Até Você Ser Meu

Um conto erótico de Jader Scrind
Categoria: Homossexual
Contém 2234 palavras
Data: 28/07/2015 02:04:35
Assuntos: Gay, Homossexual

Ele pensava música. Eu pensava letras. A gente se deu bem logo de cara. Bem, não assim logo de cara, no começo foi ele que me viu no meio de toda aquela gente, foi ele que me achou interessante ou pelo menos mais interessante que todos os outros que iam e voltavam pelos cômodos daquela casa no meio da primeira festa do ano da faculdade. Mas não que eu tivesse que ser convencido de que ele era um cara diferente, acontece que eu nao podia olhar assim para outros rapazes, eu era cheio de verdades que me esforcei pra acreditar, cheio de vontade de agradar aos outros. Eu tinha namorada, pra ser mais claro. Ele sabia, ele nos via, mas de alguma forma ele descobriu um jeito de me ver por trás do personagem que eu atuava todos os dias. Ele soube o que ninguém mais sabia, nem meus pais nem meus amigos nem talvez eu mesmo. E decidiu que valia a pena se aproximar de mim mesmo assim. E ele veio. E ele encontrou um momento em que Marina saiu de perto de mim para rir com suas amigas das roupas espalhafatosas das suas inimigas me deixando a sós, se aproximava e quando estava a poucos passos eu o vi, antes de chegar, e sorri para ele, porque eu o reconheci, eu ja tinha falado com ele uma vez, anos antes, e tenho certeza que ele lembrava disso.

Apertou minha mão.

- E aí cara, curtindo a festa? - falou, perto do meu ouvido porque a música enchia mais aquele lugar que todas as dezenas de pessoas. Seu hálito: cerveja e Trident melancia. Seu cheiro: perfume, seu cheiro natural, shampoo suave.

- Tô sim, só não curto muito sertanejo, mas não odeio também.

- Que tipo de música tu curte? Se fosse pra pedir pro dono da festa mudar, o que seria?

- Red hot, talvez.

- Eles são legais mesmo...

Ele bebeu um pouco de cerveja, foi minha deixa.

- Escuta, eu já não te conheço?

Ele abriu um sorriso.

- Tu lembra?

- Lembro sim, cara. Willian, seu nome, certo?

- Isso aí. E o seu?

- Tiago.

Eu nunca tinha dito meu nome para ele, mas o dele eu ouvi algumas vezes, lá atras, e nunca esqueci. Quando estava no primeiro ano do Ensino Médio fazia umas aulas extras no turno da tarde do meu colégio junto com outros colegas que estudavam na mesma sala que eu durante a manhã, alguns cursos de língua estrangeira, informática, coisas assim. Mas ele estudava a tarde suas aulas normais, era dois anos mais novo, ou da minha idade e dois atrasado nos estudos, não sei. O que eu sei é que estávamos caminhando pelos corredores, uma amiga minha e eu, a caminho dos bebedouros, mas ela parou e pediu que eu a seguisse, foi até o lado de fora depois de ver alguma coisa que chamou sua atenção. Não demorou muito tempo e eu percebi que não era alguma coisa: era alguém. Era ele.

Os alunos estavam tendo educação física, jogando futsal. Ele no time dos sem camisa, para alegria das suas coleguinhas carentes e desesperadas que se enfileiravam sentadas nos cantos da quadra, e da minha amiga carente e desesperada que o olhava de longe e murmurou alto o suficiente só para eu ouvir "que gatinho". E mesmo eu, que nao tinha nada de carente nem de desesperado, muito menos de gay, lembro de ter por um relance ouvido dentro da minha própria cabeça "ele é mesmo".

E ficaria por isso, eu não daria importância a nada disso, ela também veria outro rapaz que achasse gatinho na esquina do colégio e esqueceria esse, seguindo o ciclo dos seus hormônios loucos para faze-la abrir as pernas. Isso é o que eu pensava, mas por pensar de mais morreu o Sócrates, então é claro que nada disso aconteceu. Ela no bebedouro só falava dele, do rosto dele, do jeito dele, do corpo dele, do sorriso dele.

- E quando foi que você viu ele sorrindo, garota?

- Ele tem um sorriso lindo, não precisa ver pra saber.

Eu não podia falar nada, tem coisas que realmente não precisa ver pra saber. Mas eu nao queria falar sobre isso, sobre um cara, não queria levantar duvidas da minha sexualidade, nao queria que sequer passasse pela cabeça de alguém qualquer coisa sobre isso, tanto que não passava nem pela minha.

So que ela não me deixava esquecer, e fez o pedido que eu ja estava imaginando que ela faria, duas palavrinhas, bem sem sentido ditas assim, a esmo, mas que na hora eu e ela sabíamos muito bem no que ia dar: faz esquema?

