Cheguei à casa da minha cunhada e ela não estava, acho que estava na casa de Wanderlândia. Aproveitei a oportunidade para rapidamente ligar o computador e colocar meu plano em prática, não havia garantia nenhuma de que fosse funcionar. Mas como disse um pensador que não lembro o nome: Informação privilegiada é arma. Nesse momento, Fabíola, filha do Beto e da Rejane entrou em casa. Ela pediu um doce que tava na geladeira e depois saiu, foi brincar. Lá em cima, no quarto, minha mãe estava dormindo. A Fabíola era realmente uma criança muito linda e meiga e especial..... Era uma pena que tivesse uma mãe tão..... Rejane. Mas fazer o que se as cobras também procriam.
No computador, fui diretinho pra internet baixar um programa. A internet era lenta, mas o programa era leve e isso ajudou. Sempre fui metido a nerd e pra alguma coisa ia ter que servir. Eu mexia muito nos pc’s da escola e agora estava colocando em prática alguns dos conhecimentos que havia adquirido. Claro, a consciência pesada não me abandonava não conseguia deixar de achar que estava invadindo a privacidade das pessoas com aquilo. Mas era necessário. Instalei no computador um programa chamado Eat Cam. Basicamente ele iria fazer a web can e o microfone funcionar sem parar desde que o computador estivesse ligado. Ele também iria gravar tudo o que as pessoas estivessem acessando no PC e salvar em arquivo de vídeo numa pasta que só eu sabia qual. Claro, que uma pessoa bem ensinada saberia do meu plano, mas meu irmão e minha cunhada eram leigos, se tratando de PC. Nunca iriam descobrir!!! Terminei de testar tudo e tava tudo em ponto de bala. Ok! Mexi um pouco mais no Orkut, respondi alguns scraps, escrevi uns depoimentos e aceitei umas novas solicitações de amizade. Incluindo o Nylo e o Jean. Não pude conter meu coração que palpitou involuntariamente quando pensei.... ‘Poxa, o Jean me ADD. Não resisti e fui correndo ver as fotos dele, Puxxxaaaaaaaa.. Tinha algumas fotos sem camisa e meus olhos só diziam: ‘Puxa-que-músculos’. Seu abdômen era torneado e completamente delineado. Seus braços eram fortes e havia uma enorme veia que se perdia no seu antebraço. Super sexy! Tinha algumas fotos dele com uns caras, que provavelmente eram amigos... Senti uma pontada de inveja quando vi as fotos. Algumas ele estava numa enorme piscina, com seus amigos. Outras ele tava em um banco de uma aparente praça, em outras ele tava num barzinho, acho e em outras estava em frente a um luxuoso Resort, deduzi. E em todas ele estava acompanhado de tantas pessoas... E parecia tão sorridente.... Enquanto eu, era um mundo completamente diferente... Mergulhado, desculpe a expressão, na merda. Não tinha grandes amigos. Ninguém que se importasse de verdade comigo. Exceto meus irmãos e minha mãe.
Não sei se vocês já sentiram isso, caro leitores. De olhar a vida de alguém, pelo perfil de uma rede social e pensar.... Nossa como a vida de fulano é boa e é legal (Contudo, não entendam errado... Quando digo de vida, não me refiro a posição econômica, mas como um todo)... Eu daria muita coisa que eu tenho pra ser como ele ou estar inserido num contexto como esse. Mas, conforme a vida tratou de me ensinar, a vida que as pessoas pintam e exibem nas redes sociais costuma ser bem diferente da vida real, de fato. Porque normalmente se tira foto pra se exibir no Orkut (finado) de seus momentos felizes... Mas não se tira foto pra se exibir os momentos tristes, as lágrimas, os momentos de monotonia, de solidão, de desprazer e descontentamento.
A porta se abriu e eu fechei correndo a foto que estava exposta na tela. Uma foto do Jean sem camisa, muito sexy. O que foi uma burrice da minha parte, porque minha ação denunciou que boa coisa eu não estava aprontando... Automaticamente, o olhar bem treinado de águia da minha prima, Wanderlândia foi direcionado pra minha página do Orkut. O que você está fazendo? Quem é esse da foto que tu tirou na carreira quando me viu... Ela se aproximou e conseguiu ver o perfil do Jean antes que eu conseguisse sair da minha conta.
- Idiota!!!! Pare de se meter na minha vida... Falei e saí correndo pro quarto da mamãe. Eu sabia muito bem que pedir isso pra minha prima era como pedir ao frio e a chuva de SP pra ir pro nordeste e o calor e a estiagem do nordeste pra vir passar uma temporada em SP. Cheguei ao quarto e minha mãe tava dormindo. Fiquei lá a observando tão serena... Depois peguei uma roupa básica, me troquei e sai.
Desci pro andar debaixo e Rejane já tinha chegado. Wanderlândia e ela estavam conversando e pararam abruptamente quando me viram o que denunciava o motivo, óbvio, da conversa. Eu!
