AMOR DE PESO - 01X20 - AMEAÇAS E DESCOBERTAS

Um conto erótico de Escrevo Amor
Categoria: Homossexual
Contém 5583 palavras
Data: 13/10/2016 00:58:50
Última revisão: 16/12/2020 10:17:11

Antes de tudo quero desejar um FELIZ DIA DAS CRIANÇAS para todos os meus leitores. Nossa, escrever essa série está sendo incrível, a cada capítulo mais de 300 pessoas leem, então, já é uma vitória e motivação. Infelizmente, faltam poucos capítulos para o fim da temporada. E, espero continuar contando a história dessas pessoas que aprendi tanto a gostar. E vocês são o principal motivo disso tudo, obrigado.

******

Pai e mãe,

Finalmente parte da minha vida está voltando ao eixo. O Diogo e eu, de um jeito estranho, continuamos amigos e não paramos de andar juntos. Já minha história com o Zedu, bem, isso é um capítulo a parte, a Alicia tomou para si a missão de cuidar dele, ou seja, o Yuri não tem espaço.

***

Ok. Depois de quase morrer em uma floresta, decidi fazer uma lista de prioridades, a primeira coisa era fazer uma dieta, afinal, precisava emagrecer para ganhar mais controle sobre o meu peso. Em segundo lugar, melhorar minhas habilidades de primeiros socorros. Em terceiro, beijar a boca do Zedu que, mesmo com o pé enfaixado, continuava lindo demais.

A gente aproveitava cada minuto a sós para fazer aquilo que todo jovem gay gosta. A partir daquele momento, passei a perceber alguns detalhes sobre o José Eduardo, como por exemplo, a respiração ofegante dele entre os beijos ou o gosto de balinha de menta que ele deixava na minha boca.

Durante os beijos, o Zedu gostava de acariciar minhas bochechas, ele adorava quando elas ficavam vermelhas. Confesso que nem todos os nossos encontros eram românticos, a maioria acontecia em alguma sala vazia ou no banheiro, mas para mim, era sempre prazeroso.

— Já sumimos por tempo demais. — falei, quase empurrando o Zedu, mas o segurando ao lembrar do seu pé machucado. — Desculpa.

— Tudo bem. Eu sei que é perigoso. — Zedu concordou, antes de se afastar e olhar no espelho.

— Zedu, eu só não quero ser apenas mais uma transa para você.

— E quem disse isso? — ele perguntou tocando na minha bochecha direita.

— Ninguém, Zedu, mas olha a nossa situação. Temos que esperar ninguém estar por perto para curtir. — tentei ponderar meu tom, mas o banheiro fazia muito eco.

— Desculpa, desculpa ser tão complicado. Eu gosto de você, mas...

— Eu sofri bastante para sair do armário. Não estou te cobrando nada. Só queria ser o seu namorado sem ter medo.

— Podemos esperar até depois do baile de férias? Por favor.

— Tudo bem. Desculpa, parecer tão dramático. Mas, quando você provar a sensação de ser livre, tipo, não vai querer outra coisa.

Sim, infelizmente, o Zedu continuava lutando contra a sua sexualidade. O medo de uma sociedade machista, o fazia enxergar apenas o lado negativo de ser gay. Afinal, o Zedu é um cara padrão, que sempre esteve entre os héteros 'topzeiras', então, entendo alguns de seus questionamentos.

***

O George, nosso amigo fotógrafo, decidiu fazer uma exposição com fotos de casais LGBTQIA+. O Diogo, nem preciso falar, ficou animado com toda a situação. Recebemos um convite para trabalhar na produção e, também, fazer o cadastro dos casais que participariam do ensaio fotográfico.

É tão bom se sentir incluído dentro de uma comunidade. Pensei que quando havia terminado o meu lance com o Diogo, a minha amizade com George, Jonas e Hélder também terminaria. Mas, na verdade, tivemos uma conversa bem madura e recebi ótimos conselhos, só que precisei omitir algumas coisas, como o meu relacionamento com Zedu.

— Yurizinho. Fiquei tão aliviado que você está bem. — disse George, enquanto, organizava seus equipamentos de fotografia.

— Sim, eu também. Foi complicado, porém, ficamos bem. — falei sentando ao lado de George.

Eles começaram a brincar por ficar perdido com o Zedu. Sim, se eles soubessem a verdade, que transei no meio da floresta em uma situação tão estranha. Olhava para o Diogo e ficava triste, uma vez, que ele ainda sentia algo, e eu, idiota, resolvi seguir meu coração e continuava sofrendo, mas de uma maneira diferente.

