Quando nós chegamos em casa, eu me joguei no sofá. O Bruno foi para o banheiro. Fiquei pensando no que havia acontecido. O que será que o Thiago queria tanto falar comigo? Por que ele insistia tanto?
- Tá tudo bem mesmo? – Disse o Bruno sinalizando para eu levantar a cabeça para ele sentar e eu colocar a cabeça na perna dele.
- Tá, sim!
- Posso te dar um conselho?
- Pode!
- Escuta o que ele tem a te dizer. Ele só vai parar quando conversar contigo.
- Tu existes mesmo? – Eu disse cutucando a perna dele.
- Por que tu perguntas isso?
- Por que eu acho que tu és o único cara que aconselharia o cara que tu estás ficando falar com o ex-namorado.
- Não vejo nenhum problema nisso!
- Que bom que eu te conheci! Que bom que eu tive aquela doença! – Eu disse de olhos fechados.
- Eu também agradeço o dia em que tu apareceste naquele hospital. – Ele disse me dando um beijo. – Tu vais escutar o que ele tem a te dizer?
- Não sei se eu quero, Bruno.
- O que te impedes de ouvi-lo?
- Não sei!
- Então deixar de agir como uma criança e escuta o cara.
Depois dessa eu fiquei em silêncio.
- Desculpa ter falado assim contigo!
- Não, tudo bem! Acho que eu estou merecendo ouvir isso mesmo! Eu prometo que amanhã eu ligo para ele e marco uma derradeira conversa.
- Isso aí!
Confesso que eu gostei daquela atitude do Bruno, ele não queria me controlar, me prender, se tinha ciúmes se controlava bastante... O oposto do Thiago.
- Vamos assistir filme? A gente ainda tem dois filmes para assistir, amanhã já temos que devolver.
- Vamos, sim!
Nós fizemos todo o ritual de preparação da sala para podermos assistir aos filmes. Nós nos deitamos e começamos a assistir. Eu fiquei um tempinho lá com o Bruno, mas eu não estava me concentrando. A conversa com o Thiago não saia da minha cabeça. Então, eu deixei o Bruno lá e fui para o quarto ligar para o Thiago.
- Alô?
- Antoine? És tu, meu amor?
- Me polpa, né Thiago! Mas sim, sou eu! Eu estou te ligando para marcar uma conversa contigo amanhã de manhã, pode ser?
- Tu vais me ouvir?
- Vou!
- Onde a gente se encontra?
- Pode ser lá na Fortaleza?
- Pode, sim! Que horas?
- Às 9h está bom?
- Eu passo aí para te pegar?
- Não precisa!
- Ah, agora tu já tens outra pessoa para te levar, né?
- Boa noite, Thiago! Até amanhã! Era só isso que eu tinha para te falar. Obrigado por me atender.
- Eu sempre vou te atender, Antoine! Eu sempre vou te amar!
- Boa noite, Thiago! - Disse encerrando a ligação
Como um ser pode ser capaz de dizer que ama e fazer o que fez? Como isso é possível? Que tipo de amor é esse? Eu não acreditava mais no que ele me falava.
- Já acabou o filme? – Eu perguntei quando voltei para a sala.
- Ainda, não!
- Eu liguei para ele!
- Ligou? E aí?
- Nós vamos conversar amanhã de manhã lá na Fortaleza.
- Que bom, Antoine! Mas ó, vai com calma, com o coração e a cabeça abertos. Escuta tudo o que ele tem para te dizer.
- Eu não entendo o motivo de tu me falares tudo isso.
- Eu já te disse, eu não quero construir uma relação em cima de outra.
- Nós temos uma relação?
- Estamos começando a ter, e por mim vamos solidifica-la cada vez mais, mas para que isso ocorra, tu precisas por um ponto final ou uma virgula nessa tua história com o Thiago.
- E se eu colocar uma vírgula?
- Aí, eu saio de campo e deixo vocês viverem a história de vocês.
- Eu não vou colocar uma virgula, Bruno, eu vou colocar um ponto, eu já me decidi!
- Não falas nada agora, Antoine! Amanhã depois dessa conversa nós conversamos, até lá eu acho que a gente pode curtir um pouquinho mais um ao outro, né? – Ele falou me beijando.
