Muito tempo atrás eu li um livro - Os Demônios de Pilar Ramirez - e gostei bastante. Nunca o encontrei novamente na biblioteca pública de minha pequena cidade, e não me recordo bem do desenrolar do conto. Contudo, sua malícia e desenvoltura, bem como o enredo do conto se misturam muito com uma história que apareceu em minha vida pouco tempo depois. Esse conto não pretende ser um plágio, nem mesmo memórias de outro conto. Ele é a visão intercalada do que aconteceu comigo e com o personagem do autor, sob prismas que se refletem, como espelhos colocados um defronte ao outro, irreais e rumo ao infinito. Deixo, ao leitor interessado e criterioso a tarefa de separar-me do conto se quiser.
Em 2004, eu namorava quem eu cria o amor da minha vida. Eu era pouco mais que um adolescente na época, mas, segundo um professor do colégio eu tinha, assim como Shakespeare teve, a sorte de ficar sábio antes da velhice.
Ainda assim eu estava bêbado com o meu novo amor - quem se lembra de seus primeiros amores sabe que tudo o que você sente de tesão, de impulso físico, é tão puro quanto o ideal que se faz de quem se gosta. E lá estava eu, de mãos dadas com minha namorada, sorrindo idiotamente e de membro duro. Era paradoxal, e me parece paradoxal até hoje que algo possa ser tão sublime e tão animalesco quanto um primeiro amor.
Nos beijávamos furiosamente, e com o tempo passamos a nos amassar furiosamente, a nos chupar mútua e furiosamente e a nos habituar ao sexo, aos corpos um do outro. Quebramos juntos nossas vergonhas, descobrimos juntos o gosto um do outro e tudo era maravilhoso, à notável excessão de que ambos éramos virgens e com criações sedimentadas de moralidade e hipocrisia. Progredimos muito, mas nunca tinhamos transado de verdade - trepado, fodido, nos comido, e vejam que eu não pretendo chocar com o vocabulário, e sim tirar qualquer calão que eles possam ter - e isso frustrava a ambos. Ela sempre reclamava de dores muito fortes, e eu sempre queria protegê-la. Me parece ridículo hoje, mas não era então.
Foi quando os sonhos começaram, de ambos os lados. Sonhos negros, opressores, povoados de demônios à surdina. Ela mudou aos poucos - pintou o cabelo, depois desenlvolveu novos traquejos de fala, e por fim, parecia outra pessoa. Parecia um amálgama entre a minha menina e os demônios dos nossos sonhos.
Ela ficou agressiva, e exigia de mim a fúria de antes, mas com os bloqueios da menina; era impossível agradá-la. O tempo passou e eu próprio passei a mudar. Meu sonhos eram horríveis e as horas da vigília eram meu consolo. Minhas horas de sonho, a muito tempo de férias na casa do caralho, começaram a cobrar o preço de sua falta. Eu vivia irritado, presa de uma fúria contida, um enorme e górdio nó na garganta.
Num dia, quase que por acaso, o barril de pólvora explodiu. Minha pequena era conhecida por acessos de fúria insana durante sua TPM e eu por ser ótimo em me agarrar ao meu semblante enquanto desse pra segurar a tristeza, a frustração e a raiva, mas também por descontar tudo com juros e agravos quando não desse mais. Nesse dias ambas as situações ocorreram - receita pronta para o desastre.
Os pais dela saíam durante a tarde, e nós sempre nos víamos. Nesse dia, quem visse pensaria que dois inimigos, e não que dois amantes se viam. Eu parei à porta com minhas olheiras pronunciadas por uma semana à base de café e benzedrina, barba por fazer - sempre tive barba, desde muito jovem - e ela com um olhar leonino de desafio. Não houve palavra nem cumprimento, nos entreolhamos por não mais que 10 segundos. Gosto de pensar que me pareceu um tempo interminável, mas essa não é a verdade.
A verdade é que ela esboçou um sorriso cínico no rosto e chegou a inflar o peito pra dizer algo, antes que eu previsse aquilo e deixasse a raiva seguir seu curso, na forma de um tapa, com as costas da mão, puxado pelo braço com a mesma força que eu desferiria num homem de quem eu desgostasse profundamente. Ela se afastou pra dentro da casa, olhando chocada para mim, com a maçã direita do rosto em brasa, o hematoma surgindo quase de imediato.
- Como??? Como você pode???