— E você acha que muita gente vai se inscrever? — perguntei, tentando tirar a atenção de mim.

— Infelizmente, poucas pessoas. — murmurou George, me fazendo rir, pois, quase deixou cair uma lente caríssima. — Cacete.

— Muitos que gostariam não são assumidos, né. Isso é horrível. — comentei, ao lembrar a situação do Zedu.

— Sim. A garotada gay ainda é reprimida, foi assim na minha época e continua. Sabe de uma coisa, Yuri. Acho que você e o Diogo deveriam fazer o ensaio. Tá, eu sei que vocês nunca vão ter nada, mas, tenho certeza, que muitos jovens ficariam inspirados.

— Eu topo! — Diogo falou nos assustando.

— Nossa, Diogo. Você demorou muito. — reclamou George, sentando em uma cadeira e limpando o suor da testa.

— O trânsito está horrível. Trouxe o pen drive com as artes da exposição.

***

Após todo bullying que sofri durante os anos, passei a refletir sobre o motivo de existir tantas pessoas ruins no mundo. Em Manaus, encontrei diversas pessoas legais, porém, tive o azar de encontrar o Vando. De acordo com meus amigos, o vando sempre foi dessa maneira, ou seja, um idiota completo.

Naquela tarde, a Ramona fez algumas compras para melhorar o seu humor, enquanto, caminhava para casa, ela foi abordada pelo Vando. Nesse momento, ele começou a fazer brincadeiras de duplo sentindo.

De uma maneira brusca, Vando pegou as compras de Ramona e se ofereceu para acompanha-la. Revoltada, a minha amiga pegou de volta suas sacolas, mas Vando a chamou de ridícula e oferecida. Com a cabeça quente, a Ramona deu um tapa na cara do crápula.

— Você está maluca? — Vando perguntou, erguendo o braço para bater em Ramona.

Ramona fechou os olhos e esperou o tapa, mas, pelo contrário, ouviu Vando gemer de dor. Ela se espantou quando viu o Brutus batendo em Vando. A Dona Helena, proprietária da panificadora da rua, ficou perto de Ramona e afirmou que assistiu todo o abuso dele.

Se tem uma coisa que percebi, em Manaus, é que as pessoas adoram uma confusão. Alguns moradores ajudaram Brutus a segurar Vando até a chegada da polícia. Após alguns minutos, todos foram levados para a delegacia. O seu Walter, pai de Ramona, ficou possesso ao ver as gravações de um sistema de câmera que a policia recolheu.

Não havia como o ridículo do Vando se safar. As imagens eram claras, a Ramona havia sofrido um abuso e, por causa de Brutus, as coisas não terminaram piores. A ação do meu amigo fortinho repercutiu em todo bairro e o vídeo virou sensação na internet, ganhando várias versões, uma melhor que a outra.

***

Em casa, as coisas estavam tranquilas. A titia e o Carlos passaram a sair todos os dias. A Giovanna continuava a mesma, já o Richard havia mudado um pouco, o que a culpa não faz, né? Tentava não pensar no Zedu, então, focava na educação dos meus irmãos e na vida amorava da tia Olivia.

— Yuri. Posso trazer um amigo da escola amanhã? — perguntou Richard, sentando do meu lado e me dando um abraço.

— Sem facas, explosivos, animais peçonhentos ou se embrenhar na floresta. — adverti, passando a mão nos cabelos de Richard.

— Pode deixar.

— Ah, e amanhã não venho na van. A mãe do meu amigo vai nos trazer. — disse Richard.

— Como assim? Eu quero vir de carona também. — Giovanna disse, voltando sua atenção para a nossa conversa.

— Não tem vaga. Ela tem quatro filhos. — Richard fez uma careta engraçada e tirou Giovanna do sério.

— Affz, vou ter que vir naquela lata de sardinha. Uó. — ligando o celular e abrindo a câmera frontal. — Essa foto mostra a minha indignação.

Mães conseguem sentir a tristeza dos seus filhos, no caso do Zedu não foi diferente. Durante a sua recuperação, Dona Teodora, sentiu que algo o incomodava. Além da cicatriz na perna, ele também ficou mais avoado que o normal. Após uma sessão no fisioterapeuta, Zedu chegou faminto em casa e, de longe, conseguiu sentir um arama familiar e delicioso.

Para tentar alegrar o filho, ela preparou carne assada, o prato preferido de Zedu. Mesmo com suas dúvidas, a maneira peculiar dele comer ainda se mantinha firme. Aquilo enchia o coração de Teodora, afinal, ela estava educando o Zedu para se tornar um homem de bem e a cada dia tinha certeza disso.