Duas horas depois estava eu no hospital de câncer infantil. Conversando e brincando com as crianças. Havia uma menina chamada Clarita, que me cativava à alma... Sua história e sua experiência de vida me estapeavam a face sempre que eu pensava em ter pena de mim mesmo. Com dois anos de idade, ela perdeu os pais em um acidente de carro. Única sobrevivente de um acidente terrível que ceifaram a vida de seus guardiões e sem nenhum parente vivo de que se tenha notícia, Clarita foi enviada a um orfanato onde permaneceu sob os cuidados do governo até os quatro anos de idade, quando uma nova etapa do seu martírio surgia. Ela foi diagnosticada com leucemia. Foi então, enviada para o atual hospital e sem ninguém a garota permanece aos cuidados dos médicos e enfermeiras, pois a necessita de uma série de aparelhagem constante e vive com a vida por um fio.
Seu sorriso, no entanto, desarma qualquer coração. A tristeza raramente alcança seus olhos e ela nutre a esperança constante de que vai se curar do câncer, vai voltar ao orfanato, vai ser adotada e vai sentir o calor e o aconchego de um lar... Eu amo Clarita, de verdade. É uma criança simplesmente cativante. Tão meiga e tão bonita... Sei que deve existir algo mais por ela... Pra ela.
Fiquei até a tardezinha no hospital brincando com as crianças e a noite fui pra casa... O restante do final de semana ocorreu sem nenhuma grande casualidade, exceto que na noite de sábado acordei e era de madrugada com um alerta vibratório de uma mensagem automática da operadora. Alguém havia efetuado uma recarga de R$ 100,00 no meu número. Fiquei impressionado e matutando, tentava entender como isso foi acontecer até que chegou uma mensagem do Jean que dizia simplesmente: ‘A fim de suprir qualquer eventualidade e uma carinha piscando ;)’. Fui dormir com um sorriso no rosto.
Na segunda, já estava de volta à escola. Andando pelos corredores pensava que naquela semana finalmente saberia o que minha mãe tem. Até os pelinhos do meu...... Braço viviam cruzados na esperança de que não fosse nada sério. No corredor, encontrei o Nylo e a Anabel e fomos conversando amenidades até que tivemos que nos separar. Nylo e eu, fomos pro nosso apê e chegando lá Coysa (Gustavo) e Jean já estavam lá. Ignorei Coysa, como sempre e dei um sorriso discreto pro Jean. Ele não poupou discrição e me deu um sorriso de orelha a orelha. Tentei amenizar e sei que Coysa distraída do jeito que é, não notou. Mas quando olhei pro lado vi que Nylo observava atentamente nossas atitudes... E mais essa, pensei.
Quando ia pra primeira aula, o diretor pediu uma palavrinha rápida comigo. Deixei Nylo ir na frente e disse:
- Pois não?
- Ruy, você sabe que é bolsista e pra manter as bolsas de estudo, os bolsistas precisam adquirir uma média bimestral x não é?
- Sim, senhor, eu sei. Por quê?
- Bem... É que determinadas atividades extraclasse rendem pontos e isso poderia te ajudar bastante.
- É mesmo, que tipo de atividades, perguntei.
- Bem... Temos os times de futsal, vôlei, basquete, a equipe de natação, de teatro, o grupo de música, de xadrez e alguns outros. Se quiser dar uma conferida ou inscrever seu nome na lista que está lá no quadro de avisos no saguã, perto do pátio.
- Ahhh, vou dar uma olhada e ver em quê eu me encaixo, mas obrigado por me avisar.
- Não por isso meu filho, mas e como tá você junto com o Jean e o Guto? Tá se adaptando bem???
- Tá dando pra levar – Sorri.
- Que bom – Ele falou. – Agora deixa eu ir que tenho muita coisa pra fazer e acho que você tem aula né?
- É verdade... – Saí e fui andando mas ao virar no corredor me deparei com o Jean que me puxou pra um canto.
- Por que o diretor tava conversando com você? Ele te deu bronca por alguma coisa?
- Não... Ele só veio me falar umas coisas relativo a minha bolsa de estudos.
- Ahhh, mas nada de mau, espero?
- Não... Não... Mas escuta. Você é louco ou o que? O que te deu na cabeça pra colocar R$ 100,00 de créditos no meu celular?
- Por quê? Você queria mais? – Ele falou sonso.
- Idiota... Você não devia ter feito isso.
- Foi um presente... Nunca te ensinaram que não se deve recusar presentes?
Dei um empurrão de brincadeira no peito dele e ele deu aquele sorriso que me tirava o chão.... Mas o que diabos tá havendo comigo?
- Sobre aquela força que você me deu final de semana... Eu queria agradecer, de verdade. Você se mostrou um grande amigo naquela ocasião...
- Apesar de você não ter me contado o porquê de estar naquele estado – Ele me cortou.
- É. Apesar de eu não ter contado. Mas confiança não se exige, se conquista... Não pode pedir pra eu entregar pra você, tem que merecer. E não começamos exatamente com o pé direito né verdade...?
- Não que não possamos dar um jeito nisso... – Ele veio se aproximando de mim e já estávamos praticamente colados um no outro e pra ser sincero, eu tinha esquecido completamente que estava em um corredor movimento cheio de alunos passando pra cima e pra baixo. Os lapsos de sanidade eram comuns quando estava com ele e seus lábios já estavam a centímetros do meu. Fechei os olhos e mergulhei no estado de consciência onde nem meus melhores sonhos podiam chegar. Porque era completamente impossível algo tão bom e tão grande pudesse acontecer com um nada da vida como eu.