Lembro da vez que me contaram sobre uma crise que acontece aos dezoito anos. Cético, como só eu sei ser às vezes, duvidei que isso pudesse me ocorrer. Tinha planos sólidos para o futuro. Trabalharia com games, uma das minhas coisas favoritas nessa vida. Papai e mamãe me pilharam:
- Luan, meu filho, isso dá dinheiro mesmo? – Perguntou Vicente, descrente. – E quanto custa a faculdade?
- O filho da Claudinha minha amiga fez ciência da computação, está montando uma assistência técnica agora. – Patrícia colocou, como sempre buscando exemplos nas outras pessoas.
Engraçado ver os outros modelando suas ideias quando não acreditam nelas. Papai optava pelo mais barato, sua maior preocupação era o bolso. Por ele, qualquer faculdade de esquina cairia bem em mim, segundo ele “não é a instituição que faz o aluno, mas sim o próprio”. Mamãe não me via formado como designer de games, e sim ganhando dinheiro formatando os computadores da vizinhança. Achava algo digno de louvor uma pessoa entender como funciona a máquina, desmanchando-a, reparando ou auxiliando os mais velhos a encará-la.
O “X” da questão era: existiam poucas universidades na cidade oferecendo o curso dos meus sonhos, e, para estudar em qualquer uma delas, eu pagaria um rim por mês. Havia meios de conseguir bolsas para os demais cursos, no entanto esse ainda não agraciava os interessados de baixa-renda que viessem a se interessar em tornar-se designer de games.
E assim aconteceu: meu primeiro plano foi por água abaixo. Passei a responder “Ciência da Computação” quando questionavam minhas intenções de curso. E as pessoas respondiam com um sorriso: “Muito bem, nunca faltará trabalho pra você”. Assim, percebi que entendiam essa como uma ideia madura de minha parte. Na realidade eu perguntava a mim mesmo se eu queria me formar em alguma coisa...
Um pouco antes dos meus dezoito anos, no ano seguinte a minha formatura no Ensino Médio, vivenciei mais um sintoma da crise: questionar o que pra mim sempre foi uma verdade. Após fracassar no ENEM, não conseguir nenhuma bolsa de estudos, iniciei a trajetória de vestibulando em um cursinho, com Lucca, meu melhor amigo dos tempos de escola. A nova rotina não pesava: uma vez na semana, aos sábados, tirávamos o dia assistindo aulas. Agora eu não tinha contato rotineiro com meus amigos e Lucca fora o que restara.
- Lucca, como é ficar com um cara? – Perguntei, direta e inesperadamente, em um final de tarde, depois do cursinho. Era uma pergunta sem qualquer ligação com o assunto anterior, lançada em uma conversa corriqueira. Deveria parecer despretensiosa, ou, talvez, realmente fosse. Deveria ser. Uma curiosidade, pensei, isso nunca matou alguém. Não perderia minha masculinidade diante desse questionamento.
- Nossa, como isso veio parar na nossa conversa? – Questionou, no lugar de responder.
Arrependi-me de ter iniciado a conversa embaraçosa. Por que um heterossexual como eu se interessaria em saber como é beijar ou foder com um cara?
– Ah, é normal. Talvez a mesma coisa que ficar com mulheres, o que muda é a questão da atração... Se eu me sinto atraído por homens, logicamente transar com um será muito mais gostoso que com uma mulher.
A resposta de Lucca fora satisfatória, contudo outra dúvida gerada do além fez minhas lombrigas se retorcerem e eu desejei verbalizá-la.
- Como você descobriu que era gay?
- Ah, eu sempre tive atração por homens, mas fui ter consciência disso depois de ficar com um primo meu.
O clássico conto dos primos. Ao que parece, todo homossexual já passou por situação semelhante. E alguns caras, não necessariamente gays, iniciaram a vida sexual desta forma.