- A cada dia eu me encanto mais contigo! – Eu disse enquanto ele beijava meu pescoço.
Nós transamos ali mesmo no chão da sala. E acabamos adormecendo lá também. No outro dia, o Bruno acordou super cedo, eu acabei acordando enquanto ele tentava me tirar de cima dele.
- Desculpa, eu não queria te acordar! – Ele disse.
- Tudo bem! Eu tinha que acordar mesmo, lembra? Eu vou conversar com o Thiago.
- Mas eu pensava que tu ias falar com ele mais tarde.
- Eu vou falar com ele às nove.
- Mas ainda são 6h, Antoine!
- Eu sei! Vai tomar teu banho e te arrumar. Eu vou preparar um café para nós.
Ele ficou me olhando e sorriu, aquele sorriso dele mexia comigo. Eu adorava vê-lo sorrir. Não, não era somente carência, de fato, o Bruno mexia comigo. Eu poderia não amá-lo, mas ele me encantava, me fazia feliz. Era questão de tempo para eu amá-lo. Eu sabia que ele também não me amava ainda, mas ele se sentia igual à mim ou sentia até mais.
Eu fui para cozinha e comecei a preparar um café. Eu fiz uns sanduiches, fiz ovo frito, peguei umas bananas e um mamão e fiz uma vitamina. Quando o Bruno veio do quarto pronto, a mesa já estava arrumada. Eu corri no quarto e escovei meus dentes e voltei para a cozinha para tomarmos café juntos.
- Bom dia! – ele disse me dando um beijo quando terminamos de tomar café – Matem a calma lá na conversa, tá?
- Pode deixar!
- De noite eu passo aqui para nós conversarmos.
- Vou ficar te esperando.
Eu fui levando o Bruno até a porta.
- Não pensa em mim enquanto estiver conversando com ele, pensa em ti, na tua felicidade.
- Vou fazer isso! – Eu disse o abraçando.
Ele retribuiu o abraço e me apertou contra o corpo dele. Ele me olhou nos olhos e me beijou.
- Até mais tarde! – Ele disse
- Até!
****************
Eu fiquei agoniado até dar 9h, parecia que ia dar 10h, mas não daria 9h. Quando eu vi que era 8h30, eu saí quase correndo para o ponto de ônibus. Como a maioria ia para o centro, eu peguei qualquer um. Fui pensando em o que o Thiago ia me falar. Fui pensando em nós, na nossa história, na nossa amizade. Quando eu dei por mim, eu já tinha que descer.
Eu desci no ponto e fui andando até a Fortaleza. Quando eu cheguei lá eu fiquei procurando por ele e não o encontrei. Então, eu me sentei debaixo da arvore onde eu sempre sentava quando eu ia ali. Lembrei da conversa que eu tive com minha tia quando eu ainda estava com câncer. Lembrei dela falando que o Thiago me amava, e novamente me veio a seguinte pergunta na cabeça: que raio de amor era esse que trai a pessoa amada?
- Bom dia! – Ele disse sentando na minha frente.
- Bom dia!
- Então...
- Então...
- Tu prometes me ouvir até o fim?
- Prometo!
- Promete não me atrapalhar enquanto eu falo?
- Prometo! Pode começar!
- Tudo bem! Bom, para começar eu te amo!
- Pula essa parte, Thiago!
- Tu prometeste me ouvir!
- Ok, ok! Desculpa!