A mãe de Zedu se preocupava com a recuperação do filho. Ele ficou com uma grande cicatriz na perna, mas até isso era bonito nele. Acho que o Zedu ficou mais charmoso. A dona Teodora era uma mãe muito carinhosa, e que sempre teve o sonho de ter filho, o Zedu era seu eterno bebê. Os dois irmãos de Zedu, o José Luiz e o Frederico, já estavam na faculdade, então de certa forma já eram independente dos pais.

— A comida não vai fugir do seu prato. — repreendeu Teodora, servindo um pouco de carne para si.

— Está muito bom, obrigado. — afirmou Zedu, limpando a boca que estava suja de caldo.

— Esse meu filho. — pensou Teodora, assistindo a Zedu destruir dois pedaços de carne em menos de um minuto. Ela não aguentou e sorriu para o filho.

— O que foi?

— Você está diferente, Zedu.

— Diferente?

— Você está mais leve, feliz. Acho que você tomou a decisão certa em terminar com a Alicia.

— É quase como se a gente não tivesse rompido. Ela está sempre no meu pé. — reclamou Zedu, tomando um copo de suco e respirando fundo.

— Te sinto diferente desde quando você ficou perdido na floresta. — comentou Teodora, antes de cortar a carne delicadamente e comer.

— Mãe, eu... — Zedu tentava encontrar as palavras corretas, mas seu coração não se conectava ao cérebro.

— O que foi?!

— Eu...

— Boa tarde, família! — gritou Fred, o irmão mais velho de Zedu, entrando de forma abrupta.

Sim, uma oportunidade perdida. Zedu sentia medo. Medo de ser rejeitado pelos pais e irmãos. Medo de perder o aconchego do lar. Medo de enfrentar o desconhecido. Afinal, o ser humano está sempre com medo, mesmo em situações simples. Aquele poderia ser o momento ideal para sair do armário, porém, ele recuou e não, eu não o culpo por isso.

Enquanto uns evitavam conversas sérias, outros mergulhavam de cabeça em novos horizontes. A minha amiga Letícia, a cada dia, entrava mais no universo do seu namorado, Arthur. O rolê da vez foi em um protesto contra o uso de animais em testes farmacêuticos.

Pessoas com os rostos pintados, bandeiras de várias entidades e cartazes, dezenas de cartazes. "Diga não aos testes em animais", "Animais não são máquinas", "Salvem os animais" e "Animais são anjos", essas eram algumas das frases que ela leu, enquanto, se dirigia ao palco.

O casal encontrou Bernardo, o melhor amigo de Arthur, que usava uma camiseta com a frase: "Os testes realizados em animais, são a verdadeira prova da ignorância humana". Aquilo acendeu algo dentro de Letícia, por um momento, ela pensou que tudo aquilo era um circo, mas ao ver as estatísticas e imagens, ficou reflexiva e decidiu ajudar.

Enquanto, Bernardo explicava o plano para Letícia, Arthur sorria e sentia-se feliz por tê-la ao seu lado. Ele nunca pensou que encontraria o verdadeiro amor, mas lá estava ela. Arthur adorava tudo em Letícia, seu sorriso, seus cabelos, a cor dos seus olhos e o espírito indomável que existia dentro dela.

O grupo montou a manifestação em frente à uma empresa que foi exposta na internet por fazer teste em ratos, coelhos e gatos. Arthur levou a câmera para registrar o protesto, ainda mais um com a participação de sua namorada. A Letícia e outras meninas, tiraram as roupas e ficaram apenas com peças íntimas, outro rapaz começou a jogar uma tinta vermelha nelas.

— É isso que acontece com os animais! Eles são torturados todos os dias por muitas empresas. Será que eles não tem direito a liberdade?! Quantos animais morrem com esses testes cruéis ? E se isso fosse feito com humanos?! — Bernardo gritava em um microfone, chamando a atenção de muitas pessoas que passavam na área.

Mudar o mundo com uma apresentação é impossível, mas, dentro de Letícia, algo mudou e ela estava adorando fazer aquilo, principalmente, por causa da mensagem que eles queriam passar. A polícia apareceu no protesto, porém, não fizeram nada, afinal, a manifestação era pacifica.

Em um certo momento da performance, a Letícia bateu a cabeça com força no chão, mas não parou de atuar. Ela se entregou de corpo e alma para ajudar os animais indefesos. A equipe de Bernardo conseguiu arrecadar mais de duas mil assinaturas de pessoas que passavam pela rua. A sensação de dever cumprido fez os jovens manifestantes respirarem aliviados.