A verdade estava escondida por trás daquelas singelas perguntas... Havia uma semana que me masturbava frente ao computador assistindo vídeos de homens transando. Estranho hábito que adquiri após entrar em um site pornô gay, acessado através de um link dos meus habituais sites de mulheres na webcam, que me garantiam a bronha do dia. Recordo do título de um vídeo chamar minha atenção “Novinho hetero perdendo a virgindade com coroa maduro”. Por curiosidade mórbida resolvi dar o play, e as cenas seguintes agiram de forma inesperada. Passei a sentir empatia pelo rapaz do filme caseiro. Seu corpo assemelhava-se ao meu, magro com um traseiro rechonchudo. A cada estocada, gemia alto e descaradamente, evidenciando dor e prazer. Foi preocupante, pois realmente parecia sua primeira vez, e tratando-se de um vídeo amador, as chances dobravam. O homem acima dele rebolava com gosto, sem se importar com o pobre menino. A cena causou tanto impacto sob mim que tive necessidade de revê-la ao menos três vezes, e, na última delas, bati uma punheta gloriosa. A depressão surgia em seguida: Que porra se passava comigo? Estava virando gay? Não! Mulheres faziam minha cabeça e assim deveria continuar a ser.
Ainda naquela semana (para acrescentar no meu inferno astral) terminei um namoro de sete meses com uma garota do colégio, fato esse sem relação com o incidente dos vídeos pornográficos. Seguido a isso, finalmente entrei para a maioridade. Lembro de, em um passado não muito distante, idealizar a chegada aos 18 anos. Mal esperava a bosta que isso significava.
...
Então, no dia do meu aniversário, gastei toda tarde em casa enfiado nos games, uma das minhas maiores paixões. League Of Legends era responsável por eu virar noites e dias feito um zumbi, sem cansar ou ter uma rotina comum. De certa forma esse jogo surtia um efeito negativo em mim, pois me isolava do resto do mundo, e naquele período mais que nunca, levando em conta minha maioridade e recém-formação no Ensino Médio - não tinha emprego, não consegui passar no vestibular e fingia passar longas horas estudando, trancado no quarto.
Minha mãe inventava formas de dizer o quanto estava orgulhosa de mim. A tentativa do dia foi comprar um bolo de confeiteiro na padaria e colocar em cima da mesa após o jantar daquela noite. Senti papai querendo critica-la por gastar quase cinquenta reais. Ele disfarçava muito mal.
- Faz um pedido, meu lindo. – Dizia Patrícia, sorrindo depois de cantar parabéns acompanhada pela voz engasgada de Vicente.
Assoprei as velas enquanto olhavam meu meio sorriso desconfortável. É desconcertante ouvir seus pais cantando parabéns para você depois dos 18, porque você não é mais uma criança! Eles criam mais expectativas que no passado. Esperam ver você entrar na universidade, arrumar um emprego, ajudar nas despesas. E não querem alimentar um jogador de League Of Legends mentiroso.
Fechei os olhos e pedi um X-box.
- E então? – Vicente apressou. – O que você pediu?
- Não pode falar, pai. – Disfarcei. – Se não o desejo não vira realidade.
- Espero que tenha pedido um emprego bom.
E assim iniciava mais uma discussão familiar.
- Já tava demorando! – Soltei.
- Ai Vicente, como você consegue ser desagradável! – Patrícia me defendia.
- Nossa, parece um pecado dizer pra ele que precisa trabalhar. – Vicente dizia apontando pra mim. – Eu na sua idade já tinha minhas coisas e trabalhava desde os dezesseis.
-Acontece que não sou você. – Falei, irritado.
- Claro, teve tudo sempre de mão beijada. – Acusou ele.
- Chega gente! Agora não é hora pra isso, vamos partir o bolo. – Patrícia segurava a espátula na mão, um pouco nervosa. Reconheci seu esforço em tentar amenizar o estresse, mas o nervosismo deixava o clima ainda mais tenso.
Patrícia cortou ligeiramente um pedaço e o colocou em uma louça para sobremesas, a mesma que usava em ocasiões especiais. Sorriu e perguntou:
- E para quem vai o primeiro pedaço?
- Pra mim mesmo. – Respondi, nervoso, encarando meu pai e agarrando o prato.
Andei rumo ao meu quarto e a última frase que ele disse foi:
- Viu só como não vale a pena agradar esse mal criado?
Crise dos 18 instalada com sucesso! Parecia parte de um processo onde eu seria expulso de casa se não me movesse, se não corresse atrás do que todos correm. Mas para onde ir? Voltei ao meu computador e entrei nos sites de emprego. Poucos deles ofereciam vagas para o meu perfil: sem primeira oportunidade. Parece que ninguém nunca inicia no mercado, todos já entram com experiência, dada a pouca quantidade de vagas para iniciantes.
