Capitulo 28
O modo como ele estava sentado, como estava totalmente relaxado e rindo não estavam me transmitindo segurança. Ao contrario disso, eu estava um tanto quanto hesitante.
Li não me passava mais segurança.
Parecia que ele estava rachando, minúsculas rachaduras em sua fachada perfeita desmoronado, revelando o interior podre e totalmente alheio para mim.
Eu não conhecia aquele Li.
Eu ainda estava a uma boa distancia dele, mas não conseguia desviar a atenção daquele sorriso sinistro, não era o sorriso que eu estava me viciando, era uma versão mudada, feia, repugnante. Aquilo estava me dando nojo, meu estomago estava revirando e quando eu achei que a situação não podia ficar pior ela ficou.
- Foi tudo armação, sabe? - As palavras dele estavam carregadas de sarcasmo, não consegui conter a onda de espasmos que se alastrou pelo meu corpo segundos depois de escutar a voz dele - Tudo, desde o começo. Nada foi consciência, foi tudo planejado.
- E você armou tudo isso, Li? - Não sei como consegui disser alguma coisa, não sei quem ficou mais surpreso de nós dois. Li devia está esperando um de meus usuais ataques de choro para se vangloriar, mas eu não iria dar isso a ele. Chorei mais do que deveria ter chorado por ele durante esses dois meses que nós estávamos separados. Agora? Bem agora eu estava me esforçando o máximo para nem demonstrar tristeza. Mas fiquei um pouco decepcionado comigo mesmo quando vi que mesmo conseguindo falar minhas palavras saíram doloridas e frágeis, apenas ecoando o que eu sentia por dentro - Você que arquitetou isso tudo, Li-Yang?
- A não, não - Ele sacudiu as mãos e sorriu pra mim, seu sorriso ainda continuava contaminado para mim - Foram os outros, eu apenas encenei toda essa palhaçada durante quase dois anos. Desde o começo quando vimos você entrar na sala de aula parecendo um gato molhado, queríamos pregar uma peça em você, fazer o calouro se apaixonar pelo veterano, mas no final resolvemos prolongar tudo. Legal, né?
- Sim, muito - Mesmo estando mergulhado em um oceano de decepção, tristeza e incredulidade uma ilha de raiva solitária surgiu, se fixando impetuosamente no meio daquele caos de tristeza, estava tentando chegar até aquela ilha, pisar no seu solo de raiva, me alimentar de seu alimento de fúria, sorver a mais pura explosão de destruição raivosa. Mas não conseguia, ondas e mais ondas de tristeza me afogavam - E posso perguntar o por que de todo essa sua participação nesse plano brilhante, Li?
- Brilhante mesmo - Se levantou da cadeira onde estava sentado, andou alguns poucos metros e se jogou no sofá do lado esquerdo da sala, um gesto que eu teria achado comum se tivesse sido feito antes de Li se revelar um perfeito mentiroso e hipócrita - Eu acho que até merecia um Oscar - Ele deu uma risada, olhou para mim e viu que eu não estava rindo, parou - Melhor atuação dramática se encaixaria bem, não ia?
- Ia! Perfeitamente - Eu consegui colocar um pouco de sarcasmo em minha voz, diluindo um pouco a tristeza - Mas o que se iria caber como uma luva em você era o premio de maior mentiroso do século.
- Ah Christian para de drama! - Seu sorriso se desfez e eu quase agradeci a ele por isso, quase. Por que no lugar do sorriso ele fechou a cara transformando-a em uma mascara de fúria - Sabia que no começo sua voz me dava nos nervos? Essa sua rouquidão era tão esquisita! Parecia um velho falando... Ah! Falando em velho, é assim que eu vejo você, sabia? Um velho tolo, sem vida, chorão e nojento. O que me deu mais raiva foi o tempo que você se deixou se levar pela minhas palavras.
- Talvez eu tivesse já pressentindo que você não prestava - Estava me aproximando da ilha de raiva, sentia uma cálida sensação quente passando pelo meu corpo, mas não durava por muito tempo, ainda estava bastante triste - E como você se sentiu quando conseguiu me levar para cama?
- Triunfante - Outro daqueles sorrisos horríveis - Até que você não me decepcionou nesse quesito. Tinha fogo toda hora e isso eu gostava em você.
- Então a única parte que você achou boa no nosso relacionamento... - Fiz questão de arquear os dedos na palavra relacionamento - foi as nossas transas?
- Sim - Respondeu sem nem hesitar - Ainda mais quando você ficava de boca calada. Sabe como é né? Não podia emitir nenhum som já que a sua boca estava ocupada.
- Seu filho de uma égua! - Gritei, finalmente conseguindo alcançar a ilha de raiva - Seu viado escroto! Eu te amava e você fala que o melhor de mim era quando nós transávamos?
- E não se esqueça de ficar de boca fechada - Suas palavras eram tão jocosas e dissimuladas que minha decepção apenas aumentava - Era um alivio quando eu não escutava essa sua voz de velho.
- Então por que você me enganou?!
- Era parte do meu papel - Ele gritou e logo em seguida gargalhou - Foi tão fácil te seduzir depois que eu descobri seus pontos vulneráveis.
- E quais eram?
- Bom... - Ele dedilhou o queixo fingindo está profundamente concentrado, me fitou dos pés a cabeça e disse - Praticamente você todo. Chris você é um poço de vulnerabilidade.