Depois da manifestação, eles seguiram para a sede do PA (Parceiros dos Animais), que ficava próximo à casa de Letícia. No meio do caminho, a minha amiga sentiu um gosto doce na boca e, segundo Arthur, a tinta usada para a apresentação era feita com produtos naturais, por isso, a sensação agridoce na boca dela.

— Amor, onde eu posso me lavar? — perguntou Letícia ao entrar na sede do PA.

— Tem um banheiro no fundo. — disse Arthur pegando a mochila e entregando para a namorada. — Tem uma toalha dentro, você pode usar.

Sim, o dia da Letícia foi maravilhosa, apesar de bater a cabeça no chão e ficar com uma forte enxaqueca, ela ficou feliz em ajudar uma causa importante. No banheiro, ela abriu a mochila e encontrou o frasco do remédio de Arthur. Pensando ser um analgésico, a minha amiga tomou duas pílulas e engoliu sem tomar água, coragem que se fala, né?

Enquanto isso, Arthur usava o notebook para checar as imagens que fez durante o protesto. Ele reassistiu a apresentação da namorada umas sete vezes e, em cada uma delas, encontrava um motivo para amar Letícia.

A minha amiga abriu a bolsa e encontrou o frasco do remédio de Arthtur. Ela tomou pensando que era para dor de cabeça. Arthur também nem se atentou ao remédio, ficou mais interessado nas imagens que havia feito durante a manifestação.

— Muleque, o bagulho ficou louco mesmo. Parabéns. — Bernardo agradeceu o amigo, que ficou assustado e sorriu. — Dando um looping infinito na sua gatinha?

— Ela é linda, né?

— Eita! — Bernardo exclamou levantando as mãos. — Mulher de parceiro meu é homem.

A felicidade, infelizmente, vem para poucos. O Zedu continuava confuso e, por algum motivo, eu não conseguia ajuda-lo. A única pessoa que sabia sobre nós era a tia Olívia, ela sempre me apoiou, mas ainda não queria contar sobre o avanço no nosso relacionamento.

Quando estávamos sós, conseguia ver um lado iluminado do José Eduardo. O cara romântico, que gostava de colecionar clichês, como por exemplo, me presentear com rosas, criar playlists de músicas românticas, ficar de mãos dadas em lugares vazios e dizer palavras carinhosas no meu ouvido.

Sim, a cada dia, sonhava com o momento que seríamos livres para viver a nossa verdade. Afinal, a gente não estava fazendo nada de errado. Erámos dois jovens apaixonados e ponto. Por que é tão difícil ser gay no Brasil? Por que não somos educados desde pequenos a respeitar a orientação sexual dos outros? Que droga.

Nosso "rolo" já durava dias, entretanto, não havia acontecido o encontro oficial. Então, decidimos aproveitar um feriadão para finalmente marcar o encontro. Fomos na opção mais segura, no caso, o combo "jantar + cinema". Para ser justo, ele pagou pelo restaurante e eu arquei com os ingressos.

"O que usar no primeiro encontro", escrevi no google, enquanto, pensava no melhor look para vestir. Levantei e fui até o meu guarda-roupa. Muitas peças pretas e com estampas engraçadas, então, lembrei de uma mala que trouxe do Rio de Janeiro e não desfiz.

— A minha salvação! — gritei sozinho no quarto e correndo para abrir a mala.

Cuecas. Meias. E, graças a Deus, blusas sociais que combinaria com a ocasião. Precisei lavar todas, pois, estavam com um cheiro estranho. Nunca usei tanto amaciante na minha vida, sério. Acabei com a metade de um frasco de 1 litro. Queria causar a melhor impressão, afinal, não conseguia impedir uma leve comparação com a Alicia.

Durante anos, o Zedu teve apenas a ex-namorada como referência para um encontro. Como competir com isso? Tentei não surtar, mas uma voz dentro de mim dizia para desistir. Será que valeria a pena investir em uma relação com o Zedu? Lembrei de uma pessoa que poderia me ajudar, então, peguei o notebook e abri o Skype.

Yuri:

— Preciso da sua ajuda. Você está só?

Hélder:

— Claro, meu ursinho albino!

Fiz uma chamada de vídeo com Hélder. No início, fiquei com muita vergonha, nunca tive um amigo para conversar sobre encontros. Ainda bem que o Hélder soube contornar a situação. Ele é um homem de quase 40 anos, que adora vestir roupas espalhafatosas e se tornou uma espécie de referência para mim.

