Cap.9
TRILHA SONORA : AMSTERDAM - COLDPLAY
Durante alguns segundos ele ficou calado, me apertando ainda mais, enquanto eu massageava seus cabelos. Estar no chão, abraçado ao seu corpo, me fez ficar nervoso em segundos.
- O que houve ? - perguntei, o olhando - Porquê está assim ?
- Existe uma história de mim... Que você não sabe... Uma história dolorosa - falou, chorando novamente - que de tão dolorosa me faz não querer pensar nela. Porém... Sempre que chega está data não tem como esquecer. O motivo por eu ser tão fechado e tão... Estranho ! - disse, chorando mais.
- Pode me contar quando se sentir tranquilo - disse, acariciando o seu rosto com a mão.
- Você já percebeu que não existem retratos dos meus pais nesta casa ? Que ela é sempre triste e caida ? Que eu não me importo muito com ela ?
- Sim, eu já reparei...
- É porquê uma desgraça... Enorme, abateu a vida dos meus pais, da minha família... E a minha vida - falou... Me soltando e levantando-se. Sentei-me no sofá, para que em seguida ele se posicionasse entre as minhas pernas e fosse massageado novamente por mim - eu era um garoto feliz... Brincava, saia correndo, jogava por aí como todos os outros garotos da minha idade. Fui crescendo e... Uma beleza descomunal foi nascendo em mim, por pura genética. Eu mantinha a minha inocência de criança, achava que nada nunca iria acontecer comigo, que eu ficaria junto da minha família para sempre. Porém, isso mudou quando meus avós morreram num Naufrágio próximo a Ilha de Saipan.
- Nossa, meus pêsames.
- De repente meu pai começou a ficar transtornado. Saia para beber, voltava tarde para casa. Começou a faltar no seu trabalho dentro do exército. Aos poucos começou a beber e beber, sempre cada vez mais. Aos poucos acabou sendo afastado do exército. Certa noite, chegava do bar bêbado. Invadiu o meu quarto, aonde eu fazia um trabalho de aula sozinho. Parou, olhou-me da porta.
"- Olhe só para você meu filho ! Como está se formando. Está maior. Está se tornando homem !"
- Aos poucos o que era apenas um elogio de pai e filho se transformou no meu pior pesadelo. Ele passou a me aliciar e... - nessa hora ele fechou os olhos e mesmo assim a lágrima caia dos seus olhos. O puxei para mais perto e deixei que ele colocasse a cabeça no meu peito e ficasse "brincando" com o botão da minha roupa - ele me tirou a virgindade a força. Sim, ele me estuprou. Nem os meus gritos pedindo para que ele parasse foram suficientes para que ele me largasse, parasse o que fazia. Ele tirou a minha honra, a minha nudez, acabou com a minha inocência, trouxe o medo para dentro da minha mente. Aquilo passou a se repetir. Sempre que ele bebia, me forçava a ir pra cama com ele. Ele sempre dizia que eu era o garoto mais bonito que havia visto, por isso não conseguia se segurar. Eu não tinha forças para reclamar, pois ele fazia ameaças. E além disso eu sentia vergonha... Vergonha de ser um garoto estuprado...
- Eu não sei nem o que dizer.
- Só... Só me abraça... A parte mais difícil eu nem te contei ainda - falou, se contraindo ainda mais - era um dia como esse. Um aniversário... Eu já não conseguia mais comemora-lo, mesmo com toda a alegria que a minha mãe demonstrava quando chegou essa data. Ele não estava em casa, mais uma noite havia dormido na rua. Eu estava dentro do meu quarto, dormindo quando de repente ouvi uns gritos da cozinha.
"- YUKI-KUN, FOGE, SEU PAI TÁ COM UMA FACA, ELE ESTÁ LOUCO !"
- Eu podia ouvir minha mãe agonizar. Sabe o que é você perder a sua mãe sem poder fazer nada ? Ele a esfaqueou, sem dó e nem piedade. E eu não sei o porquê. Pouco tempo depois eu Achei um Boletim de Ocorrência na bolsa dela, em que ela denunciava agressões da parte dele. Passei a pensar que por isso ele a matou e... Destruiu a minha vida ! - falou, voltando a chorar.