Por alguma razão la dentro de mim, eu não gostei do pedido, mas não tinha lógica nenhuma, eramos eu e ela só amigos mesmo, nao via problema com nenhum dos outros caras com quem ela ja ficou, e muitos eu mesmo havia, a pedido dela, chamado para uma conversa com a frase inicial já dizendo tudo "Minha amiga ta afim de você", mas... Mas.... É, realmente nao pensei em nada muito bom para dizer e só concordei com um gesto de cabeça.

- Então vai lá!

- O que? Agora?

- Claro filho, enquanto eu ainda tô molhada.

- Para a minha própria saúde mental, vou fingir que você se referia a água do bebedouro - eu disse enquanto voltava lá para fora, lá para a quadra. Fiquei ao lado da trave, um pouco atras da linha de jogo esperando que acabasse sua partida para chama-lo. Ele se aproximava com a bola no pé a toda velocidade e fez um gol que estufou a rede. Mas eu nem me mexi. Nao tinha meso de bola, gostava de jogar tambem, gostava de tudo que rapazes da minha idade gostavam, inclusive garotas, e não é que eu ficasse com elas para tentar esconder alguma dos outros, nao, elas me atraiam, elas me excitavam, mas nao da mesma maneira que... Bem, estou divagando, e divagando sobre um assunto que sempre fiz questão de não pensar.

Enquanto ele comemorava o gol com seu time dos sem camisas, se abraçando e pulando, eu fiz sinal com a mao de que queria falar com ele depois que o jogo acabasse, ele sorriu e concordou com a cabeça. E o jogo nao demorou muito, uns dois gols a mais, mas nenhum deles feito por ele. Entao acabou e ele pegou uma toalha de rosto na sua mochila, pos uma das alças da mesma mochila pesada e grande no ombro mesmo sem camisa e veio falar comigo.

- E ae cara?

- E ae. Ei, eu queria falar contigo sobre uma coisa. - falávamos enquanto íamos para fora da quadra, de volta as dependências do colégio. - Não sei se voce me viu aquela hora com uma garota, minha amiga ela.

-Sim sim, vi sim.

- Então, ela ficou bem interessada em voce e... E queria saber se voce estaria interessado... entendeu ja? -por que eu estava tão constrangido em falar aquelas coisas? Barrar estranhos e atrai-los para a minha amiga predadora sexual nao era novidade pra mim, mas mesmo assim... Enfim. Felizmente ele disse, com um meio sorriso malandro, que já tinha entendido.

Mas custou a dar uma resposta, continuou andando em completo silencio agora, e nem estava com uma expressão de prestativo, e eu indo atrás e esperando que dissesse logo se topasse ou não. Chegou ao bebedouro, encheu a mão em concha de agua gelada e a jogou sobre o dorso pra espantar o suor. Eu olhava. Ele me olhava mas nao julgava o meu olhar. A agua deslizava, sabe quando o cara é novinho (nao de idade, mas de fisionomia) e descobre a academia do bairro e fica todo definido mas nao perde o rosto que nem precisa se barbear todos os dias ainda? Pois era ele. E seu rosto era claro porem um pouco bronzeado, o cabelo castanho num escuro quase preto, os olhos pequenos mas nao do tipo oriental, pequenos do tipo galã de filmes antigos. Se enxugou com a toalha, pos a camisa, e só entao, quando até eu havia me esquecido de que lhe tinha feito uma pergunta, ele respondeu:

- Ela é bonita, né? Não cheguei a ver direito. É pode ser, hoje depois das minhas aulas diz pra ela que a gente se encontra no portão.

- Ok - falei e foi a resposta mais curta que consegui pensar. Não queria gaguejar. Ele disse que tinha que ir, voltar pra sala que a próxima aula ia começar, e eu não saí dali antes de ter certeza que ele sumiu. Não queria cambalear. Não queria pensar nessas coisas.

Minha amiga apareceu saltitando perguntando e ae, e ae, o que ele disse, o que ele disse?. Eu respondi: Ele disse que quer te encher de filhinhos.

- Fala sério, Tiago!

- Ele topou, disse que te encontra no portão depois da aula.

Nós voltamos para a nossa sala, ja nao falávamos muita coisa. Eu inventei algum motivo para nao poder chegar tarde em casa e quando a aula acabou fui embora, deixando-a la no portão, e quando estava quase virando a esquina o vi chegando e a levando para atrás do colégio.

Não pensar nessas coisas. Não esquecer quem voce é. Pus os fones e me deixei embarcar numa viagem para fora daqueles pensamentos estranhos.