— Então, eu vou ter um encontro, mas não é com o Diogo. Estou conhecendo uma pessoa, só que ainda é cedo para dizer onde isso vai dar. Hoje temos um encontro e não sei como agir. — contei para Hélder, sem ter medo de deixar tudo explicado.

— Olha, viado. Não vou mentir. Fiquei triste por você rejeitar o Diogo, mas, também sei que é complicado lidar com o coração. — Hélder disse de forma teatral, fingindo um choro que valeria um Framboesa de Ouro.

— Hélder. É sério, estou assustado. Sei que você conhece o Diogo há muito tempo e, tipo, sou um agregado entre vocês. Não tenho mais ninguém para conversar. E não me permito machucar o Diogo falando sobre isso. — falei me aproximando da câmera, o que fez o Hélder rir do meu desespero.

— Ei, calma. Sim, conheço o Diogo há um tempo, mas você tem um lugar no meu coração, Yuri. Tá, vamos lá. Esse garoto que você vai sair é gay? Por que você sabe que muitos caras, ainda mais os casados, gostam de objetificar o corpo gordo. — senti uma tristeza na voz de Hélder.

— Ele é gay, no armário, mas deixou a namorada para ficar comigo. E quando eu digo deixou, deixou mesmo.

— Ótimo. Então, não tenha medo. Seja você. Qual é, Yuri? Você é um menino inteligente, sensível e, sei que é clichê, mas você tem um sorriso muito bonito. Não é difícil imaginar os motivos que levaram esse rapaz a se apaixonar por você.

Ok. Não era algo muito difícil. Conversei bastante com o Hélder, quase esqueci dos motivos que me deixaram nervoso. Queria muito leva-lo como amigo para o resto da minha vida, pois, além de conselhos, ganhava também um show de 'stand-up comedy'.

Às 19h de uma sexta-feira, eu, Yuri, encontrei o Zedu para o nosso primeiro encontro. Fui na opção mais segura e usei uma camiseta 3/4 estampada com flores pretas, calça preta e um sapatênis, quase hétero topzeira. O Zedu, por outro lado, estava lindo de morrer. Ele usou uma camisa jeans azul com mangas curtas e camiseta preta, calça jeans skinny e um coturno preto.

O Zedu escondia algo, não entendi muito bem o que era. De repente, ele pede para eu fechar os olhos, isso tudo na entrada do shopping, e me entrega um urso de pelúcia. Nunca vi o Zedu tão vermelho, e com certeza, eu também estava. Não conseguia evitar, os nossos olhares ficavam se encontrando e os sorrisos apareciam fácil em nosso rosto.

Engraçado, o conheço há meses e nunca tivemos problemas para iniciar uma conversa, mas naquele momento em particular, como mágica, as palavras sumiram. O meu coração palpitou forte quando o Zedu se aproximou, de perto, pude ver mais detalhes do meu date, como por exemplo, os cabelos penteados para trás e o cheiro inconfundível do Biografia.

— Você... você... está lindo. — ele soltou ficando vermelho e soltando um riso abafado.

— Você também. — falei, sem ter noção do que fazer em seguida.

— O filme começa às 19h30. Vamos?

O caminho até o cinema foi no mínimo interessante. A gente seguiu em silêncio. Na minha cabeça, o Zedu não estava curtindo aquele encontro. Pensava em formas de iniciar uma conversa, mas tudo atrapalhava, como a senhora que pediu ajuda para chamar um Uber ou o preço exorbitante de um PS4.

Ainda bem que chegamos a tempo de comprar os ingressos. O filme escolhido? "A Festa do Sangue 5 - Tripas Voadoras". Sim, nada melhor do que um filme de terror para aquecer um encontro. Paguei com o cartão e estava tão nervoso que errei a senha duas vezes, o que tirou um riso da atendente.

Enfrentamos uma fila para comprar pipoca e refrigerante. O Zedu pegou o celular e começou a mandar algumas mensagens. Realmente, o encontro não estava saindo como o esperado. Precisava tomar uma atitude para não transformar o primeiro encontro do Zedu com outro homem em uma lembrança negativa.

— Tá, quente hoje. — comentei para chamar a atenção do Zedu, enquanto seguíamos para a sala da sessão.

— Oi? — ele perguntou, guardando o celular no bolso da camiseta.

— Zedu. Eu estou nervoso, ok. Eu não quero que esse encontro se torne uma lembrança pavorosa, ok. Você deve ser o rei dos encontros, ok. — nunca falei tantos "ok's" na vida.

— Yuri. — Zedu disse rindo e pegando no meu rosto. — Você fica muito fofo nervoso.