- Eu sinto muito ! - limpou as lágrimas, me olhou - quando eu ouvi passos pela escada, me alertei. Tranquei a porta, botei um móvel e tentei sair pela janela. Era alto, mas era a minha única alternativa. De lá me joguei. Por alguma ajuda divina, cai sobre uma grama mal aparada que amorteceu um pouco a queda. Só deu tempo de eu correr e... Ouvir os gritos dele - aquela história era aterrorizante. Ouvir aquilo me dava arrepios. Eu não acreditei que uma pessoa tão angelical como ele havia passado por algo tão ruim - ele se matou e a matou. Deu 47 facadas nela. A deixou irreconhecível. No caso dele, ele cortou a veia jugular. Morreu de hemorragia. Eu não botei mais os pés naquela casa. Os delegados investigaram, descobriram uma quantidade altíssima de álcool no sangue dele. Provavelmente ele não tinha nem noção do que estava fazendo. Mas isso não importa, ele destruiu a família que eu tinha. Vendi a casa e então comprei esta aqui. Como ele era militar, eu tenho uma pensão vitalícia, que me mantém muito bem.
- Mas... Mas e depois ? Como os seus familiares te deixaram morar sozinho.
- Eu não tenho mais família Gustavo-San. O que sobrou dela mora em Nagasaki e não está nem aí para mim. Nem vieram no enterro de minha mãe. De repente eu me vi sem família, sem ninguém. Tive que aprender a me virar sozinho. Aprendi a cozinhar, mas nunca Sai bom. Aprendi a lavar roupa, mas de vez em quando as mancho. Já pensei em me suicidar muitas vezes. Mas... Sempre alguma força estranha me faz erguer a cabeça e continuar a vida. Esse fato me fez criar um trauma. Passei a ter medo das pessoas. De qualquer pessoa. Por isso me isolei de todos. Por isso não me sentava ao lado de ninguém. Por isso sou tão solitário. Eu não... Não consigo fazer uma amizade com alguém. Eu não consigo ter pessoas por perto. Eu morro de medo que aconteça de novo. Para mim, parece que toda pessoa é um estuprador que quer me matar... Por isso eu não como direito, já que não tenho mais ninguém que queira me ver gordo. Nem durmo direito, já que a noite eu tenho pesadelos. Não tenho amigos, pois não consigo me aproximar de ninguém. Aquele fatídico dia de aniversário arruinou a minha vida... É por isso que eu não tenho fotos, É por isso que eu não tenho perfil em rede social, é por isso que não me incomodo com a decoração da casa. Eu não tenho mais porquê fazer isso. Eu não tenho mais porquê viver, Gustavo-San.
- Não diga isso ! Lógico que você tem porquê viver. Tem que Sentir as belezas da vida. Tem que se formar. Tem que encontrar a sua alma gêmea e formar uma nova família, que agora vai ser comandada por você. Abreviar a sua vida seria tirar todas as belezas que você usufruiria vivo... - ele olhou em meus olhos.
- Eu só não entendo uma coisa.
- O que ?
- Com você É diferente... Eu... Eu não sinto nada de anormal por Você. Nem medo, nem nojo, nem repulsa. Você foi a única pessoa que me mostrou gentileza em toda a vida. Talvez por isso, você tenha superado a minha barreira pessoal - falou, fazendo eu sorrir. Ele saiu das minhas pernas. O olhei de frente.
- Você vai parar de chorar !
- Eu não quero parar de chorar ! - me levantei, fui até a mesa aonde havia deixado o bolo - EI ? Vai me deixar aqui sozinho ? - coloquei a vela, acendi o fogo e então a trouxe novamente para a Sala.
- Happy Birthday to you, Happy Birthday to You, Happy Birthday to You... Happy Birthday to You... - me pus de joelhos a sua frente e coloquei o bolo em seu colo - eu sei que foi duro e traumatizante tudo o que você passou. E é perfeitamente entendível as suas reações de defesa. Mas... Aniversário é uma coisa que deve sempre ser comemorada. Com as pessoas que você mais considera. Espero que eu seja uma delas - ele riu.
- Você é...
- Apaga as velas - e então ele soprou e sorriu.
- Eu farei você ficar alegre hoje e... Esquecer essa história hoje. Eu prometo que vou fazer você aproveitar o seu aniversário !
Continua
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