P: Entra.
M: Obrigado.
P: Vou-te buscar umas toalhas e umas roupas para te enxugares, não vás apanhar uma gripe.
O Telmo entregou a roupa ao M e indicou-lhe onde era a casa de banho para se puder mudar.
Após se ter mudado…
M: Obrigado por tudo professor.
P: Não me agradeças, apenas estou a cumprir o meu dever. Presumo que ainda não tenhas jantado, certo?
M: Não.
P: Óptimo, eu ia agora fazer o jantar de modo que faço para nós dois. Podes sentar-te no sofá, tens lá o comando, liga a televisão e vê o que quiseres.
O Telmo foi fazer o jantar, enquanto o M foi sentar-se no sofá, sentia pena do seu aluno, ele estava realmente triste e embora o choro não tivesse diminuído, este ainda não tinha cessado. Quando o jantar ficou pronto, o professor chamou-o e ambos comeram em silêncio. A comida caiu bem no estômago do M, estava quente e sabia bem após ter estado, poucos minutos antes, todo encharcado.
Após o jantar sentaram-se ambos no sofá da sala e o Telmo perguntou ao M o que se tinha passado, ao qual o M respondeu, contando-lhe o sucedido, omitindo apenas o que estava fazer enquanto via o vídeo.
P: Eu conheço a tua mãe, duvido que ela te mandasse para a rua, afinal de contas ela é médica, está bastante familiarizada com a diversidade, quer de etnias, quer de orientações sexuais ou tradições. Ela não te colocaria na rua.
M: Mas o meu pai… - disse, começando a chorar novamente.
P: Calma. – disse, dando-lhe uma palmadinha no ombro.
Sem estar à espera o P foi abraçado, no entanto o Telmo sabia que esse abraço não era nenhuma tentativa de o seduzir, sabia que o M sentia-se só e triste e que a pior coisa que um jovem, como ele, podia sofrer era ser negado pelos pais. Por essa razão retribuiu o abraço, dizendo que ia ficar tudo bem, para não se preocupar, era apenas uma questão de tempo até os pais aceitarem.
Permaneceram abraçados durante alguns minutos, quando o Telmo deu por si o M tinha adormecido com a cabeça junto ao seu peito. Sem saber bem o que fazer, pegou nele ao colo e deitou-o na sua cama, tapando-o.
O professor ficou algum tempo junto à porta do seu quarto olhando para o M que dormia profundamente, lembrava-se de alguns anos atrás ter passado pela mesma fase, tendo-se refugiado nos livros para tentar não pensar nisso. Tal fez com que conseguisse uma bolsa de estudo todos os anos lectivos, o que lhe ajudou bastante a suportar as despesas da faculdade, altura em que contou a sua orientação sexual aos pais. Inicialmente, estes não aceitaram, mas o Telmo não deu o braço a torcer, o facto de estar a estudar em Lisboa e de os pais estarem no Porto ajudava bastante, no Verão este arranjava um emprego para pagar a renda de casa, uma vez que a bolsa já não tinha efeito nessa altura. Só assim, mantendo a distância com os pais é que estes, após um ano, aceitaram a sua orientação.
Não deixou de sentir uma onda de solidariedade para com o M, no entanto tinha a certeza que a sua situação era diferente, a sua mãe nunca o poria fora de casa, devendo estar super preocupada como filho.
O Telmo saiu do quarto e ligou para o hospital, de modo a saber o número de telefone da mãe do M, assim que o soube ligou-lhe:
Alzira: Estou sim.
P: Olá Alzira é o Telmo…
Alzira: Não quero ser rude mas estou com uns problemas em casa. – Disse interrompendo-o. – É que o meu filho desapareceu e já liguei para os colegas, mas parece que ele desapareceu do mapa e não o consigo encontrar.
P: Tem calma, ele veio ter comigo, ele disse que a sua melhor amiga não estava em casa e não tinha dinheiro, ele está a dormir podes ficar tranquila.
Alzira: Oh… Obrigada Telmo, não sabes como fico aliviada, vou já para aí.
Passado algum tempo alguém bate à porta da casa do Telmo, ele vai abrir e vê a Alzira mandando-a entrar.
Alzira: Felizmente que o meu filho está bem, fiquei preocupada que algo lhe tivesse acontecido do modo que ele saiu de casa. Presumo que ele te tenha contado o que se passou.
P: Contou sim, mas não quis acreditar que tu o expulsasses de casa, motivo pelo qual te liguei a avisar que ele estava bem.
Alzira: Fizestes bem, não sabes o quanto afligida eu estava, eu tentei impedi-lo mas ele não me ouviu. Não é uma notícia feliz ouvir que o nosso filho é homossexual, não que tenha algum problema com isso, tu sabes disso. No entanto, para não falar da discriminação que ainda existe, nunca poderei ter netos, consequentemente, ele nunca poderá ter filhos. Temo por ele.
Telmo: Eu entendo-te. E quanto ao teu marido?
Alzira: Eu consegui acalmá-lo e chamá-lo à razão, ele estava mais preocupado com o que os outros iam pensar do que com o próprio filho, não o censuro. A educação que ele teve levou-o a pensar de maneira diferente e vai demorar algum tempo até que se habitue à ideia. Para já convenci-o a tirar umas férias para organizar as ideias e habituar-se à situação. Ele vai só deixar as coisas organizadas na esquadra e vai viajar para fora daqui, onde possa ter algum descanso.
Alzira dirigiu-se ao quarto do M para o acordar, no entanto o Telmo convenceu a deixá-lo estar a dormir, ele não se importava que ele passasse lá a noite. Alzira concordou e foi embora, dizendo que voltava então no próximo dia.
Tal como prometido, no dia seguinte, logo pela manhã, Alzira bateu à porta do apartamento do Telmo, este abriu-a e cumprimentou a Alzira mandando-a entrar. Ela dirigiu-se ao quarto onde estava o filho, que ainda estava a dormir e acordou-o.
Alzira: Olá filho, como estás?
M: Mãe? O que fazes aqui?
Alzira: Está tudo bem. Vim buscar-te para casa.
M: O pai está lá?
Alzira: Está, mas ele vai de viajar amanhã.
M: Só quero ir para casa quando o pai se for embora. – disse, ainda tinha bem presente a imagem do pai a mandá-lo para rua na cabeça.
Alzira: Mas filho, não podes ficar aqui, o Telmo só tem uma cama, ele esta noite teve de dormir no sofá para poderes dormir aqui.
M: Por favor, não quero ir para casa enquanto o pai lá estiver.
Não querendo contrariar o filho, pois sabia o quanto este tinha ficado magoado com a atitude do pai, Alzira pediu ao Telmo que o filho lá ficasse apenas mais uma noite, ela sabia que era pedir muito, pois afinal ele era professor do filho e tal podia causar-lhe problemas na escola, uma vez que poderia ser acusado de parcialidade para com o M.
Alzira: Eu passo pela escola e falo com o director para que este fique a par da situação e não te cause problemas.
Telmo: Não há problema. – disse, embora tivesse um pouco de receio das atitudes do M, no entanto, face aos problemas que este tinha tido duvidava que pensasse nalguma coisa a não ser neles.
Alzira: Obrigado mais uma vez. Fico-te a dever uma.
Alzira foi ter com o filho, dizendo-lhe que podia ficar mais uma noite em cada do Telmo, no entanto teria de ir passar pela escola, devendo o M ir com ela, não queria arranjar complicações ao professor. Mais tarde, quando este acabasse as aulas iria novamente buscá-lo à escola e levava-lhe algumas mudas de roupa.