— É sério, Zedu.

— Yuri. Sim, você é o meu primeiro encontro com um homem. Confesso que estou nervoso. E não sou o rei do encontro. — ele confessou rindo de novo — E, sim, fiquei no celular, mas foi porque a mulher do restaurante mandou uma mensagem para confirmar a reserva. Estou gostando do encontro, juro. Gosto de qualquer coisa com você. — Zedu conseguiu me deixar mais relaxado. — Deixa eu te ajudar com esse refrigerante.

Escolhemos os últimos acentos, por que, segundo o Zedu, a acústica era melhor e poderíamos aproveitar a experiência do filme. Ele sentou e, logo, levantou a divisória dos assentos, criando assim o espaço ideal para mim. A luz apagou e percebemos que a sessão estava vazia, ou seja, momento de pegação.

Pela primeira vez na vida, beijei um homem no cinema e foi ótimo. Entre gritos de dor e desespero, eu explorava cada parte do corpo do Zedu. Tivemos que lutar contra os nossos instintos, pois, ser preso não era um item bom para o nosso primeiro encontro.

— Acho melhor a gente segurar a onda. — pedi, virando para a tela e vendo uma moça peituda ser cortada ao meio com um moto serra.

— Caramba. A produção desse filme é caprichada.

Do nada os créditos subiram. Olhei para o Zedu incrédulo. A gente se beijou por uma hora e meia. As luzes acenderam e afetou nossa visão, mas não segurei o riso ao ver o cabelo do Zedu todo bagunçado. Seguimos para o banheiro e demos um trato no visual, ainda faltava a segunda parte do encontro.

O restaurante não ficava tão longe do shopping, então, pegamos um Uber. No trajeto, o Zedu ficou fazendo carinho na minha mão. Eu não sabia que encontros podiam ser tão bons, ainda mais ao lado de alguém tão especial. No rádio, começou a tocar "Don't Look Back in Anger". O Zedu olhou para mim e deu um sorriso tão lindo que poderia iluminar toda a cidade.

***

"And so Sally can wait

She knows it's too late

As we're walking on by

Her soul slides away

But don't look back in anger

I heard you say"

***

Preciso revelar uma coisa: o Zedu é o rei das expressões faciais. Ele é uma pessoa muito fácil de desvendar, quando está triste ou feliz, suas expressões entregam. Quando seus olhos encontravam os meus, conseguia perceber uma ternura que me deixava emotivo. Eu poderia morar para sempre dentro daquele carro, mas, como disse, o restaurante não ficava tão longe.

A primeira coisa que vi foi o Teatro Amazonas. O restaurante em questão ficava em um prédio ao lado do teatro mais famoso do Amazonas. Subimos uma pequena escada e a decoração chamou minha atenção, tudo tão fofo. Uma moça nos recebeu na entrada e quase ri quando o Zedu falou seu nome verdadeiro.

A atendente olhou em uma prancheta e nos deixou entrar. A atmosfera do restaurante era maravilhosa. Não conheço muito de música clássica, mas, observando as paredes pude ver várias referências a cantora Édith Piaf, que inclusive dava o nome ao restaurante. Percebi, também, que o dono do lugar decidiu preservar a história do prédio, nem preciso dizer que adorei.

Percebi outros casais gays, inclusive, um estava comemorando 10 anos de casamento. O Zedu acertou em cheio na escolha, acho que ele pensou nesse restaurante desde o início. O Zedu pagou pelo rodízio de massas, ou seja, aproveitei cada minuto.

Conversamos bastante durante o jantar, sempre aprendia algo novo sobre o Zedu, como por exemplo, sua paixonite pelo professor de biologia ou sua breve passagem em um grupo de hip hop. Contei mais sobre os meus pais e a minha avó diabólica. Eram momentos como esses que nos unia como um casal.

— Estou cheio. — Zedu soltou se encostando na cadeira.

— Obrigado, Zedu. Sei que o encontro nem acabou, mas obrigado. — agradeci, tentando não deixar a situação estranha.

— Tudo bem, bebê. — ele se assustou com o bebê e coçou a cabeça.

Eu era o bebê do Zedu. Eu. Puta merda. Se uma pessoa pudesse entrar em combustão por felicidade, eu já teria explodido. A garçonete chegou para levar os pratos sujos e cochichou algo no ouvi de Zedu, que um "ok" utilizando a mão direita. Ela trouxe uma bandeja coberta com uma cloche (espécie de tampa oval).