Abro o livro de física, a pior matéria existente. Não compreendia como números se misturavam a teorias. Gostava de explicações cientificas, detestava cálculos para exatificá-las. O mundo seria tão mais bonito se cálculos não fossem necessários. Mas, segundo meus professores, eram fundamentais e eu tinha que encará-los sem medo. Mais uma indignação: ter que ser bom em matemática, química e física. Se eu pudesse, pularia essa parte.
Não aguentei dez minutos de estudo e abandonei. Não existia motivação dentro de mim. Meu coração vibrava por apenas uma coisa: o gráfico de games novos. Compreendia que para cria-los necessitaria de uma formação sólida, revendo conceitos matemáticos e toda a porcaria que eu repudiava. Droga.
Deitei na cama, peguei o celular, coloquei os headphones e dei play em uma música no Spotify. Playlist rock’n roll. Ia de Iron Maiden a Barão Vermelho. Papai me ensinou a gostar dessas velharias. Era o tipo de coisa que ele curtia na época que conheceu mamãe, e recorrentemente descrevia com notável nostalgia. Ele teve uma adolescência muito mais divertida que a minha e por isso eu o invejava ao máximo... Sempre quis ser aqueles garotos que saem na rua ao meio dia e só voltam para casa três da madrugada com mil histórias para contar. Agora eu nem tinha uma porra de uma namorada para ter uma desculpa e escapar dali. Meu quarto virou prisão e isso me angustiava.
Queria matar tempo, me entreter com alguma coisa, sair da bad. Bater punheta com certeza ajudaria. Comecei a imaginar o corpo da vizinha, uma garota mais velha que eu, peitos grandes, trancinha loira, olhos verdes que me fitavam todos os dias quando a encontrava saindo ou entrando em casa. De vez em quando ela se sentava na calçada e ficava conversando com o namorado. “Droga!” pensava. Ela namorava um cara mal encarado, malhadinho, com tatuagem nos braços evidenciados por frequentemente usar camisa regata. Eu achava um corpo maneiro, se eu não o detestasse... Mas ela tinha bom gosto em tê-lo como namorado. Na última vez que a vi junto com ele, reparei mais na tribal bem desenhada no braço do cara que nas pernas dela.
Meu pau subiu. Mais pela tatuagem que pela imagem da garota. Preocupante, mas me dava muito prazer algo desconhecido, inexplorado. Permiti-me ir além e dar corda à fantasia. Sexo a três. Um belo beijo triplo e sarradas na cama. Meu pênis encostando no dele.
-Que porra é essa? – Perguntei a mim mesmo no meio do desvairo erótico.
Parei de pensar no cara e me concentrei na vizinha, no entanto já era tarde demais. Ela sozinha já não tinha graça. Porra! Me tornar gay seria mais uma barra pra segurar, e pesada.
“Talvez eu não seja” pensei. “Pode ser só mais uma loucura minha, tenho a imaginação fértil”. Lembrei de uma diálogo com Lucca. Ele comentou a respeito de uns aplicativos para celular, onde gays interagiam por meio de trocas de mensagens.
A tentação falou mais alto. Instalei. Tinha que conversar com um gay para ter certeza. Sofria o medo de me excitar com a situação, entretanto poderia também concluir que tudo não passava de uma ilusão minha e obter o desencargo de consciência ao não me sentir atraído por ninguém na aplicação.
Criei um perfil discreto, não quis me expor. Caso alguém solicitasse, mandaria uma foto do corpo, desse jeito não haveria a possibilidade de ser reconhecido. O aplicativo me informava todos os homens próximos à minha residência. Jovens, homens de meia idade, coroas, malhados, magrinhos e gordinhos. Caras de todos os tipos. Eu não sabia como começar um diálogo ou quem escolher. Por isso acessei uma das funcionalidades: rodada de matches. O sistema se encarregaria de me apresentar os homens e eu deslizaria a foto dos candidatos para a direita caso me interessasse e à esquerda se não fosse do meu agrado. Passei por volta de cinquenta caras, desses apenas sete me chamaram a atenção. Uns por se parecerem com o namorado da vizinha, tatuados e exibicionistas, outros porque eram coroas ajeitados, os quais me despertavam curiosidade. Deveriam ser experientes e quase sempre pacientes.
