Uma raiva que nunca senti na vida tomou conta do meu corpo naquele momento, meu coração acelerado, sentia minha mão doer a cada soco que desferiu contra Luís Paulo, sou maior e bem mais forte, João Lucas tentou me impedir, mas o empurrei com força e nem sei se ele caiu ou se bateu contra algo, só quando Dimas apareceu auxiliando João Pedro foi que eles conseguiram me tirar de cima do Luís Paulo, minha raiva me cegou de tal forma que não parecia eu, era como se tivesse perdido minha consciência, só depois que Dimas me puxou para outro lado da sala foi que consegui me dar conta de que tinha batido em João Pedro também, a imagem dos dois estava gravada na minha mente.
Estava retomando o fôlego para terminar o que eu tinha começado quando ouvi a voz do Dimas quebrar meu transe, ele estava repreendendo os dois, o que era claro, afinal Dimas era meu melhor amigo, mas foi ai que suas palavras começaram a fazer sentido em minha mente, até formar a frase que me levou da fúria ao torpor.
— Eu falei que isso ia dar merda, o que vocês estava pensando?
— Vo…Você sabia? — Dimas me olha e nem precisa falar nada, antes que ele se explique acerto um soco com toda força em seu rosto e saio apressado daquela merda de apartamento.
Meu coração parecia que ia explodir, a bebida, a raiva, o choro a confusão tudo vindo ao mesmo tempo, entro no meu carro e minha mão vai rápido para debaixo do banco de onde tiro minha arma, verifico se está carregada e destrave a trava de segurança, minha mão vai a maçaneta da porta, minha mente está claro o que preciso matar os três traidores, mas no meio de toda a confusão que se forma na minha mente escuto a voz do seu Mariano, não posso fazer isso, mataria meu avô de desgosto e acabaria com minha vida, uma vida que me esforcei boa parte da vida para ter.
Travo a arma e a deixo cair no banco do passageiro, estou tão puto que acertei o volante várias vezes, precisava sair dali o mais rápido possível, não tenho para onde ir então volto para casa, quando estou quase saindo dessa maldita cidade sou pego em uma blitz, minha noite só piora, num lapso de sanidade guardo minha arma de novo, tenho pose, mas estou bebado, dirigindo e armado isso pode virar um problema muito rápido mesmo com meu distintivo, até principalmente por causa dele.
— Você bebeu? — O policial pergunta.
— Sim.
— Desça do carro. — Ele ordena. — Onde estão os documentos do veículo e os seus?
Passo tudo inclusive meu distintivo me apresentando como um detetive civil, meu mundo está girando, estou sem saber o que fazer quando escuto uma voz familiar que me causa calafrios, vejo o capitão Farias, ele serviu com meu tio e é um grande amigo da família, só de ouvir sua voz quero vomitar, me sinto péssimo e certas lembranças querem vir à tona, mas seguro e tento enterrá-las de novo.
— João Miguel, quanto tempo. — Ele fala e o respondi com um aceno. — Cara você bebeu e está dirigindo nesse estado.
— Estava indo para casa. — Falo sem fazer contato visual com ele, não estou em condições de lidar com isso agora.
— Ele é dos nossos, ele é neto do seu Mariano. — Ele fala para um dos policiais que estava com meu documento, ele se desculpa e me devolve tudo.
— Olha João Miguel, não vamos registrar nada, mas do jeito que você tá não posso te liberar, tem alguém que possa vir buscar você e que possa dirigir seu carro? — Não eu penso, meus amigos são todos uns merdas do caralho, um bando de traíras.
Me sento na calçada e pego meu celular, estou tremendo e fazendo um esforço fora do normal para tentar não pensar, estou tão desesperado que ligo para a última pessoa que pensei em ligar essa noite e que nem sei se ela me ajudaria ou não.
— Alô. — Luciano atende, mas sinto sua voz ríspida.
— Luciano, estou preso em uma blitz, estava voltando para casa, você ainda está na cidade? — Falei o mais sério possível.
— Você bebeu?
— Sim, por isso não querem me liberar.
— Onde você está? — Passo o endereço para ele.
— Estou indo.
Nem sei quando tempo levou, fiquei sentado no chão com as mãos no meu rosto, quando Lucino chegou foi até os policiais se apresentou e mostrou seu documento, eles nos liberaram, entreguei as chaves para ele e entrei no lado do passageiro, ele entrou no carro colocou o cinto, ligou o carro e saiu, não trocamos uma palavra por quase todo o trajeto, só quando estávamos a meia hora da minha casa foi que ele finalmente abriu a boca.
— O que aconteceu com suas mãos?
— Entrei numa briga.
— Com quem?
— Com Dimas e com Luís Paulo.
— Por que? — Agora ele me olhou espantado.
— Não se faz de sonso, todo mundo sabia, só eu que fui idiota.
— Olha João Miguel não sai de onde eu estava para aguentar seus desaforos.
— Vai dizer que você não sabia que o filho da puta do Luís Paulo estava fudendo com o cara que ele sabia que eu gosto.
— Claro que não, que filha da puta, e você também João Miguel. — Conheço ele para saber que fala a verdade.
— Eu o que Luciano?
— Vai dar moral para aquele moleque, desde sempre você sabia que ele não prestava.
— Eu podia lidar com qualquer pessoa fodendo ele, menos um cara que eu tinha como um irmão. — Falei deixando transparecer toda a minha fragilidade.
— Luís Paulo é um cuzão, ele já fez isso comigo e com o Dimas também, você não lembra? — Agora que ele falou me fez lembrar, Luís Paulo sempre dava um jeito de ficar com as ex dos amigos, só que o João Pedro não era um ex meu.
— Por que você foi me ajudar, pensei que não queria mais falar comigo nunca mais. — Falei.
— Você me ligou, e te conheço, sei que não ligaria se não fosse sério e também porque sei que se fosse eu você iria. — Ele tem razão, mesmo puto com ele não o deixaria na mão em uma situação dessas.
— Obrigado.
— Vou ficar com seu carro, você pega ele lá em casa mais tarde quando acordar.
— Tranquilo.
Luciano me deixa em casa e segue seu caminho, entro em casa e vou direto para o meu quarto, tomei um banho e caí na cama, não consegui pregar os olhos, passei horas me revirando na cama, até finalmente dormir, na realidade eu apaguei, quando acordei tinha remédio e água perto da minha cama, já passava das uma, agradeci mentalmente por está de folga, tomei o remédio que meu avô deixou para mim, e voltei a dormir, quando acordei eram quatro da tarde, fui para cozinha estava faminto, seu Mariano esquentou minha comida sem dizer uma palavra e me serviu, fazia tempo que eu não ficava assim, nesse nível de ressaca, mas ele estava ali cuidando de mim, pelo olhar ele já tinha sido informado da blitz, devem ter falado para o meu tio que fez questão de falar para meu avô.
— Não vai brigar comigo?
— E adiantaria de que, você já é crescido João Miguel.
— Desculpa, eu não devia ter dirigido. — Falei assumindo meu erro.
— Já enterrei sua avó João Miguel, não me faça enterrar você também. — Essa frase doeu mais do que a traição dos meus antigos amigos, ele me abraçou, me deu um beijo na testa e me deixou sozinho na cozinha.