- E você é um poço de mentiras - Contra ataquei.
- Touche.
- E a sua irmã, Li? - Minha garganta estava inchada e seca, mas mesmo assim eu ainda empurrava as palavras para fora - Ela também estava mentindo?
- Não - Vi um leve traço de dor passar pelo seus olhos, mas foram rapidamente substituídas pelo olhar sarcástico - infelizmente ela teve câncer sim. Pelo menos ficar com você todo tempo serviu para alguma coisa, você era um ótimo ombro amigo.
- E a viagem para o Japão? Chin? Leah? Tudo! - Eu estava desesperado por uma explicação, ainda estava tremendo de raiva, mas eu tinha que saber, precisava saber, necessitava de informação - Seja honesto comigo Li. Já chega de joguinhos, não precisa mais de mentiras.
- A viagem para o Japão foi sim por causa de Leah, mas ao contrario do que Chin falou ela não chegou completamente morta lá - Ele andou na minha direção, sinuoso como um predador, seus olhos focados em mim, a presa - A estória do hospital foi totalmente remodelada, queríamos que você não desconfiasse de nada, mas você sempre me surpreende.
- Chin e Leah são irmãos de verdade? - Ele estava bem próximo de mim, mas mesmo assim eu gritei - E o fígado doado?
- Eles são irmãos sim - Passou o dedo pela linha do meu maxilar e eu me retrai, seu toque já não era tão convidativo - E ele doou um pedaço do fígado para ela sim. Mas a estória de como Leah veio parar na minha família é um pouco mais longa.
- Pode contar - Sentia seu hálito quente próximo do meu rosto, mas não fiz nada, permaneci parado - Eu tenho todo tempo do mundo.
- Tudo bem - Seus lábios rasparam de leve na minha orelha, esperei sentir aquele usual arrepio que acontecia quando ele me tocava, mas ele não veio - Sabe a verdade verdadeira é bem simples. Leah é tanto minha irmã como a de Chin.
- Sim, por que você foi criado junto com ela - Minha voz saiu dura - Conta a verdade Li.
- O mesmo sangue que corre nas veias de Leah e Chin corre nas minhas, Christian - Suas palavras estavam serias, não encontrei um vestígio de sarcasmo ou falsidade na sua voz - O meu pai teve um caso com a mãe de Chin. Ao contrario do que Chin disse nem a minha família nem a dele estão falidas, quando eles moravam no Japão eles eram reconhecidos como os mais ricos da cidade. Mas ai meu pai fez o que fez, ele seduziu a mãe de Chin e desse caso nasceu Leah.
- E por que vocês vieram para cá?
- Pelo simples fato de que o pai de Chin descobriu a traição - Me contorci quando seus lábios tocaram na pele fina de meu pescoço - E ele jurou meu pai de morte, e quase conseguiu matar o meu pai. Ele não aceitava a pequena bastarda, minha mãe se apiedou e quando Leah nasceu ela tomou-a como sua.
- Você ainda não respondeu a minha pergunta - Depois eu disse entre dentes trincados, fazendo questão de parar a cada uma palavra dita - Como. Vocês. Vieram. Para. Cá?
- Sempre ansioso por informação, Chris - Ele tentou me beijar novamente, me contorci e sai do alcance de seus lábios, ele suspirou e disse - Mesmo com o problema Leah resolvido o pai de Chin ainda estava com a honra manchada, sabe? Só piorou quando boatos de que ele seria corno se espalharam pela cidade e não sei por que eles escolheram o Brasil, uma língua tão diferente, costumes diferentes, tudo diferente. Eles nunca me contaram isso.
Depois que eu escutei tudo isso eu senti uma avassaladora vontade de chorar, a minha ilha de raiva estava submergindo nas ondas frias da tristeza. Li não era tão perfeito quando eu pensava, não conseguia mais ver o esplendor magnifico que eu estava com ele. Meu deus particular estava perdendo seu único e principal adorador. Meus olhos estavam queimando, minha garganta estava muito mais apertada e eu não queria chorar, não queria demonstrar fraqueza na frente da pessoa que brincou comigo da forma mais baixa e injusta que tinha.
- Sabe, eu devia ter escutado meus irmãos quando eles disseram que você só queria me comer - Me abracei, tentando ficar um pouco mais quente do que eu me sentia.
- Devia mesmo - Ele deu alguns passos para frente e eu apenas sacudi minha cabeça derrotado - Afinal, você colocava aquelas pestes em um pedestal. Sua escolha não foi muito boa.
- Li eu acho que está na hora de você sair de minha casa.
- Resolvemos tudo? Sem mais perguntas? - Parecia que ele estava tentando prolongar o momento, mas eu não me deixei enganar. Ele já me enganou por quase dois anos, chega de fazer vista grossa. balancei a cabeça em negação - Então....tchau, Christian.
Não respondi.
Nem iria.
Escutei seus passos arrastados, sua lentidão na saída, sua hesitação na hora de abrir a porta e quando travou na saída.
Não ousei acreditar.
Não ousei me mover.
Estava me afogando em um mar de tristeza, parecia que não tinha volta dessa vez.
A porta se fechou.
E me deixei chorar uma ultima vez pelo cara que amava.
Amo.
E não conseguia para de amar.