosto de Leandro, ele ergueu sua cerveja no alto e falou “um brinde aos casais felizes”. Como ocorreu um silêncio curto, mas algo desconfortável, preenchi o momento com a resposta à pergunta:
- Três meses, só – disse, tentando manter a voz descontraída. – mas nos conhecemos há mais tempo. Desde que ela se mudou do seu colégio para o meu, no semestre passado. Terminamos o ensino médio em dezembro, mas ficamos de recuperação em português. A prova é no final desse mês. Acho que a necessidade de estudar pra passar nos uniu... – e dei um beijo nas costas da mão dela entrelaçada na minha, enquanto exibia o meu melhor sorriso.
- Tsc, tsc, Alexia... Eu sabia que isso aconteceria quando você perdesse as minhas colas... – brincou Leandro.
- Ha-ha-ha, engraçadinho. A única coisa que tenho que perder é a vergonha na cara pra estudar mais. Ainda bem que certo moço lindo está me ajudando, agora que larguei essa vida de colas. – ela disse, enquanto dava uma beliscadinha carinhosa na minha perna.
Nesse momento, Fernando comemorava um strike agitando os braços no ar enquanto Vanessa molhava uma cebola no molho de ketchup. O televisor da pista indicava que Leandro era o próximo a jogar. Levantou-se, repousou a garrafa de cerveja na mesa dos petiscos, piscou o olho para nós e disse “o dever me chama!”, seguindo para a pista após escolher uma bola que encaixou bem em sua mão. Fiquei um tempo sozinho com a Alexia, alternando beijos com roçadas de lábios mais delicadas.
Após uns instantes, não mais me aguentando de curiosidade, abri a boca para perguntar a ela o que estava em minha cabeça desde que vi o sorriso do Leandro:
- Meu bem, e esse lance do Leandro solteiro?
- O que tem?
- Hum... Quer dizer... Foi um trauma, algo assim? Alguma ex-namorada o traiu ou algo do tipo? – eu tentava deixar a voz a mais desinteressada e casual possível.
Ela comprimiu o rosto contra meu pescoço, abafando um risinho. Olhando para frente e verificando que Fernando e Vanessa estavam na mesma intimidade de casal no banco do lado oposto, alheios ao mundo, ergueu a boca na altura do meu ouvido e sussurrou:
- Ele é gay. Mas só eu sei, é segredo!
Mal pude digerir essa bomba, a palavra “gay” ecoando na cabeça, quando escutei um grito de “Yes!” vindo da pista. O Leandro havia feito um strike e agora se dirigia pro nosso banco. Era a minha vez de jogar, o nome piscando no televisor. Parando na minha frente e erguendo uma bola pra mim, ele disse, com aquele sorriso diabolicamente perfeito:
- Edu, é sua vez! Você usa a mesma bola que eu, né?
- Sim, eu... eu... uso.
(FIM DA PARTE 2)