— Obrigado. — disse Zedu aparentando estar nervoso. — Yuri. Eu sei que estou te dando pouco. A minha cabeça continua temerosa, mas uma coisa que não estou é confuso sobre os meus sentimentos. Eu te vejo com o Diogo e tenho ciúmes, desculpa, não consigo evitar. E, também, não estou no direito de te exigir nada. Quero que você tenha paciência, assim como estou tendo. — ele levantou o cloche.

Era uma sobremesa. Juro que não esperava por aquela declaração. "Quer namorar comigo?", estava escrito com chocolate no prato. Nem liguei para o doce, desculpa, Petit Gâteau. Você que lute, pois, acabei de ser pedido em namorado pelo garoto dos meus sonhos.

— Yuri. — Zedu me tirou do transe.

— Oi?

— Hum. — ele disse apontando com olhos para o prato.

— Aceito. Aceito. — falei, evitando às lágrimas, enquanto, Zedu saiu da sua cadeira e sentou ao meu lado e me beijou.

— Eu te amo, Yuri.

Queria saber que empurrão de coragem foi esse que o Zedu levou. Ele me beijou na frente de todos. Tá, tudo bem que eram estranhos e, provavelmente, nunca mais nos veríamos de novo, mas adorei cada momento desse encontro. Não sei se a minha história com o José Eduardo vai ser para sempre, porém, próximos namorados, vocês vão ter que se superar.

***

O feriado passou e com ele um dos momentos mais especiais dos meus 16 anos. Na escola, a gente precisava manter uma certa distância, só que sempre achávamos uma brecha para declarações fofas. O Diogo começou a desconfiar, mas estava focado em conseguir os documentos necessários para Portugal.

Enquanto isso, Brutus foi confrontando por João e Lucas. Eles viram o Brutus conversando comigo e resolveram tirar a história a limpo. Aparentemente, a situação deixava os meus colegas desconfortável. Com uma paciência fora do normal, Brutus, chamou os dois para a sala de computação.

Meio contra vontade, João e Lucas, seguiram o Brutus. De início, eles ficaram sem entender o motivo. Então, Brutus dei o play no sistema de vídeos e uma cena de João e Lucas se pegando apareceu. Vi toda a situação de longe, no fundo da sala, e confesso que fique com pena deles.

Com vergonha, Lucas, implorou para Brutus desligar o vídeo, João, por outro lado, partiu para cima do meu amigo, tomou o controle e desligou o aparelho. Ele soltou os cachorros, gritou e esbravejou.

— Vai usar de violência?! — questionei, surpreendendo os dois.

— Seu gordo! — João gritou partindo para cima de mim, mas sendo impedido por Brutus.

— Brutus, cara. Isso não é nada. Foi uma brincadeira minha e do Lucas. — João tentou apelar para Brutus.

— João. Desde sempre você me jogou contra o Yuri. E vocês dois, que tanto pregam ódio...

— O que vocês vão fazer com isso? — quis saber Lucas chorando.

— Escuta aqui. A gente não quer fazer nada contra vocês, mas as brincadeiras com o Yuri precisam parar. Eu sou amigo dele e nada vai mudar isso. Então, sem planos e pegadinhas. — disse Brutus pegando no meu ombro.

— Besteira. Posso processar vocês. — João tentou crescer na nossa direção.

— Será? Por que para processar você vai ter que mostrar o vídeo para muitas pessoas. — Brutus fez uma expressão que me deu arrepios, lembrou aqueles vilões de novela mexicana. — O vídeo está em um lugar seguro, mas se eu ficar com raiva, bem, não respondo por mim.

— Chega. — intervi pegando em Brutus. — Eles entenderam. Vamos. — quase arranquei Brutus da sala.

Ódio. Após o susto passar, João, chorou e sentiu apenas ódio. Com pena do amigo, Lucas, tentou se aproximar, entretanto, levou um tapa e foi responsabilizado pela situação. Afinal, na cabeça de João, Lucas era um oferecido e servia apenas para transar. Por outro lado, Lucas não conseguia entender a raiva do colega.

— Me perdoa, João. Você é meu único amigo e...

— Cala boca. — João desferiu outro tapa em Lucas, que caiu no chão chorando. — A gente precisa pensar em uma forma de acabar com o Yuri. Eu vou acabar com esse gordo. — ameaçou João chorando.

Sim. A minha vida está em uma crescente linha reta. O Brutus conseguiu me surpreender ao bolar um plano tão brilhante que dava medo. Após o nosso momento Soraya Montenegro (vilã de Maria do Bairro), segui para a biblioteca e encontrei Diogo que fazia uma pesquisa para o nosso trabalho de Biologia.

