Me olho no espelho e vejo em meu próprio reflexo, um vazio. É como se eu não soubesse quem sou de verdade; é como se a minha vida desmoronasse gradativamente... Ilusões e desilusões, fracassos e mais fracassos, decepções constantes... Ufa! É isso aí Guilherme, bora virar este jogo!
SEMANAS DEPOIS...
- Não me venha com seu discursinho de que o senhor me ama igual ao Arthur! Ele é o filhinho que se casou com uma mulher, que te deu um neto... Quê saber? Eu nem devia está aqui discutindo este assunto!
- Quer parar com este drama Guilherme? Vocês dois são os meus filhos. E amo os dois da mesma forma! Eu só não concordo com algumas atitudes que você toma meu filho...
- O senhor não concorda o fato de ter um filho gay! Se lembra o dia em que eu disse que iria trazer um homem para apresentar a família? Hein?... A cara que o senhor fez... Aliás, você e o Arthur! Eu to pouco me importando o que o meu irmãozinho e o senhor pensam!
- O que está acontecendo aqui? – eis que entra o meu irmão mais velho, ao lado de sua esposa Karen. Ela era um amor de pessoa, mas o meu irmão, vazia de tudo pra infernizar a minha vida, pois ele ale de homofóbico, não suportava nem mesmo a presença dos meus amigos.
- Nada! Eu estou indo e não tenho hora pra voltar! Fui.
- Eu ainda não acabei nossa conversa Guilherme. Sou o seu pai e ainda mando nesta casa.
- Ótimo! Se quiser saio hoje mesmo... Bayyy.
Não que eu fosse rebelde ou coisa parecida. Mas a minha família me tirava do sério. Porraaaa! Me tirava muito do sério. Eu respirei fundo e entrei no táxi, rumo à casa da minha grande amiga Vivi. Juntos aos meus amigos, eu tinha paz, liberdade e expressão.
- Veja quem chegou... O gostosão... – disse a Vivi, ao me ver. Eu estava usando uma calça jeans colada no corpo, e uma regata branca, com uma jaqueta de couro preta.
- Viadooo! Você tá um escândalo! – o Victor me deu um selinho. Ele era um gay afeminado e muito divertido. Nós três formávamos um trio incomparável.
- Estou ansioso para o meu primeiro baile numa favela. – na verdade, eu estava muito ansioso, ao mesmo tempo em que certo medo tomava conta de mim. Por mais pacificada que estivesse à favela do Borel, era sempre perigosa.
- Prontos? Vamos arrasar neste baile! Hoje eu quero beber muito e dançar pra caralho! – gritou Vivi.
Pegamos outro táxi e descemos na entrada do morro do Borel. As pessoas a princípio, pareciam receptivas. Subimos uma ladeira do morro, até o local onde estava bombando o baile. Nós entramos e estava a maior ferveção. A casa tava lotada e muitas pessoas dançavam ao som de funk. Eu, a Vivi e o Victor, não perdemos tempo, e fomos atrás de cachaça pra dar uma animada. Logo, nós entregamos a cada música... Como se o mundo fosse acabar amanhã e que se foda o resto!
Eu estava numa fase da vida, em que o mais importante era os momentos intensos que eu vivia. Por muitos instantes, eu me esquecia da minha família, e quem eu era e só pensava em desfrutar das proibições e luxurias da vida.
- Esta festa tá maravilhosa. Olha só quanto homem gostoso. Acho que vou ter uma overdose, com tantas delícias. – eu bebia muito e dançava até o chão.
- Acho bom você você se acalmar, porque não estamos em boate GLS, e você não sabe como são estes caras.
- Ai Vivi, para de ser boba. E quem lhe disse que homem de favela não curti outros caras?
- Não se esqueça de que estamos em território ao qual não dominamos baby.
- Relaxa amiga. Vamos beber, vamos curtir. Cadê o viado do Victor? Deve tá dando por aí né? – caímos na gargalhada.
- Não faço a mínima ideia de onde foi parar o Victor. Você sabe como ele é né? Homem é com ele mesmo...
- Vem, vamos dançar. Jogamos bebida pra cima, nos abraçamos completamente bêbados, sem noção, sem saber o que acontecia a nossa volta; até que por mais ou menos 4:00 da manhã, ouve uma gritaria e tumulto por parte das pessoas que estavam ali. Uma facção vizinha queria invadir o baile, mas os “donos” da favela impediram a base de tiros, e ficamos desesperados, sem entender nada. Foi uma correria e gritaria para todo lado, até que eu me perdi do Victor e da Vivi. Saí da casa de show e sem rumo, vendo aquela correria, entrei numa rua deserta. O medo tomou conta de mim e eu não queria morrer naquele lugar. Vários tiros foram dados. Eu senti alguém me perseguindo, até que um braço me puxa para um beco escuro.
- Olha cara, eu te dou o que você quiser. Meu dinheiro, meu relógio, meu tênis... Só não me mate, por favor! – eu estava desesperado.
- Cala a boca. Quem mandou está no lugar errado?
Eu não conseguia ver o seu rosto, que estava coberto por um capuz preto.
- Eu sou rico, eu posso te dar muito dinheiro. Não me mate.
- Hummm... Está se borrando de medo não é? – ele riu da minha cara. – Eu não vou lhe matar. Vem, entra aqui.
Ele me arrastou para uma casa caindo aos pedaços, e só havia uma iluminação na sala, porque o resto era decadente. Até que ele retirou o capuz do rosto, e eu quase tive um troço,tamanho era a beleza daquele homem, magro, de cabelos rebeldes e olhos negros.
- O que você vai fazer comigo? – eu perguntei assustado, mas hipnotizado por ele. Confesso que fiquei excitado por ele. Coisas indecentes pairavam sobre minha cabeça.
- Por enquanto nada. Recebo ordens, e até que me mandem te matar, eu ficaremos aqui, um olhando para cara do outro.
- Então você vai mesmo acabar com a minha vida? Quanto você quer para me deixar sair deste lugar?
- Eu quero que você cale a porra da boca. Senão eu dou um tiro na sua garganta.
- Eu não vou permitir que você fale desse jeito comigo! Quer matar? Pois então atira! Eu nunca tive medo de nada nesta vida, não é agora que eu vou ter.
- Escuta aqui, seu filho da puta. Fica quieto, porque quem dá ordens aqui sou eu. – ele gritou e apontou a arma sobre minha cabeça.
- Ninguém me dá ordens. Nem mesmo você. – eu era atrevido.
- O viadinho quer mesmo morrer né? Quer bancar uma de corajoso agora? Hum?
- Viadinho é o seu irmão. Me respeite seu bandido idiota!
- Do que me chamou? – ele atirou para cima, me deixando com mais medo. Eu estava o subestimando, e pondo em risco a minha vida.
- Desculpa. Eu ficarei em silêncio. Prometo!
- Acho bom. Não tô a fim de me irritar com você. O que tu tava fazendo aqui na favela do Borel?
- Eu só vim a um baile com os meus amigos. Queria me divertir, e me disseram que aqui, as pessoas são super agradáveis... Você não é daqui né?
- Isso não te interessa!
Ficamos em silêncio por um instante. Ele se afastou para atender o celular, e eu fiquei o admirando. Não sei o que deu em mim, mas havia algo naquele cara magro, mas com expressões fortes, que mexia comigo. Parece loucura da minha parte, até mesmo insanidade, mas eu estava adorando toda aquela adrenalina. Eu queria atiçar a fúria daquele homem e ver onde tudo aquilo iria acabar.
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CONTINUA...