====
A História de Caio, completa e revisada para leitura on line e download e contos inéditos no meu blog:
/>
===
Quando paro para lembrar aqueles dias que se seguiram ao falecimento de meu pai, é como se semanas tivessem passado como um único longo dia, ao final das quais eu era uma pessoa completamente diferente. Eu nunca tinha parado para pensar em como reagiria ao falecimento do meu pai, mas até aquele nosso último encontro, eu certamente jamais imaginaria que sentiria tanta falta dele como da minha mãe. Nos momentos de maior dificuldade da minha infância e adolescência, cheguei a fantasiar como seria perfeito que meu pai e meu irmão sumissem da face da terra, para ter fim o meu suplício. Agora, como gostaria de ter mais algumas horas com ele, conversando como conversei naquela tarde. Rindo e contando histórias do passado, essa é a imagem do meu pai que guardo.
Com certeza Yoh e Dan ficaram sabendo do ocorrido, mas nenhum dos dois foi ao velório. Dos meus amigos, só a Samia compareceu, meu irmão não teve condições de ir, infelizmente, mas a Clara veio de São Paulo se despedir. Mas ela veio e voltou tão rápido que não chegamos sequer a conversar muito. Lembro-me apenas de ter garantido que repassaria a ela tudo que precisasse conforme meu pai fazia. Após se mudar para São Paulo e morar com a irmã mais nova do meu pai, a Clara passou a ser como alguém estranho. Eu não sabia que tipo de diferenças ela tinha com papai, porque estava preocupado demais com meu próprio inferno. Na certa, o problema dela era que eu era o filho favorito da mamãe e o Carlos o filho favorito do papai. Trauma de filho do meio, não se sentir amado. Talvez ela se sentisse mal de me ver com 16 anos ocupando posições importantes e ela com 19 e fazendo faculdade apenas recebendo mesada. Mas a faculdade dela, medicina, nem era relacionada à nossa área de atuação, enfim, era algo que ela deveria superar. Pensei várias vezes em ir visitar o Carlos no hospital, mas tinha medo de aquela felicidade de ser da família que senti pela última conversa com meu pai fosse estragada por ele.
Me centrei mais no colégio, passei a estudar muito em casa. Deixei de ir ao BNB porque minha casa atual dava para estudar com tranquilidade sem ser interrompido. A Samia também criou o costume de ir lá para casa a tarde estudar. Minha amizade com o Roney foi realmente comprometida. Não sei quem exatamente foi o culpado, mas eu não cheguei a sentir falta dele e achei que era melhor assim, já que ele me via como uma pessoa que estragava seus esquemas amorosos. Faziam quase 2 meses do falecimento do meu pai e as férias de meio do ano estavam em cima. Não havia mais falado com o Yoh, ele não tinha aparecido nem uma vez após a nossa última despedida. O Dan eu via no colégio mas ele nunca sentava próximo de mim nem me dirigia a palavra, estava dando aquele espaço que prometeu naquele dia. Do Ramon eu ouvia falar pela Samia, eles não estavam namorando oficialmente, mas viviam saindo muito.
- O que você vai dar a ele amanhã? - Perguntou Samia certa tarde na biblioteca de minha casa.
- Ele quem?
- O Yoh oras.
- Não estou entendendo.
- É o aniversário do Yoh, Ramon me disse ontem, você deveria dar algo a ele.
- Aniversário dele? Quando?
- Você não sabia que ele faz aniversário em 13 de maio?
- Devo ter ouvido falar sim. Mas não lembrava.
- E então, vai dar o que pro gato?
- Ai, mulher. Eu nem tenho parado para pensar nisso. Sinceramente, não ando mais pensando em nenhum dos dois.
- E tipo. - Alfinetou ela. - Você tem dado pra quem?
- Sa, dá licença né? Eu nem tenho pensado nessas coisas desde que o papai faleceu.
- Desculpa Ca, não é querendo ofender a memória dele. Mas você não tá sentindo falta não?
- Tá bem, mulher. Estou. Sinto falta pra caralho de homem.