Em menos de cinco minutos um perfil me envia mensagem. “Dotado bi”. A foto exibia um corpo semi definido e cueca à mostra. Quis saber quais dotes ele teria… talvez fosse inteligente, por isso a descrição no perfil. Mas essa possibilidade foi descartada quando comecei a conversar com o moço e notei que usava o “mais” no lugar do “mas”. O papo me entediava, por isso provoquei perguntando qual dote ele tinha. Recebi a foto de um pinto enorme como resposta. Senti um mix de pavor, surpresa e desejo. Minha coragem murchava perante o membro majestoso. Nem em outra vida eu aguentaria aquele tamanho. “Merda!” xinguei. Já estava cogitando experimentar aquilo. Fechei o aplicativo, fim de jogo! Não abriria novamente! Perda de tempo tentar se encontrar manjando pênis de homem.
O celular treme mais uma vez. É nessa hora que parece ter um diabinho cutucando a gente com um tridente. Notificação: Você tem uma nova mensagem. Quis desinstalar o app e parar com aquilo. Fugir da ideia de que poderia ser gay, fingir a inexistência deste tipo de sentimento. Tive o ímpeto de parar com a brincadeira.
Percebi que tratava-se de um dos matches me chamando. Abro seu perfil. Um coroa, quarenta anos, barba, óculos Wayfarer, frase de apresentação intelectual, camisa xadrez, estilo hipster moderno, chamava-se Alberto. Ele escreveu “Olá, tudo bem?” Minha resposta: “tudo. dsclp acho q errei de app” Ele perguntou o porquê e eu me fiz de desentendido. “Aqui só tem homem, vlw flw”. Alberto me confrontou com a resposta “Sim, este é um aplicativo gay, é lógico que só tem homens.” Retruquei com “Por isso mesmo estou saindo, caras não são a minha praia.” Por fim, recebo a mensagem tentadora, quase como um desafio “Será?”.
“Será?” pensei. “Não, é coisa que enfiei na cabeça”. Isso por ficar assistindo pornografia na internet. Antes era uma bronha inocente, depois, um questionamento, agora eu estava conversando com um coroa. Já tinha até preferência por homens mais velhos! Loucura.
Eu: “Bom, ñ sei bem pra ser sincero”
Alberto: “Sinto que você é um rapaz muito interessante, posso ter uma foto sua?”
Eu: “Já disse, não sou gay”.
Alberto: “Tudo bem, mas ainda acho que podemos ao menos nos divertir juntos.”
Que homem persistente. Merda. Já não conseguia deixar de respondê-lo. Foi por isso que passamos quase meia hora teclando. Ao fim, não cedi a foto desejada, por isso Alberto desistiu de mim.
...
Aos sábados frequentemente acordava cedo para enfrentar uma maratona no transporte público. ônibus/metrô/ônibus, sair quase duas horas mais cedo de casa e sonhar com a não-lotação. Já no cursinho, os professores sedentos nos bombardeavam sem dó com informações complexas às oito da manhã: matemática, biologia e química. Muita coisa de uma vez, quase impossível absorver os conceitos. Por isso, gravava os áudios de algumas aulas no aparelho celular.
Aquela manhã não foi diferente. Sentindo um sono súbito, deixei o gravador ligado jurando ouvir todo conteúdo da aula assim que chegasse em casa. Acomodei o rosto no meu braço apoiado à carteira e dormi. Cheguei a sonhar ouvindo as explicações dos professores, a voz dele funcionando como som ambiente... Trigonometria... embriologia... elementos químicos... Via imagens psicodélicas girarem em meu cérebro. Talvez estivesse ficando maluco, mas podia compreender este como um reflexo da minha desmotivação. Dormir a manhã toda, ali, no fundo da sala e sonhando com números, células e tabela periódica, ambos girando feito o olho de um furacão, meio a cores psicodélicas piscando sob mim como luzes estroboscópicas neon, num show medonho de pirotecnia. De repente, sou atingido por um cheiro. Ele não me traz desconforto, pelo contrário, afasta as luzes, acalma a bagunça. Começo a ser seduzido por um perfume suave, acalentador.
- Vamos pro intervalo ou você vai dormir o dia todo? – Disse Lucca, debruçado sob mim, quase cara-a-cara.
Levantei de supetão e busquei a origem do cheiro, mas estava atordoado demais para discernir.
-Você sentiu isso? – Perguntei.