Dias seguintes, ela comentou por cima que ficou com ele, beijinhos, amassos, como era normal para a nossa idade, nao entrou muito em detalhes porque nao havia detalhe para se entrar. Nao se viram mais, nao voltaram a ficar. Mas eu e ele nos cumprimentávamos as vezes quando nos víamos a tarde pelo colégio, só um movimento de cabeça. Nao tínhamos muito assunto porque eu nao queria falar sobre aquela vez em que ele ficou com minha amiga, e talvez ele tambem nao. As vezes o via com algumas garotas, mas nao me aproximava demais e ele nao me via. Nas festas juninas do colégio apertávamos as mãos e trocávamos palavras sobre os horarios do onibus, o frio a chuva. Mas mesmo com essa aparente amizade sem força, nunca esqueci dele, nunca deixei de cumprimenta-lo, nem ele a mim. Mas acabou o Ensino médio, eu arranjei emprego antes de entrar na faculdade, dois anos sem estudo, nos quais o vi apenas uma vez, quando passou na frente do lugar onde eu trabalhava, ele agora no ultimo ano do ensino médio, estudando em outro colégio, namorando ou pegando uma garota loira e bonitinha, sem camisa no abrasador sol das onze e meia, a mochila nas costas. Ele me viu também entre um riso e outro que dava com ela, e parou, e ficou serio, e me cumprimentou, com a cabeça, com a cabeça retribui. E eles se foram.

Ê isso. Era assim que eu conhecia Wilian, pensei ate que não o veria mais, mas la estava ele naquela festa, um pouquinho bêbado o que provavelmente era o motivo de estarmos conversando outra vez depois de tantos e tantos acenos de cabeça.

- Ei, eu já volto - ele falou, quando Marina se aproximava. Mas eu sabia que ele nao voltaria para perto, pelo menos não naquela noite. Só que se considerar que fazia anos desde aquela vez que eu falei com ele perto do bebedouro, então ja era um avanço e tanto.

E mais avanço ainda foi quando a noite avançou um pouco mais e a Marina sumiu outra vez e eu andei da cozinha para a sala de estar com um copo plástico na mão quando, para minha surpresa, a musica é interrompida, para reclamação de todos os montes de estudantes que estavam curtindo. Eu ouvi uma voz rebater as vaias com um divertido "Calem a boca, só vou trocar de artista" mas no monte de gente nao conseguia ver quem era. E nem precisei. A musica que tocou foi Otherside. Red Hot. Eu olhava para se a musica viesse das próprias paredes da casa e não do aparelho de som. Era dele aquela casa, isso explicava, só podia. Depois eu o vi no meio da multidão, distante, sorrindo para mim como quem pergunta se eu estava gostando mais da festa agora. Eu estava. Ele sabia que eu estava. E fez um gesto com a mão, exatamente o mesmo gesto que eu fizera para ele naquela quadra lá atrás, há muito tempo. Queria falar comigo depois. Eu concordei. Meio que tremendo, mas dessa vez eu nao queria não pensar, eu não queria esquecer. Dessa vez eu queria ir até o fim. Bebi toda a cerveja num gole só, ainda olhando para ele, e, sem nem ligar que ele estivesse me olhando tambem, ajeitei o volume na minha calçaContinua...

E ae pessoal, tudo bem com vocês? Esse conto foi escrito em tempo recorde, vocês podem ver que semana passada eu ja tinha postado um aqui. E sei que quem costuma acompanhar meus contos, vai estranhar esse aqui, que é bem bem diferente. Mas na verdade essa historia eu sempre quis contar, mas sempre fui adiando por outros contos, só que agora meu pc deu perda total então nao vai dar pra escrever mais longas por um tempo, entao decidi que era hora de vir com essa historia de capítulos curtos e trazer aqui pro site. Estou escrevendo pelo celular, entao perdoem os possíveis erros, eu tentei consertar todos, mas posso ter deixado passar alguns. E comentem se estão gostando e se querem que continue essas coisas, que ajuda muito na hora de escrever gente. Até a próxima!


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Comentários

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Ótimo capítulo e a escrita perfeita.

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Colírio pros meus olhos esse português <3

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Entendi sim, cara. Se a linha do seu conto sera assim, trará uma boa mensagem. Vou ler, claro :)

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Oi Irish, eu nao apaguei seu comentario nao, nunca faria isso. E tambem entendo o que voce quer dizer sabe, mas é que é meio importante pra mim falar um pouco sobre a gente nascer e crescer pensando que ser gay é errado sabe, aí ter que esconder isso pra nao sofrer e até esconder de si mesmo sabe, de tanto insistir na memtira alguma hora ela se mistura com a verdade, eu nao quis ser clichê nem nada, mas isso eu vinha abordando em contos anteriores já, como Cidade do ceu amarelo, Marcelo e eu e o Historia da noite. É um pouco como eu vejo as coisas, não quer dizer que é sempre assim, eu sei, tem muitos caras que se assumem muito novos e tal. Mas mesmo assim, agradeço a sua observação, espero que acompanhe a historia mesmo assim...

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Ué, fiz um comentario em outro aparelho aqui e me pareceu ter caido... Nao creio que vc apagou... Pois repito que o conto esta otimo, vc é talentoso, mas porque os personagens nao poderiam ser gays logo de cara? Eles tem que estar, necessariamente, envolvidos com mulheres? Sim, o conto é seu, faça como quiser, mas na minha opiniao isso é tao recorrente por aqui... Enfim, nao leve a mal minha observaçao.

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Gostei, parece que sao heteros que são ou eram enrustidos, continua..

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Gostei, claro. Tomara que se peguem logo.

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