- Bom, eu sempre te amei e tu sabes disso. Quando tu estavas doente eu fiquei com muito medo de te perder, muito medo mesmo. Eu me sentia fragilizado, eu me sentia perdido, pois tu eras meu porto seguro. Quando tu terminaste comigo, eu quase entrei em depressão, minha mãe fez de tudo para me animar, mas nada deu resultado. Foi só quando nós nos reencontramos que eu melhorei. Mas aquela sensação de perda nunca me deixou, eu tinha pavor de te acontecer alguma coisa. Aí, eu comecei a ter ciúmes de ti. Eu não enxergava nada na minha frente quando eu te via conversando com outra pessoa. Eu ficava dominado pelo medo. – Ele respirou fundo e continuou falando – Quando meu pai fez aquilo lá na casa dos teus pais, ali eu perdi o norte novamente. Meu pai era tudo para mim. Ele me ligava, depois daquele dia, quase todas as noites, muito porre, só para me ofender, ele falava que ele nunca teria um filho gay, que com certeza minha mãe teria lhe traído e que eu era filho de outro homem. – Ele começou a chorar - Em uma dessas noites, eu não aguentei quando ele me ligou somente para me chamar de viado, de bichinha do cu arrombado, de chupa pau e diversas outras ofensas. Eu te deixei dormindo e sai de casa, eu fui parar em um bar. Lá eu comecei a beber e de repente sentou um cara do meu lado e me ofereceu algo mais forte. Eu bebi junto com ele, quando eu já estava ficando tonto, ele me ofereceu outra coisa. Ele me mostrou dois pacotinhos, eu já não estava raciocinando bem, então eu aceitei. Nós fomos para o banheiro e ele fez quatro fileirinhas com o pó e me deu um canudo. Ele me mostrou como se fazia para inalar aquele pó. Eu segui direitinho o que ele fez. Naquele dia eu transei com ele ali dentro do banheiro. Foi a primeira vez que eu te traí.
Eu respirei fundo, por que ouvir aquilo fez com que minha cabeça gritasse: dá um soco na cara desse imbecil! Mas eu não fiz nada e deixei ele continuar.
- Depois desse dia, toda vez que meu pai me ligava eu procurava o Pedro, ele nunca me cobrou pela droga que ele me dava. O preço dele era o sexo, e era assim que eu pagava. Eu não vou mentir pra ti, nós ficamos várias vezes. Eu não sei o que deu em mim para convidá-lo para passar o ano novo conosco, mas com ele eu me sentia em paz comigo mesmo.
Eu não aguentei e acabei interrompendo o relato dele.
- Quer dizer que eu não era suficiente? Tu precisas de droga para te sentir bem? Eu me sentia bem somente com a tua presença, Thiago.
- Não, não foi isso que eu falei. Aquela angustia, a raiva, a mágoa que eu sentia do meu pai só passava quando eu estava com a droga e, consequentemente, com o Pedro. No dia 30 de janeiro, os amigos dele usaram a droga conosco e nós passamos a noite cheirando o pó e transando, ninguém tinha consciência do que estava fazendo ali. Eu não falava contigo por que toda vez que eu chegava perto de ti as cenas das transas que eu tinha com o Pedro vinham na minha cabeça e eu não conseguia falar contigo. Eu sentia raiva de mim mesmo. Na noite do réveillon eu não consegui te abraçar e nem te desejar nada, se eu ficasse mais tempo perto de ti eu teria falado tudo e eu não poderia correr o risco de te perder.
Nesse momento eu senti minhas lágrimas caírem. Ele me olhou e continuou a falar.
- Eu fui com o Pedro para o quarto para que nós pudéssemos usar a droga, eu aproveitei que estavam todos brincando e conversando e fugi com ele. No quarto nós cheiramos e começamos a nos beijar, foi nesse momento que tu chegaste. Quando eu te vi, parece que o efeito da droga foi embora e eu percebi a burrada que eu tinha feito. Mas eu só percebi o quanto eu tinha te ferido quando tu me deste aquele soco. Quando tu saíste de lá minha mãe me segurou, ela não entendia o que estava acontecendo, mas eu não podia contar para ela. Foi então que eu comecei a discutir com o Pedro, eu comecei a culpa-lo pelos meus erros. Nós discutimos feio lá em cima, quando eu desci para te procurar tu já tinhas ido embora. O Pedro e eu ainda discutimos na frente de todo mundo, minha mãe ficou desesperada com aquela cena e acabou passando mal. Quando eu te liguei e tu me falaste que tinha acabado tudo e que era para eu pegar as minhas coisas da nossa casa, eu perdi meu norte, o chão sob os meus pés pela terceira vez. Antoine, eu tenho sofrido muito desde daquele dia, eu não tenho mais vontade para nada, eu não queria sair de casa, se não fosse a Jujuba eu com certeza seria um viciado agora. Ela me levou para um grupo de narcóticos anônimos, e lá eu estou conseguindo me livrar da droga. A Jujuba ia em todas as reuniões comigo, ela acompanhou tudo de perto. Eu só estou conseguindo me livrar da droga pelo fato de estar bem no início, mas eu estou fazendo todo um tratamento com um psiquiatra. – Ele respirou fundo – Bom, era isso que eu queria te falar.