-Isso o quê? – Lucca devolveu a pergunta, confuso.
Agarrei o colarinho da jaqueta jeans de Lucca e a cheirei. Era o perfume do sonho. Comecei a suspeitar de um plano maquiavélico onde ele forjava a situação para me seduzir.
- Caramba, seu perfume é forte demais, devia usar menos. – Disfarcei.
- Como assim? Foi só uma borrifada pela manhã e é uma colônia super cheirosa que minha madrinha me deu. – Ele justificou.
- Esquece Lucca, vamos comer.
Depois do incidente Lucca ficou estranho, como se estivesse sacando minha atração. Mas eu iria escondê-la. Como virar e dizer pra um melhor amigo que você estava tendo uma pira com o cheiro dele? O pior é que cada vez que exalava o perfume, meu coração disparava inexplicavelmente.
As aulas seguintes foram: português, história, geografia e redação. Dessa vez, fiquei de olhos bem abertos, principalmente em Lucca. Por que quando sonhamos com as pessoas, acordamos as vendo de forma diferente? Agora já não conseguia esconder minha perturbação. Ele olhou para mim e revirou os olhos.
Na aula de redação, a última do dia, o pau comeu feio em um debate intelectual sobre a questão de cotas raciais em universidades e cargos públicos. Existia a famosa separação: aqueles que abominavam este direito, e os defensores absolutos da cota. Dentre os favoráveis, Eric, um rapaz articulado que se envolvia em todas as discussões provocadas pelo professor. Seus pontos de vista eram defendidos com muita energia e convicção. Contradizê-lo parecia ser uma tarefa difícil. Sempre requisitado pelos professores, tornava evidente ser o futuro filho prodígio da USP.
Péssimo como sou em redação, escutei atentamente toda perfeita argumentação lançada na dissertação de Eric, e no final da aula senti a vontade de ler o texto dele para relembrar algumas partes. Decidi pedi-lo emprestado, já que não teria utilidade nas próximas aulas. O rapaz alto, cabelos cacheados e barba cheia tinha um olhar esnobe, isso intimidava os outros alunos, criando um clima de competição.
- Olá, desculpe incomodar. – O rapaz fez um sinal com a mão direita para que eu parasse de falar e atendeu o celular.
- Pai, eu já te disse que não tem necessidade de me buscar na porta do cursinho, eu não to mais na escola, porra. – Rasgou, desligando o aparelho em seguida.
- Então, como eu ia dizendo, desculpe incomodar. – Dei continuidade cautelosamente. – Vi que você construiu uma redação impecável, inclusive compartilho de vários pensamentos que você defendeu nela. – Tentei usar palavras bem formais para impressioná-lo. – Poderia me emprestar para uma releitura? Prometo que devolvo no próximo sábado.
- Não. – Respondeu secamente. – Estou cansado de todo mundo se beneficiar com as minhas ideias. Quer construir uma redação igual? Abre a apostila e estuda. Agora tenho que ir, estou atrasado.
Lucca, me observando de longe e atento no diálogo, ficou boquiaberto. Eu mesmo estava em choque pela estupidez recebida. Deus! Se arrependimento matasse, eu teria caído duro ali mesmo.
- Se você quiser a minha emprestada. – Disse Lucca, abanando uma folha. – Aqui está. – E me entregou.
O papel tinha seu cheiro. Droga, eu queria rasga-lo e jogar no lixo para afastar a tentação.
- Acho melhor não tentar forçar amizade com esse povo daqui. É tudo muito competitivo, você não percebe? – Ele me aconselhou.
- Porra, isso aqui não é meu mundo. – Concluí.
- Não se abalada cara, uma hora a gente se adapta. – Lucca colocou o braço sob a minha nuca e deu tapinhas no meu ombro. Me afastei imediatamente, sem que ele percebesse meu receio.
Muita gente circulava na fachada do cursinho. Carros parando pegando pessoas, gente aguardando o trânsito parar para atravessar a rua, alunos sentados nos corrimãos da rampa de deficientes. Em meio a isso, avistei Eric mais uma vez, agora sem querer, parado, talvez esperando uma outra pessoa. Ao seu lado, um homem de camisa preta, óculos e calça jeans. Que puta cagaço eu senti na hora que liguei os pontos e entendi: Alberto, o cara do aplicativo gay era pai de Eric.
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