Ele estava todo feliz, pois, faríamos o ensaio juntos. George já havia preparado todas as locações e a nossa seria no estúdio. O Zedu mandou uma mensagem super fofa, na verdade, a foto do prato de Petit Gâteau que devoramos na sexta. Entedia a parte do segredo, porém, não deixava de ser difícil.

A Letícia se sentiu zonza e achou que era devido a dor de cabeça. No fim de semana, ela pegou algumas pílulas de Arthur e guardou na mochila por precaução. Durante o intervalo, a minha amiga tomou o remédio na esperança de aliviar o enjoo.

Engraçado que um amigo consegue sentir quando não estamos 100%. Ramona entrou na sala e encontrou Letícia debruçada sob a carteira. Para animar a amiga, ela mostrou algumas fotos da manifestação que viralizaram nas redes sociais.

— Amiga. Foi... T.U.D.O. Acho que vou participar de mais apresentações. — revelou Letícia dando gritinhos de alegria.

— Nossa. Que animação. Não sabia que salvar o mundo era tão legal.

— Fazer parte de algo tão bonito. Ramona, você precisa participar comigo. Eles são tão legais. O Arthur é um anjo enviado pelo nosso senhor Jesus Cristo. Espero que a gente fique por muitos e muitos anos. — Letícia falou tão rápido que quase não respirou.

— Você parece um pouco agitada hoje. Não quer ir na enfermaria?

— Estou ótima. E me conta, o Brutus já te pediu para ir ao baile?

— Não. Ele tá demorando demais. Estava pensando em pedir e...

— Acho super legal. Eu, por exemplo, vou pedir ao Arthur. Amiga, vivemos no século 21. As mulheres precisam se livrar dessas amarras que a sociedade patriarcal nos emprega. Podemos votar, dirigir, conseguir trabalhos maravilhoso, então, qual o problema de chamar o crush do ensino médio para o baile da escola?

— Letícia, amiga. Respira. — pediu Ramona, estranhando a atitude da amiga. — Mas, no fundo, você meio que tem razão.

No quarto tempo, não tivemos aula, a professora adoeceu e ficamos com um período livre. Decidi ir à uma sala vazia, queria terminar o projeto de Biologia, a pesquisa do Diogo foi o suficiente e o liberei para arrumar sua documentação.

Enquanto tentava analisar os efeitos de agentes químicos sobre material hereditária, senti uma mão tocando no meu ombro. O Zedu sorriu e conseguiu tirar minha irritação. Fechei a porta e não pude evitar dar alguns beijos nele. Me arrependi quando as coisas ficaram mais quentes, pois, a farda não nos deixava esconder qualquer evidência de diversão masculina.

— José Eduardo, para. — pedi, sabendo que aquilo não era verdade, queria mais e mais.

— Calma. Não posso vir beijar meu namorado. — ele disse beijando meu pescoço.

— Tá bom. Já beijou. Agora vaza.

— Ai! — ele gritou pegando no coração. — Que rude.

Era para ser a semana mais feliz da minha vida, mas o destino gosta de pregar suas peças e testar nossa resistência. Atrás do balcão, João e Lucas, ouviam toda a conversa, eles até tentaram pegar o celular para gravar, porém, não conseguiram .

Aquilo só aumentou a raiva de João. No fundo, ele era apaixonado pelo Zedu e não gostava da minha amizade com ele. Durante um bom tempo, o João tentou fazer parte da turma, mas, assim como o Vando, ele acabou não conseguindo encontrar um espaço.

Atrás do balcão, João e Lucas ouviam toda a conversa, eles até tentaram pegar o celular para gravar, mas não conseguiram. O João ficou com mais raiva ainda. No fundo, ele era apaixonado pelo Zedu e não gostava da minha amizade com ele. O João até tentou fazer parte da turma, mas o Zedu tratou ele normal.

Apesar dos esforços de João, Zedu nunca olhou de outra forma para ele. Na sala de aula, ele ficou possesso e Lucas percebeu que a fisionomia de seu amigo estava diferente, quase fora de si.

— Calma. Podemos usar isso contra ele. — Lucas cochichou no ouvido do amigo.

— Ele vai me pagar. Eu vou destruir esse gordo! — declarou João, morrendo de raiva.


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CLARO QUE POR TRÁS DE TANTO ÓDIO TEM UM AMOR, UM TESÃO ESCONDIDO. NÃO PODERIA SER OUTRA COISA. MAS VC TROCOU VÁRIAS VEZES OS NOMES NO CAPÍTULO DE HJ.

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