- Eu não sei o que dizer... – Eu falei olhando para o chão.
- Diz que me perdoa, por favor! – Ele falava chorando.
- Não, eu não consigo fazer isso, Thiago! Eu não consigo passar por cima de tudo isso! Não dá! Não me pede isso! Nada do que tu me falaste, por mais grave que sejam essas coisas, nada justifica o que tu fizeste. Nada!
- Antoine, eu estava fora de mim, não era eu ali, me entende por favor!
- Não, Thiago, tu poderias ter falado comigo, eu teria te ajudado, tu poderias ter sido sincero comigo, mas não, tu preferiste viver duas vidas. Preferiste me enganar, me trair, me esconder uma coisa tão grave quanto essa. Desculpa, mas eu não posso te perdoar.
- Tu ainda me amas?
- Eu não sei!
- Tu estás com o Bruno?
- Estou!
Ele ficou em silêncio e eu também.
- O que eu vou fazer da minha vida sem te ter ao meu lado?
- Eu não sei, Thiago! Eu não queria que tudo terminasse assim, não queria mesmo, mas eu não consigo esquecer aquela cena, toda vez que eu te olho eu lembro. Mesmo se eu quisesse te perdoar, não daria mais certo, essa traição ia me corroer por dentro, nós iriamos desgastar nosso amor até ele morrer.
- Eu prometi nunca deixar isso acontecer.
- Pois é, infelizmente não cumpriu a promessa.
- Eu posso ser pelo menos teu amigo?
- Por enquanto vamos ficar longe um do outro, assim nós poderemos seguir caminhos diferentes. Depois, caso o destino deseje, a gente se encontra de novo e retomamos nossa amizade. Eu não me perdoo por ter ficado contigo e ter estragado nossa amizade. Se eu pudesse voltar atrás eu jamais teria aceitado ficar contigo.
- Eu não me arrependo de nada. Foi contigo que eu passei os melhores momentos da minha vida. Foi contigo que eu conheci a felicidade.
- Eu também conheci a felicidade contigo, mas também conheci a decepção, a raiva, a tristeza.
- Tu tens tanta raiva assim de mim?
- Eu não tenho raiva de ti, Thiago, não mais. Eu só não quero ter que conviver contigo como antes. Eu quero esquecer essa história, só isso.
- Eu jamais vou esquecer nossa história, Antoine!
- Eu não disse que eu quero esquecer A NOSSA história, eu só quero esquecer o que tu fizeste.
- Eu me arrependo amargamente de ter feito tudo isso. Foi por causa de mim mesmo que eu te perdi.
- Tu ainda estás indo às reuniões lá dos narcóticos?
- Sim!
- Tu não vais deixar de ir não, né?
- Não!
- Que bom! Eu quero que tu fiques bem! – Eu disse pegando na mão dele.
- Eu estava com saudade do teu toque.
- Eu preciso ir agora, Thiago.
- Não, não vai ainda.
- Eu preciso ir! – Eu disse me levantando.
Quando eu me levantei ele também se levantou e me deu um abraço apertado. Eu pude sentir o cheiro dele.
- Eu te amo! Te amo mais do que qualquer coisa nesse mundo, eu vou te esperar o tempo que for preciso. – Ele disse enquanto me abraçava.
- Não me espera, vive tua vida. Eu quero que tu sejas feliz. Eu quero que tu encontres um novo amor que possa te fazer muito feliz. – Eu falei chorando
Nós nos separamos e ele ficou me olhando nos olhos. Eu sempre achei aqueles olhos verdes lindos.
- Tchau! – Eu disse enquanto ele segurava as minhas duas mãos.
- Até logo!
Ouvindo isso eu fui andando, fui deixando para trás o cara que eu mais amei nessa vida.
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