Não deixei ela terminar. Sabia que já tinha passado do ponto de não retorno e era meu momento. Eu entrei na casa, a segurei pelo braço e a arrastei - e o arrastei não é eufemismo - até o quarto da mãe dela. A mobília colonial do quarto contava com um divã aos pés da cama. Eu a joguei abrutamente sobre o divã e comecei a afrouxar meu cinto. Num misto de choque, alívio e resignação, além de doses imensas de raiva, ela se levantou e se colocou na minha frente. Eu não olhava para ela, eu tirava a roupa.
Ela segurou meu rosto e olhou no fundo dos meus olhos, e não sei o que ela viu, mas a expressão dela mudou de raiva muda para medo. Ela colocou a mão na boca, como alguém que leva um grande susto e recuou um passo. Eu terminei de me despir e avancei rumo às carnes dela. Digo às carnes porque ali não havia a idealização da minha amada, e sim o fruto negado da nossa ingenuidade.
Empurrei seu ombros para que tocassem a parte da cama onde ficava apoiada a lateral do divã. Segurei suas panturrilhas e afastei suas pernas num ângulo impossível, pelo que ela gemeu de dor e começou a se debater. Nos olhos dela havia acabado o desafio, e só restava um turbilhão de sentimentos, mas eu honestamente não estava nem aí.
Coloquei minhas mãos sob sua bunda linda e arredonda, pele branca como neve e puxei a calcinha saia abaixo. Ela se assustou com o movimento brusco, mas ficou resignada.
Agarrei suas coxas, coloquei a cabeça do meu pau na entrada da minha tão sonhada buceta, que não estava tão molhada como é padrão nas grandes histórias de sexo, e forcei até que ele entrasse inteiro, de uma só vez, firmando seus ombros. Ela gritou de dor, e honestamente, também não sei se havia o misto de prazer que as pessoas dizem que há. Comecei a fodê-la ali, sem consentimento real, mais violação que amor, mas ainda assim...
Ela gritava, me unhava, me mordia e devolvia o tapa no rosto com a força que tinha...eu não dava a mínima. Moral, dor, amor, nada iria me parar.
Ela começou a resfolegar e começaram os primeiros sinais de prazer; ela se encharcava e o barulho da minha virilha batendo na dela como martelo sobre bigorna começava a ganhar notas mais molhadas. A agressão dela dobrou quando ela começou a mexer os quadris e participar ativamente, a consentir e desejar aquele sexo que em nada valia o que sentíamos, mas que era o que nós éramos ali. Nos éramos sexo. Animais se devorando, se rasgando num frenesi conjunto, suando cântaros, gemendo, gritando e nos agarrando.
Ela começou a gritar, a ordenar que eu não parasse, mas eu não conseguia nem raciocinar, quanto menos responder com outra ação que não fosse redobrar meus esforços para me manter firme e com a mesma fúria de antes. Ela gozou com o estardalhaço de um homicídio; ela gritava, desabou em prantos, e eu continuei... até a minha virgindade cobrar o seu preço. No momento em que uma fagulha da minha razão voltou, eu me vi prestes a gozar e me afastei bruscamente dela, mas ela cruzou as pernas fortemente, me enfiando nela ainda mais fundo. Eu gozei dentro dela e perdi completamente as minhas forças. Ficamos na mesma posição por uns 20 segundos, terrívelmente conscientes do que havia acontecido. Entretanto, quando eu olhei novamente para minha outrora loirinha, agora morena, vi o rosto machucado da candura do meu primeiro amor. E o olhar de volta não era de medo.
Nos abraçamos e fomos para o quarto dela, onde ficamos namorando como adolescentes bobos, até eu voltar pra casa e assaltar minhas economias para arrumar uma pílula do dia seguinte, só pra depois voltar para a casa dela e ajudar a lavar o cobertor do divã, sujo de sangue, esperma e tudo o mais que se espera. Ela e eu estavamos completamente unhados, roxos, cobertos de machucados, mas rindo, tolos de felizes.
Por um acordo tácito, creio, nunca paramos pra conversar sobre esse dia, e agora que o namoro acabou, creio que nunca iremos. Mas uma coisa é certa.
Os demônios, os sonhos, a insônia, o medo das horas nos braços do subconsciente nunca voltaram. Foram-se pra nunca mais, acho eu que certos de que sua malfadada tentativa ficara guardada, bem como sua cura.
Talvez fosse uma lição, talvez não. Essa até pode ser a intenção, mas honestamente, eu não me importo, e ela também não se importou, e enquanto estivemos juntos, o que vigorou foi o que sentíamos física e emocionalmente; agora finalmente juntos.