- Tem dois arreados por ti. Porque não fica com um deles.
- Não é tão simples. Os dois me magoaram.
- Mas você gosta de um deles pelo menos.
- Sa, não confunde minha cabeça.
Ela me forçou naquele dia a penar em algo do qual eu fugia a semanas. Os espctros de Yoh e Dan me seguiam para toda parte. Eu sabia que ambos esperavam uma posição minha. A mãe do Dan tinha voltado a Curitiba, ele poderia ter voltado junto, não sei a quantas andava a amizade dele com o Yoh, mas acredito que o motivo principal dele continuar na cidade era eu. Eu e o nosso assunto inacabado.
Já o Yoh, o Ramon fazia questão de soltar para a Samia que ele estava sofrendo e etc, que pensava em mim. Ela não se segurava e vinha soltar tudo nos meus ouvidos e me balançava o coração. Mas como confiar em alguém que acusou você de ser um psicopata? Era possível acreditar em uma conexão de amor com essa pessoa? Por outro lado, como confiar em alguém cuja mãe mandou espancar e estuprar várias pessoas apenas para garantir que o filho dela tivesse um namorado. Sabe-se lá o que aquela maluca não faria comigo se eu largasse o filho dela. Seria uma verdadeira sogra serpente.
E havia o presente do Yoh. A Samia foi embora naquela tarde e me deixou com esse assunto na cabeça. Não conseguia parar de pensar que o aniversário dele estava chegando. Me peguei pensando em que tipo de presentes eu daria a ele. Ele era uma pessoa muito fina, talvez uma garrafa de um vinho bem caro. Ou uma caneta de luxo. O destino me pregou uma peça a respeito disso porque naquela noite fui a uma nova livraria grande que havia sido aberta na cidade e qual não foi minha surpresa ao ver várias vitrolas e gramofones expostos na vitrine.
Eu nunca tinha visto um aparelho daqueles novo a venda, mas lá estavam, lindos. E eram definitivamente a cara do Yoh, não tinha como não pensar nele ao ver aquela madeira envernizada com ar antigo. O braço da agulha da vitrola. Ele era definitivamente um amante vintage, nada melhor do que um presente vintage. A despeito de tudo, eu devia bastante a ele e se o Ramon estivesse correto, aquele surto de loucura dele foi causado por uma tentativa de sufocar o que sentia por mim. Ele errou por ter medo de assumir um amor. Era uma desculpa boa. Talvez não boa o suficiente para me fazer recuperar o sentimento por ele, mas certamente o era para que ele fizesse por merecer aquele presente.
Próximo ás vitrolas havia uma sessão de discos de vinil. Comprei 12: dentre os quais 3 da Maria Bethânia, a cantora favorita do Yoh. Verifiquei se havia um da Edith Piaf, a segunda cantora favorita dele, mas não havia, então peguei diversos, ele precisava de discos para usar a vitrola.
Mandei fazer uma linda embalagem para presente. Era um pacote pesado, chamei o Sérgio para carregar para mim. Estava viciado em ter alguém para fazer tudo para mim. Aproveitei e comprei alguns livros novos.
Cheguei em casa e coloquei o pacote bem a vista na biblioteca, queria ficar olhando para ele para não esquecer. Amanhã, o presente eu já tinha, só precisava da coragem para encarar ele novamente. Resolvi ir a cozinha e fazer um lanche rápido. Quando meu celular toca eu o pego e não acredito, era um número que eu não via ligar para mim há muito tempo e eu nem esperava que ligasse tão cedo. Atendi com voz supresa.
- Alô?!
- Caio? Está em casa?
- Estou sim.
- Eu estou aqui fora, a gente precisa muito conversar?
- Errr... Claro. Podemos.
- Autoriza minha entrada, estou no portão.
- Claro... Carlos. - Falei enquanto desligava o celular e pegava o telefone da cozinha para discar para a segurança.
CONTINUA...
P.S: Amanhã retorno ao ritmo normal de postagens, até o começo da noite. Dá tristeza cada capítulo, porque está terminando.